sábado, 12 de fevereiro de 2022

CONTOS POPULARES ANGOLANOS -- A Paz É Leve Como uma Pena

Seke La Bindo

O rei Panzo andava triste porque o seu povo há muito que apenas ouvia os tambores da guerra e do reino vizinho sopravam ventos de violência. Sem paz não há alegria e a tristeza é pior que a pobreza. Um dia ele chamou os seus conselheiros e disse estas palavras:

- Sábios do meu povo, chamei-vos para que me ajudem a encontrar os caminhos da paz. Só saímos daqui quando tivermos uma solução.

As discussões começaram mas nunca mais tinham fim. Alguns mais velhos queriam continuar a guerra até à rendição do inimigo, porque o rei vizinho era mais fraco e jamais conseguiria submeter o povo das montanhas do Pingano. 

Outros queriam a paz, mas exigir que os mais fracos pagassem um tributo, em compensação pelos prejuízos causados, pelos raptos e mortes. Outros ainda apoiavam o rei na procura da paz, mas exigiam que ninguém cedesse ao inimigo.

O rei Panzo deu por terminado o conselho de sábios mas pediu que todos, em suas casas, com os seus familiares, reflectissem e procurassem uma solução.

Passavam os dias e não surgia uma proposta, enquanto a guerra continuava e morriam guerreiros. Crianças, mulheres e homens eram raptados. O rei Panzo resolveu procurar o velho Manduangu, um eremita que vivia na lagoa do Lukunga e tinha fama de adivinho.

- O que devo fazer para devolver a paz ao nosso povo? – Perguntou o rei Panzo. 

O sábio respondeu que a paz não tem preço, por isso quem a desejar tem de saber viver com ela na cabeça e sobretudo no coração. 

- Talvez um dia possa dar uma resposta, agora só conheço os caminhos da paz que vão da minha casa até à lagoa onde pesco e me abasteço de água.

O rei Panzo voltou à sua cidadela e mal chegou, teve notícia de mais um terrível combate no qual morreram muitos guerreiros e foram raptadas meninas do seu reino, levadas como escravas para o reino vizinho.

O desespero apoderou-se do rei. Mesmo quando os mensageiros lhe vinham dizer que os seus guerreiros tinham obtido grandes vitórias em batalhas contra o inimigo, ele continuava triste, apesar dos prisioneiros feitos escravos.

Um dia resolveu mandar um mensageiro ao rei vizinho, propondo-lhe um tratado de paz que pusesse fim a tanta morte e sofrimento. 

A resposta chegou ao amanhecer do segundo dia, após a partida do mensageiro. Os vizinhos aceitavam a paz, desde que os dois lados destruíssem todas as armas e dissolvessem os exércitos. Afinal o rei Panzo tinha do outro lado da fronteira do seu reino, um povo que não só queria acabar com a guerra como desejava a paz para sempre, acabando com soldados armados.

O rei Panzo regressou a casa do adivinho Mandiaungu e contou-lhe o que havia sucedido. 

- Se o vizinho te propõe a paz, deves aceitar. Mas primeiro certifica-te que os teus conselheiros desejam viver de uma forma pacífica e que tu próprio queres uma paz duradoura.

O soberano ficou pensativo e recordou que os seus generais o aconselhavam a prosseguir a guerra, porque o inimigo era demasiado pequeno e fraco para alguma vez poder derrotar os seus exércitos.

- Faço a paz, mesmo sabendo que o inimigo está ao alcance das minhas armas e dos meus soldados? – Perguntou o rei ao adivinho.

- Ntantu kakalanga wa fyoti ko! Um inimigo nunca é pequeno. É simplesmente inimigo.

A resposta de Mandiangu fez luz no coração do rei e mal chegou à cidadela real enviou o seu mensageiro de confiança para informar o soberano vizinho que aceitava a paz e acabar com os exércitos na região.

Os povos vizinhos fizeram grandes festas em saudação à paz. Na verdade todos esperavam com ansiedade o dia em que acabasse a guerra. As mães carregavam há décadas o luto, os pais o sofrimento, os jovens a tristeza, porque sabiam que a qualquer momento podiam morrer numa qualquer investida do exército inimigo contra as suas aldeias.

Passaram os meses e a paz durava, sem qualquer perturbação. Quando passou um ano sobre o dia em que os dois soberanos decidiram assinar o tratado de paz, o rei Panzo foi visitar o adivinho. E contou-lhe como tudo estava a correr bem.

Mandiangu disse ao seu rei:

- nkuwu n’tet’a nyanga, kauzitanga ko, kana uzita wana tadi sidi mo: Um acordo de paz é leve como um molho de capim, se pesar é porque puseste uma pedra lá dentro!

A paz, todos o sabemos, é suave e leve como uma pena. Não lhe atirem pedras em pleno voo.

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