4 DE FEVEREIRO POR AMOR À HUMANIDADE!
Martinho Júnior, Luanda
O conhecimento substantivo que há sobre lógica com sentido de vida em benefício de toda a humanidade só é possível desde logo se o ser consciente de racionalidade dialética, materialista e histórica, mergulhar no estudo até às raízes dos processos produtivos transatlânticos fomentadores de escravatura, de colonialismo e neocolonialismo e assumir por inteiro a luta dos que sendo durante tantos séculos oprimidos, são hoje contribuintes fundamentais para a emergência dos equilíbrios globais a que se aspira e para o respeito tão urgente devido à Mãe Terra!
Não há processo contemporâneo justo algum que assim não tenha de ser, num momento em que com as novas tecnologias se expõe, com cada vez mais evidências, todo o passado próximo e remoto, apesar dos riscos “soft power” das alienações e formatações disseminadas pelo afã dos que persistem dominar de forma hegemónica e unipolar!
Fazer com que África desconheça a trajectória dos afrodescendentes do outro lado do Atlântico a fim de impedir a noção da necessidade de luta de libertação, desconhecer aqueles que foram para levados à força e explorados pela força feitos escravos na América (e no Caribe), faz parte do “soft power” do actual processo dominante, não do “soft power” dos que estão vocacionados para o multi polarismo e multilateralidade!
O relacionamento com os poderes de hoje nos estados que foram colonizadores e pretendem neocolonialismo conforme demonstra seu próprio comportamento, mesmo que dê muitas provas dadas durante muito tempo, responde desde logo mentalmente à opressão que vem de longe, de há mais de 5 séculos a esta parte, algo que os expedientes de poder fazem indelevelmente prevalecer!
No que toca às potências coloniais da Ásia Ocidental tanto pior: há quem propague que está num jardim e os outros estão na selva, justificando a continuação da pirataria, do saque e até do “apartheid” contemporâneo em curso!
Sereia alguma pode iludir o Sul Global, muito menos sereias monárquicas, conforme a última tendência em Angola!
Que relacionamento se pode ter com esses bárbaros?
As três datas 4 de Fevereiro com todos os sentidos e emoções palpitando desde o Sul Global transatlântico, são marcos carregados de evidências, de simbolismos e de ensinamentos: com esses marcos os combatentes da luta de libertação onde quer que seja que ela legítima e dignamente tiver de existir, se podem melhor mobilizar na sua dádiva que tanto tem a ver com amplo amor coerente, consequente e intemporal, como com um exercício saudável de inteligência, enquanto prova de multilateralidade e humanidade.
Esse é o sentido da própria Carta da ONU, que o “hegemon” com suas desesperadas regras tanto teima em subverter!
A luta armada de libertação bebe dessa ética, dessa moral, dessa sabedoria e por isso se distingue da ilegitimidade estupidificante da guerra que é da autoria da barbárie agora com essência de “hegemon” tisnado de nazi!
Os três 4 de Fevereiro são um alimento para as opções justas do presente e quem não se quiser alimentar desse passado honrando-o, é porque, directa ou indirectamente está absorvido pelos expedientes neocoloniais, tornando a paz vazia de sentido antropológico e histórico!
Há três 4 de Fevereiro que além do mais, são anti imperialistas desde a justeza da aplicação da vontade dos oprimidos contra os opressores, pelo que sua chama se apresenta hoje, na hora decisiva do parto da mudança de paradigma para um mundo multipolar e multilateral, integrando as opções próprias de segurança vital comum que toda a humanidade deve buscar, construir e assumir!
Os que seguem a doutrina neocolonial, qualquer que ela seja nas suas “nuances” (os propósitos não são variáveis), filiada ou não no engenho e na arte da hegemonia unipolar, são a causa da acumulação de todos os desequilíbrios, tensões, conflitos e guerras e, enquanto bárbaros, demonstram a impraticabilidade de diálogo em busca de consensos, por que subvertem todas as letras da essência da democracia!
Essa justeza do Sul Global é tanto mais veemente quanto o “hegemon” de novo agita o espantalho nazi, fascista e (neo)colonial!
4 DE FEVEREIRO DE 1794, ENTRE OS FRUTOS DA REVOLUÇÃO HAITIANO-FRANCESA
Os ideais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade só se puderam fazer sentir substantivamente na sua dimensão anti colonial e anti imperial quando tocou a hora da Revolução dos escravos no Haiti, em função dos próprios ideais enunciados desde a raiz da Revolução Francesa.
