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A publicação da estratégia europeia para o Indo-Pacífico foi ofuscada por uma nova aliança liderada pelos EUA. E especialistas dizem que plano provavelmente não dará à UE um alto nível de influência na região.
Após meses de espera, a União Europeia (UE) finalmente publicou na quinta-feira (16/09) sua estratégia para a região do Indo-Pacífico – um documento de referência que deve definir as tentativas de Bruxelas de expandir sua influência nessa parte cada vez mais importante do mundo.
Mas a publicação foi ofuscada pelo anúncio, no dia anterior, de uma nova aliança liderada pelos Estados Unidos na região que não inclui países europeus, bem como pelos comentários da presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, sobre se o bloco deveria buscar uma maior autonomia estratégica no mundo.
As complexidades do novo documento estratégico da UE ainda estão sendo analisadas por especialistas, mas o que já está claro é que o bloco europeu não se desviou de seu caminho convencional na região do Indo-Pacífico.
"Grande desenvolvimento para as relações"
"O lançamento da Estratégia de Cooperação da UE no Indo-Pacífico é uma boa notícia para o Sudeste Asiático, que está no centro [do Indo-Pacífico] e marca um grande desenvolvimento para as relações da UE com essa imensa e crescente região", afirma Igor Driesmans, embaixador da UE no bloco regional Associação de Nações do Sudeste Asiático (Asean), em entrevista à DW.
O documento descreve o grupo de países da Asean como "um parceiro cada vez mais importante para a UE", ao mesmo tempo que destaca a confiança de assinar novos acordos comerciais na região.
A França publicou seu documento estratégico para a região do Indo-Pacífico em 2018, e a Holanda e a Alemanha lançaram suas próprias diretrizes similares no ano passado. Os EUA e o Reino Unido também o fizeram há alguns anos.
Nem todos os analistas consideram, porém, que o documento estratégico irá alterar significativamente a influência da UE no Indo-Pacífico, que se tornou uma região de interesse relativamente nova para o bloco europeu.
O texto também não esclareceu a posição da UE em questões-chave, particularmente sua posição entre a rivalidade cada vez mais acirrada entre EUA e China.
"Isso não tornará a UE um ator decisivo no Indo-Pacífico, mas fará dela um ator", comenta Frederic Grare, pesquisador do Programa para a Ásia no Conselho Europeu de Relações Exteriores (ECFR, na sigla em inglês).
Aliança dos EUA exclui a UE
O lançamento do documento estratégico europeu foi muito ofuscado por pronunciamentos feitos em Bruxelas e Washington no dia anterior.
Na quarta-feira, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, usou seu discurso parlamentar anual sobre o Estado da União Europeia para apelar por uma maior autonomia estratégica para o bloco, o que o governo francês vem apoiando fortemente durante anos. Mas outros Estados-membros, bem como alguns líderes da UE, têm pressionado contra.
"A Europa pode – e claramente deve – ser capaz e estar disposta a fazer mais por conta própria. O que precisamos é da União de Defesa Europeia", afirmou Von der Leyen, referindo-se aos apelos de alguns países europeus por uma estratégia de defesa unificada e possivelmente uma força militar conjunta dos 27 Estados-membros.
Poucas horas depois, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, anunciou a formação de uma nova aliança no Indo-Pacífico com o Reino Unido e a Austrália, chamada de Aukus.
A China descreveu essa nova aliança como "extremamente irresponsável" e "limitada" e disse que o pacto mostrou que os três países têm uma "mentalidade de Guerra Fria".
No início desta semana, a China também pediu aos países europeus que respeitassem os esforços dos países indo-pacíficos para manter a estabilidade na região, depois que as autoridades chinesas negaram a entrada de um navio de guerra alemão em uma missão no Mar da China Meridional.
"A China atribui grande importância ao desenvolvimento de uma parceria estratégica abrangente entre a China e a Alemanha, incluindo a cooperação entre as duas Forças Armadas", disse o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Zhao Lijian, na quinta-feira.
A Alemanha deixou claro que sua missão na região serve para mostrar que Berlim não aceita as reivindicações de Pequim no Mar da China Meridional.
Uma "facada nas costas" da França
As advertências de Pequim sobre a aliança Aukus eram esperadas, mas as autoridades francesas ficaram particularmente irritadas. O ministro do Exterior da França, Jean-Yves Le Drian, alegou que a ação dos EUA foi uma "punhalada nas costas" e criticou Biden por uma "decisão brutal, unilateral e imprevisível".
Como o pacto Aukus fará com que os EUA forneçam à Austrália a tecnologia para construir submarinos com propulsão nuclear, ele acabou com um acordo multibilionário de submarinos que a França havia assinado com a Austrália e que Paris considerou fundamental para seus interesses nacionais na região do Indo-Pacífico.
Ao ser firmado em 2016, Paris o declarou como o acordo do século e o considerou um marco fundamental nas relações estratégicas da França com a Austrália e a vasta região do Indo-Pacífico.
Também foram levantadas questões sobre por que membros individuais da União Europeia e a própria UE foram deixados de fora dessa nova aliança, e se isso aponta para o aumento da distância entre os interesses de Bruxelas e de Washington no Indo-Pacífico, especialmente vindo apenas um dia antes de a UE traçar seus próprios planos para a região.
Mas fontes que conversaram com a DW disseram que esse não é o caso. O mecanismo Estados Unidos-Reino Unido-Austrália não sinaliza um distanciamento dos interesses entre os EUA e a UE, afirma Bonnie Glaser, diretora do Programa para a Ásia do German Marshall Fund, dos EUA.
"Existem inúmeras maneiras de a UE e os EUA trabalharem juntos para promover seus interesses comuns em paz e estabilidade no Indo-Pacífico, e fortalecer a ordem baseada em regras", comenta Glaser.
UE tem que se envolver mais
Além de a França perder um contrato lucrativo de submarinos com a Austrália, o pacto entre EUA, Reino Unido e Austrália sinaliza também o fim das ambições do presidente francês, Emmanuel Macron, de construir uma aliança estratégica com a Austrália e a Índia, que ele mesmo sugeriu pela primeira vez em 2018, observa Bradley J. Murg, pesquisador do Instituto Camboja para Cooperação e Paz.
Mas ele concorda com outros analistas que a Aukus não resultará em uma cisão entre EUA e UE. "No nível mais básico, a UE ainda precisa de Washington na Otan e de garantias de segurança dos EUA contra a Rússia", frisa Murg.
Grare, do Conselho Europeu de Relações Exteriores, tem opinião semelhante. A nova estratégia da UE para o Indo-Pacífico é "claramente uma maneira de definir a região em seus próprios termos para evitar ser apanhado no jogo de soma zero de EUA e China", afirma. "Mas também é uma forma de muitos Estados-membros satisfazerem os EUA o suficiente para mantê-los engajados na segurança da Europa."
No entanto, o pesquisador acrescenta que a nova aliança Aukus sinaliza que "qualquer que seja seu objetivo atual, a UE corre o risco de marginalização se não se envolver mais seriamente nos assuntos indo-pacíficos".
David Hutt | Deutsche Welle
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