José Goulão* | AbrilAbril | opinião
A eleição do candidato de esquerda Gabriel Boric como presidente do Chile tem muitos significados, políticos e simbólicos, que extravasam amplamente as fronteiras do país e, no imediato, são um enorme suspiro de alívio para os chilenos e a confirmação de que uma nova vaga libertadora atravessa a América Latina.
Gabriel Boric é um jovem, com apenas 36 anos, e apresentou-se como candidato da coligação eleitoral Aprovar a Dignidade, que tem como forças principais a Frente Ampla e o Partido Comunista do Chile. É oriundo dos grandes movimentos sociais dos últimos anos que conseguiram infligir a mais pesada derrota de sempre – é o que dizem os resultados das eleições presidenciais – ao regime fascista de Pinochet e pondo também em causa a sua herança, democrática do ponto de vista político mas submetida à mesma ditadura económica neoliberal numa alternância de 20 anos entre a extrema-direita dos admiradores de Pinochet e o chamado «centro-esquerda» comandado pelo Partido Socialista.
O novo presidente rompe assim com o longo período de 48 anos, desde o sangrento golpe fascista de Augusto Pinochet em que o Chile foi submetido a uma feroz ditadura militar, política e económica que provocou milhares de mortos e «desaparecidos», privatizou o Estado, destruiu o tecido social do país, entregou a economia e os recursos naturais às empresas e empresários globalistas, arrasou sindicatos e os movimentos sociais, condenou uma esmagadora maioria da população à miséria, estendendo as desigualdades de uma maneira desumana. A substituição de Pinochet por uma democracia política no início da década de noventa do século passado não reverteu a situação económica imposta pelo ditador e acabou por transformar a esperança num imenso descontentamento que levou aos gigantescos movimentos sociais de Outubro de 2019.