Entre os oprimidos, os escravos nem eram considerados como seres humanos, ou seja, os mais oprimidos entre os oprimidos, sujeitos a todo o tipo de vexames, miséria, repressão e morte, pelo que os ideais da Revolução Francesa no Haiti foram sentidos como uma inaudita força telúrica, desde o momento das primeiras revoltas em 1791!
Três anos depois delas, as revoltas foram dando espaço ao fermento da Revolução Haitiana, sob comando dos mais esclarecidos e capazes de não só operar vitoriosamente pelas armas, mas com lucidez para detectar as contradições suas e principalmente as do campo adversário, a fim de melhor jogar com elas, pavimentando o caminho da independência do Haiti!
A Revolução dos escravos no Haiti trouxe lições imprescindíveis e por isso continuam a estar na ordem do dia e a ser inspiradoras!
A única aliada de então dos escravos revolucionários, foi a não preparação das forças militares antagónicas para fazer frente a doenças tropicais como a febre-amarela, nem saber avaliar a vontade de Liberdade, Igualdade e Fraternidade dos escravos, que se manifestou além do mais na condução inteligente das opções para cada momento em função da ameaça e dos riscos e tirando partido dum sacrifício indómito nas confrontações, quer nos campos de batalha, quer quando tiveram que partir para a guerrilha ou para a negociação!
A Revolução dos escravos no Haiti foi violenta quando foi necessário usar a violência contra a opressão e repressão das forças dominadoras, mas foi subtilmente inteligente quando foi necessário negociar!
No Haiti foram sucessivamente derrotados os mais poderosos exércitos colonial-escravocratas: o britânico, o francês (Napoleão) e o espanhol!
Os revolucionários haitianos fizeram face a sucessivas guerras, invasões e traições, mas venceram sucessivamente forças que procuraram uma vez mais submetê-los pelas armas ou pelo engano, os exércitos mais bem armados, equipados e terríveis de três das quatro potências coloniais implicadas na América e os poderes mais sinistramente cínicos e hipócritas do momento!
Venceram portanto os contraditórios que traziam o sinal de interesses e conveniências que obstruíam a Liberdade, a Igualdade e a Fraternidade, sedentas de lógica com sentido de vida!
A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, paradigma da Revolução Francesa, tornou-se também bandeira para a Revolução Haitiana, o que conferiu uma dimensão transatlântica, sacudindo teluricamente os poderes dos impérios coloniais de então, cujos ecos se estendem até hoje como bandeira-matriz de todo o Sul Global!
Em princípios de
O fim da escravatura chegou dez anos antes da independência, com os haitianos ainda a ser considerados franceses…
… Julgavam os colonialistas que a sede de liberdade iria ficar por aí!
Para a Liberdade, a Igualdade e a Fraternidade, para que não houvesse dúvidas e espaço para as omissões, ou para as interpretações ou argumentos subversivos de interesses espreitando por detrás dos arbustos, faltava todavia a autodeterminação, a independência e a soberania: as contradições haviam que ser as suas próprias e não as inerentes aos impérios coloniais, ou aos expansionistas dos Estados Unidos que conspiravam a norte por via do genocídio aplicado aos povos autóctones e prolongando a escravatura dos que haviam sido arrancados à força de África e a mão-de-obra barata chinesa que era também empregue na construção dos caminhos de ferro leste-oeste, algumas das ossaturas dessa mesma expansão ao mesmo tempo apanágio da revolução industrial que então despontava!
As contradições inerentes aos estatutos sociais gerados pelos processos produtivos dos regimes colonial-escravocratas, por muito que fossem tentadas e experimentadas, haveriam também de se esbater, esvaindo-se os seus quadros de manipulação!
O 4 de Fevereiro de 1794 foi a primeira janela de Liberdade, de Igualdade e de Fraternidade aberta pela Revolução Haitiana para todo o Sul Global!
4 DE FEVEREIRO DE 1961 EM ANGOLA, MARCO DA LIBERDADE, IGUALDADE E FRATERNIDADE PARA TODA A ÁFRICA SUB-SAHARIANA
Os princípios que se colocavam aos oprimidos angolanos só podiam ser próximos daqueles que foram tão legitimamente evocados com a Revolução dos escravos no Haiti e há uma explicação histórica e antropológica para isso: era o colonial-fascismo português o regime retrógrado que mais se podia aproximar no séculos XX ao carácter dos regimes colonial-escravocratas que começaram a ter seu eclipse no século XIX.
