segunda-feira, 3 de fevereiro de 2025

O COBRADOR VESTE MAGA

<> Pedro Candeias, subdiretor | Expresso (curto)

Bom dia,

Os monólogos de Donald Trump são caracterizados pelas ideias desconexas, pelos saltos narrativos e pelas incoerências. Trump chama-lhes “weaving” — tecelagem, em português — o que significa que por trás das divagações intermináveis há segundo ele uma refinada técnica retórica desconhecida por todos nós; coser várias considerações que se atropelam umas às outras num só discurso é uma arte, diz Trump.

Cabe aos analistas encontrar pontos comuns, uni-los e transmiti-los numa mensagem. Uma das que costuma sussurrar ao microfone é esta: “As tarifas são a palavra mais bonita do dicionário. Precisam é de uma equipa de relações públicas para as defender”.

Donald Trump usou-a durante a campanha e usou-a novamente quando foi eleito para antecipar a guerra comercial que pretende impor ao mundo. O primeiro ensaio aconteceu com a Colômbia, quando ameaçou com tarifas ao café se o governo local não aceitasse receber os imigrantes deportados. Dobrou a vontade dos colombianos e ganhou balanço.

A seguir, Trump decretou taxas alfandegárias sobre os seus parceiros comerciais privilegiados — que, normalmente, são os que estão mais próximos geograficamente — e sobre o arqui-inimigo: Canadá, México e, claro, a China. Os argumentos utilizados vão desde o défice nas trocas comerciais entre países até à epidemia do opioide fentanil que varreu cidades e vidas americanas.

Contas feitas, estas medidas abrangem 42% — leu bem, 42% — das importações americanas. O potencial disruptivo nos preços finais e nas cadeias de distribuição é enorme e com consequências imprevisíveis.

Ora, estas tarifas pesadíssimas entram em vigor na terça-feira, e o Canadá, o México e a China já garantiram retaliações sobre os produtos norte-americanos. Nos casos canadiano e mexicano, cujas economias juntas representam apenas um sétimo da economia americana, esperam-se respostas à la carte, que incidam rotativamente sobre exportações dos EUA, nomeadamente sobre o influente setor automóvel.

Os três mercados deste continente estão intimamente ligados, há componentes que circulam livre e diariamente entre as fronteiras de todos, de norte a sul, de sul a norte, e os representantes preveem o caos.

Trump reconhece que os americanos vão “sofrer” com a inflação, mas sustenta que a balança penderá a seu favor no final. Os seus teóricos acreditam em várias coisas: o isolacionismo vai potenciar o dólar, estimular a indústria norte-americana a produzir mais e os cidadãos também a consumirem mais internamente; a redução nos impostos levará as empresas a reduzir as suas margens de lucro sem perder muito dinheiro, absorvendo o impacto da inevitável subida de preços.

Por outro lado, as tarifas podem contrabalançar a perda de receitas resultante dos cortes na tributação — e sobretudo funcionar como arma dissuasora para quiser contrariar as novas políticas de imigraçãoa diplomacia musculada e as exigências de Trump. E “muito em breve”, intimidou o presidente dos EUA esta madrugada, a Europa irá ser alvo da estratégia do cobrador da MAGA.

Weaving? 

OUTRAS NOTÍCIAS

O sol. A energia solar bateu novos recordes em Portugal e brevemente poderá tornar-se a fonte com mais potência instalada.

A candidata. Numa convenção com desfecho previsível, que vitoriou Rui Rocha à frente da IL, o facto político relevante foi a candidatura de Mariana Leitão à presidência da República.

O candidato. Marques Mendes despediu-se do comentariado político, assumiu finalmente a candidatura à presidência da República e testou chavões contra Gouveia e Melo.

As demissões. As mulheres despedidas pelo Bloco de Esquerda em circunstâncias que o Ministério Público está a investigar, escreveram uma carta aos militantes do partido a queixarem-se de humilhações. Alguns elementos da oposição interna demitiram-se, Mariana Mortágua garante não haver nexo de casualidade entre as dispensas das funcionárias e a crítica.

A manifestação. Milhares e milhares de pessoas manifestaram-se nas ruas de Berlim contra o “fim do cordão sanitário” que rebentou quando os conservadores da CDU e os extremistas da AfD votaram juntos uma proposta restritiva sobre imigrantes que acabou chumbada no parlamento.

Os triunfos. Benfica e Sporting venceram, respetivamente, o Estrela da Amadora (3-2) e o Farense (3-1) e ficam ambos à espera do resultado do Rio Ave - FC Porto, que se joga esta segunda-feira (20h45).

A história. Portugal perdeu apenas por um golo contra a França (34-35) e terminou o Mundial de Andebol no quarto lugar, o melhor resultado de sempre numa competição internacional.

Os prémios. Por razões diferentes, Kendrick Lamar e Beyoncé foram os vencedores da noite dos Grammys, que premeiam anualmente os melhores artistas e álbuns da cena norte-americana. A cerimónia não correu bem a Taylor Swift.

FRASES

“O Félix era o melhor na capacidade técnica e imprevisibilidade, mas faltava-lhe a seriedade no treino, o foco, o trabalho de um Rúben Dias”: Renato Paiva, treinador de futebol

“A máfia odiava Kennedy, a União Soviética sentia-se humilhada, mas não houve maquinação para matá-lo: Oswald é o responsável”: Gerald Posner, investigador

PODCASTS

Expresso da Manhã: “Entre querer e poder, IL é um partido unido mas bipolar na relação com o PSD”

O Animal que Ri: “Fico indignada com sistemas que aceitam a pena de morte. Se for o Estado a matar, já não é crime?”

Facto Político: “Ana Gomes não quer Vitorino, ‘um espertalhuço, um lobista de negócios’”
 

O QUE ANDO A LER

“Os Perigos da Perceção”, de Boby Duffy (ed. Zigurate)

Sabia que todos nós subestimamos a percentagem de obesidade nos países a que pertencemos, mas que sobrestimamos os níveis — o leitor saberia que isto iria dar aqui, obviamente — de criminalidade? Estas são apenas duas das várias análises apresentadas neste livro que estuda as nossas perceções, que são muitas vezes construções abstratas a partir de contextos, estímulos, informações que recebemos — e que conclui que “talvez estejamos errados acerca de tudo”.

Bobby Duffy traça a desinformação ao longo dos tempos, reconhece que as redes sociais acentuam as perceções erradas em que baseamos as nossas discussões políticas e por isso juntou variadíssimos estudos e sondagens em que participou para nos alertar para este perigo. Diria que é imprescindível.

Tenha um ótimo dia e uma excelente semana. Continue ligado ao Expressoà Tribuna, leia os nossos exclusivos e ouça os nossos podcasts.

Até breve

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