quinta-feira, 16 de junho de 2022

Portugal | A SOLUÇÃO DA COMISSÃO

Joana Petiz | Diário de Notícias | opinião

O trabalho da comissão criada em 2017 para resolver os problemas estruturais da saúde foi interrompido pela pandemia - três anos depois, é certo, e sem trabalho feito que se veja, mas quem é que se lembra disso... Há problemas diagnosticados pela senhora que lidera a saúde há quatro anos e hão de ser resolvidos, é nisso que o governo está focado. E há de encontrar soluções, nem que elas passem por importar profissionais lá de fora - assim eles estejam disponíveis para trabalhar em condições que os portugueses rejeitam. Concretizando num número, mais de 2500 médicos e enfermeiros desistiram do SNS desde o início da pandemia.

Para já, é urgente resolver o problema que afeta as pessoas que chegam às urgências e encontram os hospitais fechados ou sem mãos que lhes valham. Por isso, "vamos criar uma comissão" de cinco pessoas para observar o problema e indicar saídas alternativas. É sobre esta, com a ajuda desta, que vai traçar-se o plano do governo para resolver as questões imediatas e graves que afetam a saúde.

E já há vias identificadas, como alargar a formação, ainda que se admita que existem médicos sem vínculo e que se tenha demorado meses para colocar mais de 1200 recém-especialistas de que o SNS bem precisava que estivessem no ativo. A solução de curto prazo do governo inclui também acordos com o privado e o setor social (antes desprezados, agora fundamentais), bem como incrementos salariais substanciais, que chegam a 60% para os médicos de família, mas "apenas em casos muito específicos", conforme avisou Marta Temido, indicando que também quem somasse ao exigente serviço de urgência umas horas de trabalho extra seria recompensado num valor a negociar com os sindicatos "ainda nesta semana".

Se bem que, o pessoal "não se move só pelo dinheiro", lembrou num repente a senhora ministra, esquecida de como a degradação das condições oferecidas - a retribuição, mas também o estado dos serviços, da organização, as carências brutais e constantes, as agressões, que não vêm apenas dos doentes - tem afugentado os profissionais que tutela. É verdade que não se movem pelo dinheiro - teríamos consultórios e salas de operações vazios, se assim fosse... -, mas não ficava mal um reconhecimento mínimo do trabalho de quem há dois anos todos aplaudíamos como heróis. Pagando-lhes, por exemplo, aquilo a que o governo chama de "salário digno". Em Portugal, o salário de um médico de clínica geral não chega a 1400 euros brutos.

Resolvidas as urgências, os casos que Marta Temido não se cansa de repetir que são "situações pontuais" - as demissões em catadupa dos chefes hospitalares, a falta de profissionais de que se queixam múltiplas unidades de saúde, a incapacidade de reter médicos, enfermeiros, técnicos, as urgências fechadas em 2017, 2018, 2019 por falta de meios são mera coincidência -, a médio prazo o governo ameaça também rever o sistema e as redes de urgências, a forma como se articulam os serviços e os profissionais.

Quem toma atenção a estas coisas, tem motivos de preocupação, que se as coisas correrem terrivelmente mal isto ainda pode acabar numa reestruturação do SNS. Pelo que ouvimos a Marta Temido, é apenas a Costa que cabe decidir se mantém confiança para que continue ministra... Faz lembrar alguém?

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