Não chegava substituir a força muscular do escravo pela máquina: aqueles que dominavam deveriam ética e moralmente, depois de formalmente pôr fim à escravatura e ao colonialismo, que fazer tudo para se limparem mentalmente duma forma que jamais houvesse espaço para recriar o neocolonialismo por via dum atroz cinismo, ou duma subversiva hipocrisia!
As culturas do açúcar, do café, do algodão e do tabaco, entre outras mais, exigiram tráfico de escravos e mão-de-obra escrava na América, a fim de todos os excedentes reverterem a favor da riqueza criada nas potências coloniais e só um regime retrógrado poderia ir buscar esse tipo de culturas a fim de sustentar colonial-fascismo em África!
Os regimes retrógrados continuaram muito mais dependentes do músculo humano, porque eram por si incapazes de o substituir pelas máquinas!
Em Angola o regime colonial-fascista português fê-lo com tanto esmero que assim emitiu despudoradamente muitos sinais e evidências, por exemplo: fundou o casco urbano de “Moçâmedes” (nome dum escravocrata), ou transpôs (no sentido geográfico inverso ao tráfico de escravos), o modo de produção similar para as fazendas de café, de algodão e para as açucareiras filtradas até pela polícia política colonial-fascista (conforme os casos mais evidentes da Catumbela, a sul da cidade do Lobito e da Tentativa, no Caxito).
As revoltas de 1961 em Angola, sequência directa da efervescência libertadora desencadeada após a IIª Guerra Mundial, ocorreram nos campos do algodão, nos cafezais e nos ambientes suburbanos de Luanda, onde o antagonismo dos oprimidos para com os opressores eram mais gritantes, até por códigos legais a condizer com o espírito colonial, como a assimilação, o indigenato, os colonatos, as “sanzalas da paz” e o contrato, na essência eram fórmulas “soft power” para tentar esconder escravatura, opressão e repressão, sobretudo das massas angolanas camponesas e suburbanas de então, completamente expostas à devassa!
Os patriotas angolanos agiram e pensaram de forma similar a Toussaint Louverture e a Dessalines dois dos que dirigiram a Revolução dos escravos no Haiti, consolidando as opções de luta libertária, tirando partido dos contraditórios existentes no campo inimigo opressor, mobilizando as classes mais oprimidas pelo colonialismo fascista e de todos os que com maior ou menor grau de consciência tinham aprendido com os outros e consigo próprios, as terríveis lições e o pungente significado da contínua opressão e repressão transatlântica!
O peso substantivo da necessidade de ruptura existiu no Haiti como em Angola!
No 4 de fevereiro de 1961, até as armas dos que desencadearam a luta armada de libertação eram as mesmas (catanas, instrumentos agrícolas) das primeiras revoltas dos escravos no Haiti!
Se em Angola houve espaço e tempo para gerar uma consciência mais contemporânea que fosse capaz de passar a orientar a luta, é preciso não esquecer que no século XX havia fermentado a antropologia cultural típica dos processos e expedientes da Revolução Industrial, mas mesmo assim era retrógrado o colonial-fascismo porque era imposto recorrendo a mão-de-obra de tal modo barata, que de facto era mesmo mão-de-obra escrava!...
… Todas as potências coloniais se haviam de animar pelo mesmo espírito e bitola em ambas as margens do Atlântico Sul e Central e delas foi possível perceber que a luta armada de libertação só podia vencer se passasse a ser também anti neocolonialista e anti imperialista!...
4 DE FEVEREIRO DE 1992 NA VENEZUELA, A EVOCAÇÃO DE SIMON BOLIVAR PARA A LUTA CONTRA O NEOCOLONIALISMO E IMPERIALISMO
A luta contra o colonialismo na América ocorreu na primeira metade do século XIX sob a inspiração da revolução dos escravos no Haiti (apenas Cuba e Porto Rico são retardatária excepção).
Embora os Estados Unidos se tivessem tornado independentes antes do Haiti, o genocídio dos povos autóctones, a escravatura dos africanos e o expansionismo para oeste eram, à data dessa luta, marcas que denunciavam desde as origens, o carácter do poder instalado em Washington, um poder que começou logo por afectar o México, o Caribe (Cuba e Porto Rico) e as Filipinas!
A noção da necessidade de luta contra o neocolonialismo e o imperialismo foi surgindo em função do expansionismo dos Estados Unidos e da deriva transatlântica das poderosas casas bancárias da aristocracia financeira mundial, ela própria implicada nos processos coloniais surgidos no seguimento da Revolução Industrial.
Não bastou derrotar o colonialismo!
