domingo, 12 de maio de 2024

Pluralismo e Agressões Racistas -- Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

Betinho Gomes (João Roberto Correia Gomes), basquetebolista do Sport Lisboa e Benfica, o clube de Eusébio e Mantorras, participou na final da Taça Hugo dos Santos no pavilhão de Gondomar, contra a equipa do F. C. Porto. Alguns espectadores atacaram-no com insultos racistas: Preto vai para a tua terra! A polícia, delicadamente, retirou os insultadores. Por favor, voltem para os vossos lugares. Vossas excelências importam-se de parar com os insultos? Muito obrigado. Ao fim de meia hora o jogo recomeçou. Este atleta defende as cores de Portugal na selecção nacional de basquetebol. É português e negro, como tantos milhares. 

A extrema-direita portuguesa, no governo ou no partido Chega, diz que a emigração em Portugal está descontrolada! Por isso é que chovem insultos racistas e xenófobos. As milícias fascistas agridem estrangeiros que estão a trabalhar em Portugal. Trabalho com salários rastejantes. Fazem aquilo que os portugueses não querem fazer por pouco dinheirito.

Os racistas e xenófobos estão parados no tempo. E querem regressar à época em que os escravos foram libertos. Naquela época quem não percebeu a mudança, sofreu e muito. Os homens livres perderam o medo dos senhores e responderam às agressões e insultos. 

Em Portugal existem negros desde a fundação do país. Nunca esqueçam o Bispo Negro de Coimbra, kamba de D. Afonso Henriques. São tão portugueses como os brancos racistas e xenófobos. Daqui a 20 anos a população branca portuguesa é minoritária. Se querem construir o futuro com ódio racial e xenofobia, estejam à vontade. Mas se em 1975 a turma de Mário Soares e da CIA falhou a guerra civil, agora não escapa. É uma pena mancharem de sangue um país tão bonito. É imperdoável arrastrem o povo do 25 de Abril para a guerra fratricida.


O Poder Judicial em Portugal está tão contaminado que o Tribunal Constitucional legalizou o partido Chega, racista e xenófobo. Juízas e juízes devem ter pensado que isso não teria consequências. Dá-me jeito acreditar nisso. Porque num país com passado colonialista e esclavagista, essa mentalidade perdura durante séculos. Ainda hoje políticos que enchem a boca com a democracia falam de “descolonização mal feita”. Ousam defender que Portugal fez mal ao “dar a independência” aos povos das colónias. O líder de um partido da extrema-direita engravatada (Iniciativa Liberal) é retornado. Fala como um colonialista ressabiado.

Elementos das “forças da ordem” em Portugal andam a reboque do partido Chega. É notório. Só não vê quem não quer. Há em alguns sectores da sociedade portuguesa um sentimento de vingança contra os povos africanos que lutaram pela Independência Nacional.

Alguém explique aos batráquios inviáveis que a Língua Portuguesa também é negra. Ao fim de 500 anos em África, o Povo Português também é negro. Os portugueses absorveram os mosaicos culturais dos povos que colonizaram e escravizaram. Os povos africanos guardam marcas do convívio secular com os portugueses, ainda que o colonialismo seja o mais grave crime que alguma vez foi cometido contra a Humanidade. O ódio racial e a xenofobia vão acabar com tudo. As perdas serão irreparáveis para todos. 

Mas nunca se esqueçam que os portugueses de origem africana estão no seu chão. O Povo Português é o seu povo. Ninguém vai conseguir retirá-los de suas casas. O marquês de Pombal, chefe do governo português, filho de uma angolana, explicou ao embaixador inglês em Lisboa que um homem em sua casa é tão forte que mesmo depois de morto são necessários quatro para levarem o caixão. 

O ocidente alargado ergueu a bandeira do liberalismo que é uma espécie de nazismo engravatado. Um embuste sem dor para explorar, corromper e roubar. Os arautos deste radicalismo político e económico acenam com “reformas” aos votantes. Assim que se apanham no poleiro mostram que as tais reformas são malfeitorias. Ismael Mateus escreveu isto no Jornal de Angola sobre a Liberdade de Imprensa: “A situação reclama por um programa de reformas destinado a potenciar o pluralismo no exercício jornalístico, com acções de formação e de denúncia pública dos profissionais que não cumpram com a ética e deontologia”. Vem aí uma lista negra! Quem não alinhar na turma do chefe Miala está lixado.

No Jornalismo Angolano o “programa de reformas” deve prever “maior autonomia das direcções editoriais dos órgãos de comunicação social públicos e privados”. Vamos por partes. Se um jornalista em funções de direcção ou chefia for sujeito as pressões, só tem que se demitir e denunciar esse comportamento. Se a direcção editorial de um qualquer meio de comunicação social perder autonomia só tem que se demitir e denunciar publicamente intromissões da administração ou de qualquer outro poder na área da sua responsabilidade. Se um jornalista for pressionado para mentir, falsificar ou manipular só tem que se demitir e denunciar esse comportamento.

Ismael Mateus responsabiliza a ERCA pelos males do Jornalismo Angolano. A Comissão da Carteira e Ética também  responsabilizada. Os membros da entidade reguladora são eleitos na Assembleia Nacional onde estão deputados eleitos pelo Povo Angolano. Mais democrático é impossível. Ismael não confia na Casa das Democracia nem nos deputados cujo mandato foi legitimado pelo voto popular. A ERCA está a funcionar mal? Os jornalistas não precisam de instituições, funcionem bem ou mal, para exercerem a profissão. 

Os problemas do Jornalismo Angolano têm uma raiz comum: O baixo nível profissional dos jornalistas. Mas já melhorou e muito. Vai melhorar ainda mais. Com ERCA ou sem ERCA. Com Ismael ou sem Ismael. Com governo ou sem governo. Entre 11 de Novembro de 1975 e 6 de Maio de 2024 o nível profissional dos jornalistas subiu tanto que é difícil quantificar. Graças ao esforço dos profissionais seniores e dos candidatos à profissão. Mas também porque sucessivos governos e administrações das empresas, públicas ou privadas, apostaram na formação. Tanto quanto sei continuam a apostar.

Mateus fala de pluralismo. Uma piada para desopilar o fígado. O pluralismo de que ele fala atitou para a prisão perpétua Julian Assange. Matou 143 jornalistas na Faixa de Gaza. Matou o jornalista norte-americano Gonzalo Lira, na Ucrânia. Assassinado pela pide do Zelensky. O pluralismo que nos deve servir de lição, censura ferreamente os Media russos no ocidente alargado. Ordens da União Europeia. O pluralismo de Ismael Mateus acaba de expulsar de Israel o canal de televisão Al Jazeera. Pluralismo é a CIA dominar os Media nos EUA e nos países vassalos do estado terrorista mais perigoso do mundo. O Jornalismo em Angola, apesar de tudo, está vivo. As nossas e os nossos Jornalistas são bons. E vão melhorar.

* Jornalista

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