quinta-feira, 9 de junho de 2022

Angola | TRIUNFO DAS MÁQUINAS E FRACASSO DOS MAQUINISTAS – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

Um dia o capitão Melo chamou-me para dar a novidade há muito esperada: Já chegaram as duas máquinas Nagra novas! Uma vitória estrondosa para quem trabalhava na Direcção de Informação da Emissora Oficial de Angola (RNA). Particularmente para os sonoplastas e operadores de som. Nessa altura já tínhamos na Reportagem jovens angolanos que davam os primeiros passos na Rádio, apoiados por Artur Neves, o grande génio do som, e outros profissionais de altíssimo nível. 

As máquinas novas começaram a sair para as reportagens e logo no primeiro dia aconteceu uma tragédia. O Chico Simons veio ter comigo e deu a trágica notícia: Não temos o registo magnético! A Nagra não gravou. Eu soltei uma dúzia de palavrões e perguntei: A máquina não gravou ou o gajo que operava com ela é incompetente?

A tragédia aconteceu várias vezes. A Conchinha de Mascarenhas arranjou uma equipa para dar formação aos jovens repórteres e o problema ficou resolvido. Mas até à superação, só profissionais experientes tinham acesso às Nagra. Procurei saber o que tinha falhado. O Artur Neves cuidou que todos operassem os novos gravadores em circuito fechado, até dominarem as novas técnicas. Então o que falhou? O já sei. Alguns novos repórteres já tinham formação ao nível das escolas técnicas, do Instituto Industrial, da Universidade. E achavam que já sabiam tudo.

A TPA fez um investimento pesado, provavelmente nunca antes feito em Angola, nas novas tecnologias aplicadas aos Media. Parabéns. Mas desde que as emissões começaram, o desastre é visível, audível e palpável. Já não é possível esconder nem silenciar. Para bem de todos, profissionais da casa, tutela e consumidores. No segundo dia a coisa piorou e hoje atingiu o máximo da incompetência. O noticiário das 13 horas foi submerso numa onda de ruído ensurdecedora. 

Os principiantes sabem que no audiovisual, os edifícios sonoros dão a dimensão estética à mensagem informativa. A imagem tem o mesmo papel. Se há ruído, nada funciona. Tudo se desmorona. Nos três últimos dias, os noticiários da TPA são afogados numa onda avassaladora de ruído. E ninguém pede desculpa aos consumidores. Ninguém assume a responsabilidade. Ninguém quer saber por que razão as novas “nagras” vomitam ruído e erguem obstáculos intransponíveis às mensagens informativas. Um banquete de incompetência, arrogância e falta de profissionalismo. Mas também falta de respeito para com quem fez os investimentos milionários nas novas tecnologias. Deslealdade sem nome.

O noticiário das 13 horas, apesar do som sair das catacumbas de Azovstal ou de uma panela, passou uma reportagem sobre o café arábica. Chegou em força a Angola! A ignorância é muito atrevida. O meu Pai decidiu que lá e casa só comia quem trabalhava. E nas férias grandes, eu fazia trabalho infantil na tonga. Capinava das seis da manhã até cumprir as bitolas que o capataz António Kiangala me marcava. Escravatura. Nessa altura já tínhamos muito café arábica, plantado nas baixas, onde era possível cultivar com máquinas.

O café com alto valor comercial só se dá nas matas. Naquele tempo, o preço por quilo era mais do dobro. O café que dava dinheiro e estava cotado entre os melhores lotes do mundo, era o Cazengo, Ambriz, Amboim e Caturra ou café dos morcegos. O cultivo, nas matas, era cem por cento manual. O café arábica era chamado o “café da vala comum”. Tinha (e tem) pouco valor comercial. Cultivar arábica, à mão, nas baixas, é um desperdício. Juro mesmo. 

Querem enriquecer com as fazendas de café? Tenho muita pena mas estou contra. Isso só vale a pena se usarem mão-de-obra escrava. Se regressarem os contratados. Uma tragédia pior do que as “nagras” novas, não gravarem o som das reportagens. Até porque agora não temos o trovador António Jacinto chorando lágrimas do suor dos contratados, que regam as plantações. Se querem cultivar café arábica, estão à vontade. Mas distribuam máquinas aos camponeses. Não faz sentido o cultivo manual.

 Um amigo mandou-me fotos de uma actividade política do Bloco Democrático. Os dirigentes comportaram-se como indigentes mentais. Um espectáculo muito triste. Filomeno Vieira Lopes deu muito de si quando a revolução angolana estava e perigo, nos anos de 1974 e 1975. Vê-lo no papel de servente da UNITA e palhaço no palco da política é muito triste. O MPLA ensinou-nos que quem sabe mais porque estudou mais e aprendeu mais, tem o dever de fazer elevar o nível das massas. 

Os dirigentes do Bloco Democrático desceram ao nível da estupidez natural. É triste. Quero que os adversários do MPLA tenham ideias e um programa de governo credível. As palhaçadas tiram brilho à nossa vitória. E estupidificam as massas. Ficamos todos iguais aos sicários do Galo Negro. É pior do que as “nagras” novas não gravarem o som das reportagens.

Hoje fui a Londres no jacto particular, para encerrar o jubileu da ranha platinada. Ela quis armar-me cavaleiro do império britânico mas eu disse-lhe que era um cachorro corgi. Ela emendou o erro rapidamente e tirou da carteira um biscoito de comida para cão. Comi avidamente a condecoração. O Rafael Marques vomitou porcaria para cima da dele. E de repente pensei assim: Se o mundo ocidental exulta com os 70 anos de poder da rainha platinada, a partir de agora ninguém tem o direito de criticar quem se eterniza no poder. Os ditadores nunca conseguirão estar tanto tempo no poder, como a rainha platinada.

Se isto não é um perigo, não sei o que é perigoso!

*Jornalista

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