Essa aristocracia financeira mundial lidou na América com a libertação das colónias espanholas tentando sempre subverter a favor do seu domínio, enquanto em África promovia a Conferência de Berlim, retalhando o continente africano, o inerte que sobrava ao seu dispor e de acordo exclusivamente com seus interesses, conveniências e poder!
O expansionismo dos Estados Unidos na América por via do neocolonialismo, acompanhou a formulação das moedas fortes anglo-saxónicas, a Libra e sobretudo o Dólar…
O Dólar passou a ser instrumentalizado como veículo para agenciar as oligarquias de feição da aristocracia financeira mundial, que se tornaram fantoches dos processos políticos, económicos e financeiros de domínio, na esteira histórica do expansionismo!
Em África, berço da humanidade e berço do tráfico de escravos transatlânticos, simultaneamente a matriz colonial chegava até à artificiosa divisão e partilha do continente, sem qualquer sinal de ética, de moral e de justo respeito para com os povos africanos!
Como em todo o Sul Global, à aristocracia financeira mundial interessava o saque das matérias-primas e a frenética exploração de mão-de-obra barata, tirando partido das dependências criadas, pelo que após as independências das colónias espanholas, esse processo dominante vocacionava-se enquanto neocolonialismo, fosse através de regimes ditatoriais, fosse através das “democracias representativas” que não passavam de fórmulas expeditas de “levar a água ao seu moinho”!
Na Venezuela, cujo território possui a maior reserva de petróleo do planeta, tudo isso foi humanamente sentido, (sentido também por via económica, financeira e socialmente, neste caso por via duma artificiosa estratificação social), mas em função de sua própria luta libertadora sob a égide de Simon Bolivar e das lições que advinham da fermentação do império dos Estados Unidos em relação ao México, ao Haiti, a Cuba, a Porto Rico e a toda a América, a visão da necessidade duma nova luta de libertação impunha-se.
Essa foi a leitura do jovem Hugo Chavez que desencadeou o projecto duma aliança-cívico militar Boilivariana capaz de revitalizar a libertação do povo venezuelano e abrir, com uma aliança cívico-militar, a democracia à participação e ao protagonismo, ao mesmo tempo capaz de luta contra as oligarquias fantoches que moldavam o neocolonialismo subserviente ao império da hegemonia unipolar, barricadas na deliberadamente formatada “democracia representativa”!
A força telúrica dessa aliança cívico-militar que tanto foi buscar aos ideais de Simon Bolivar teve o primeiro estampido a 4 de Fevereiro de 1992, precisamente na altura em que o neoliberalismo impante sacudia o campo socialista, provocando a implosão da União Soviética, acabando com o Pacto de Varsóvia, destruindo a Jugoslávia e obrigando Cuba Revolucionária ao período especial!...
Todas as resistências foram fragilizadas e tornadas vulneráveis!
O 4 de Fevereiro de 1992 na Venezuela, que foi vitorioso em Maracaibo, Valência e Maracai… e perdeu em Caracas, havia de ser o primeiro estampido da Revolução Bolivariana, despertando a consciência popular e por isso o desgaste do regime corrupto ocorreu a ponto de nos processos eleitorais que se foram seguindo, a expressão Bolivariana ganhar e assumir o poder, dando o salto para a inspiração socialista geradora de resistência e identificando-se com a aliança cívico-militar capaz de democracia participativa e protagonismo, capaqz de luta contra o neocolonialismo e o imperialismo!
“Por ora” havia-se perdido a 4 de fevereiro de 1992, mas o processo revolucionário Bolivariano estava em marcha e para uma América saturada de neocolonialismo, a mudança de paradigma a favor da autodeterminação, da independência, da soberania, de respeito pela Carta da ONU, da multilateralidade e do imenso respeito devido à Mãe Terra, não mais parou!
Há que se avaliar melhor a amplitude da capacidade de libertação que está em curso por todo o Sul Global e, no momento em que a Federação Russa se tonifica no actual processo de luta pelo multilateralismo, a emergência e a cooperação, a memória dos três 4 de Fevereiro é por si uma dádiva de dignidade para toda a humanidade!
Círculo
Imagem da visita de Martinho
Júnior ao Mausoléu de Hugo Chavez, inspirador e Comandante da Revolução
Socialista Bolivariana – 5 de Março de 2018, Quartel
Ligações:
Hino do Haiti – https://www.dailymotion.com/video/x8ffajo;
Hino de Angola – https://www.youtube.com/watch?v=KgppoKTseoE;
Hino da Venezuela – https://www.youtube.com/watch?v=pCT67kA7NRk.
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