Vítor Santos* | Jornal de Notícias | opinião
Ninguém, exceto os próprios, gostará de ver criminosos a desenvolver a atividade livremente, menos ainda se saem com penas ligeiras quando se sentam nos tribunais.
Ora, em Portugal, 90 % dos acusados por associação criminosa escapam à condenação, sendo a indiciação por este ilícito aplicada, sobretudo, a grupos mafiosos ou organizações similares, ligadas ao tráfico de droga, de pessoas e outros, menos conhecidos mas igualmente importantes, motores de circulação de milhões de euros em circuitos paralelos.
A discrepância entre acusações e condenações indica que algo não está a correr bem, mas ninguém consegue identificar a origem do problema, que resultará de um conjunto de fatores. O presidente do Sindicato dos Magistrados defendia, anteontem, em declarações ao "Jornal de Notícias", que "às vezes, facilita-se na acusação".
Esta afirmação, em linha com outras, de arguidos muito mediáticos, poderá aplicar-se a uns quantos casos específicos, mas estará longe de servir de resposta à questão fundamental. Se a lei, cheia de compreensíveis exigências em relação à prova - como se impõe num país livre -, não precisa de ser mudada, se calhar a resposta até é mais simples e, volta meia volta, até justifica declarações públicas.
Em junho, quando Joe Berardo foi detido, o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) lamentava a "carência de meios técnicos e outros ajustados à natureza, dimensão e complexidade da investigação", não obstante o empenho de todos, "DCIAP, Procuradoria-Geral da República, PJ e equipa de investigação".
A questão de fundo, no caso da associação criminosa e outros, como o do comendador madeirense, residirá na escassez de meios, que não estão a evoluir, em quantidade e especialização, à mesma velocidade dos que estão à disposição dos criminosos, comprometendo o trabalho de quem tem obrigação de recolher e fundamentar a prova. Trata-se de problema bicudo para o Ministério Público. E para o país, porque não se vislumbra solução.
*Chefe de Redação
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