Portugal: A realidade bate à porta em 2023
“A pobreza é inaceitável em pleno século XXI. Construir pontes e não muros deve ser, pois, um desígnio nacional. A desigualdade não deve condenar os pobres ao abandono, à miséria e à esmola, sob a indiferença do Estado”
“Os ricos estão cada vez mais ricos e os pobres, cada vez mais pobres”. A frase é dita amiúde, mas não são palavras à toa. A população portuguesa está mais pobre. As famílias penam com os preços dos alimentos, energia elétrica, gás e gasolina, que contagiam todos os outros preços. A inflação está nos níveis mais elevados das últimas décadas e corrói salários, e a política de subida da taxa de juros, para conter a trajetória ascendente da inflação, em nada contribui para a melhorar da economia. A pandemia e agora a guerra criaram maior fosso entre mais ricos e mais pobres, empurrando pessoas para a informalidade, para a fome e para a miséria. As últimas estatísticas põem a nu a realidade: as desigualdades na distribuição da riqueza continuam a acentuar-se. Há mais ricos, com maiores fortunas, mas também há mais pessoas no limiar da pobreza que são cada vez mais pobres. Em 2020, comparando com o ano anterior, a pobreza aumentou 12,5%, naquela que é a maior subida deste indicador em oito anos. Ao todo, Portugal tem quase 4,5 milhões de pessoas pobres. Mas com apoios sociais, este número desce para 1,9 milhões, o que corresponde a quase 20% da população. No extremo oposto, o número de ricos em Portugal aumentou cinco vezes, fazendo de Portugal um dos países com uma disparidade maior na UE.
O mundo mudou. Ainda estava a
recuperar de uma pandemia global e foi empurrado para navegar numa tempestade
geopolítica após a invasão da Ucrânia. Uma guerra que obscurece a estabilidade
económica e social. E os agravamentos tendem a acentuar-se com a economia
mundial (e portuguesa) a travar a fundo. A recessão económica global é esperada
em 2023. Multiplicam-se os avisos: com os bancos centrais a subirem os juros
para travar a alta inflação, reduzindo o consumo das famílias e o investimento
das empresas, há o risco de a economia mundial entrar
A pobreza é inaceitável em pleno século XXI. Construir pontes e não muros deve ser, pois, um desígnio nacional. A desigualdade não deve condenar os pobres ao abandono, à miséria e à esmola, sob a indiferença do Estado.
É hora de solidariedade e de agir com determinação, para erradicar, sem hesitações, a pobreza que nos envergonha em Portugal, resolvendo as causas estruturais. O país vai terminar 2022 mais pobre do que era há uma década e vêm aí tempos difíceis. A realidade bate à porta em 2023.
O Novo | Lígia Simões - Subdirectora do Jornal Económico - 31.12.2022 08:00
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