domingo, 29 de outubro de 2023

Angola | Manguxi e a Noiva do Vestido Azul – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

No dia 27 de Outubro de 1958 Jenny e António casaram em Lisboa, há 65 anos. Compareceram alguns familiares dos noivos e amigos, mas poucos. Couberam todos numa sala de apartamento. A capital portuguesa é uma cidade mediterrânica e tem colinas como Luanda. Nos dias de Outono há uma névoa envolvendo o casario e voam gaivotas do mar para terra, temendo tempestades. Um céu de pássaros é bom cenário para casar.

Na nossa Luanda é diferente. Cidade tropical, luminosamente vestida, tem no amanhecer o seu lado mágico. Sob essa luz coada pelas neblinas matinais que se levantam da baía, já me senti pássaro de fogo. Toda a cidade é minha. Infelizes os que dormem as últimas horas, antes de serem devorados pelas máquinas e pelos salários rastejantes. 

António, nesse 27 de Outubro de 1958 concluiu a licenciatura em Medicina. Jenny aproximava-se de África pela mão do amor de sua vida. Nem a morte os separou. Ainda hoje é a esposa de António, falecido em 1979, 21 anos depois do enlace matrimonial.

As venturas e desventuras do casal contei-as no livro “Memórias de Jenny a Noiva do Vestido Azul”. Naquele dia 27 de Outubro de 1958 ela vestia assim, de azul, como o céu sobre a serra do Pingano e as águas que desabam estrepitosamente no Kakakajungo, logo a seguir ao bico de pato e antes da aldeia de Katunda. Tudo azul como o vestido da noiva radiante. África azul da minha infância entre Camabatela e o Bindo, caminho da Kapopa ao Negage, com passagem pela oficina do senhor Gorila onde ficava à conversa com sua filha Aurora, menina de olhos risonhos.   

António e Jenny foram para Luanda. Havemos de voltar disse ele ao povo oprimido, no adeus à hora da largada. O navio afastava-se do cais e já se viam inteiras as barrocas vermelhas de Luanda. No regresso, o mesmo lugar da cidade. Barreira vermelha que deixa passar o cacimbo até aos campos de cajueiros entre Cacuaco e a Cuca. 

António trabalhava como médico. Jenny ajudava-o no consultório. Habitavam uma casinha no Kinaxixi. A luta. Sempre a luta no caminho do poeta que fez da Libertação Nacional o seu projecto de vida. Passaram os anos. Mais anos e o casal continuava a lutar. Foi nesses anos de luta, da guerra que não deixava brilhar o sol, que servimos Angola sob a sua liderança. 

O líder não dava ordens. Dizia “temos de fazer isto” ou “temos de realizar esta missão”. Fazíamos das tripas coração para cumprir. Ele ensinou-nos nos que, antes de tudo, o MPLA é uma grande família. A nossa família até à eternidade. Ele era nosso pai, nosso líder, nosso amigo, nosso camarada. O nosso Manguxi. O nosso Kilamba. Jenny sempre a seu lado. Cuidando dele, educando e criando os filhos. Foi sempre assim até o perdermos.

Jenny continua a Noiva do Vestido Azul.

Um dia destes foi receber o título de Doutora Honoris Causa pela Universidade Internacional de Roma. Os Media angolanos, públicos e privados, ignoraram esse momento de homenagem à Noiva do Vestido Azul. A esposa de Agostinho Neto. O General Zé Maria, à minha frente, chamou-lhe Mamã Grande. O bispo da Igreja Tocoísta, D. Afonso Nunes, chama-lhe Mamã Grande. É ela mesmo, Jenny a Noiva do Vestido Azul.

Ontem, dia 28 de Outubro de 2023 fez 65 anos que António Agostinho Neto se licenciou em Medicina e casou com Maria Eugénia Silva Neto. Tudo no mesmo dia. Uma data memorável. A grande família do MPLA está de parabéns, Mesmo os que já esqueceram o Fundador da Nação. O Povo Angolano está sempre de parabéns por ter Agostinho Neto entre os seus filhos. Porque é a figura política mais importante da História Universal no Século XX. Porque é nosso.

Muito obrigado ao camarada Neto muito obrigado ao MPLA. Estamos vivos e somos angolanos.

Hoje mando-vos uma foto da cerimónia em Roma do Doutoramento Honoris Causa de jenny a Noiva do Vestido Azul. Maria Eugénia Neto.

*Jornalista

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