<> Pedro Candeias, subdiretor | Expresso (curto)
Bom dia,
Os monólogos de Donald Trump são caracterizados pelas ideias
desconexas, pelos saltos narrativos e pelas incoerências. Trump
chama-lhes “weaving” — tecelagem, em português — o que significa que
por trás das divagações intermináveis há segundo ele uma refinada técnica
retórica desconhecida por todos nós; coser várias considerações que se
atropelam umas às outras num só discurso é uma arte, diz Trump.
Cabe aos analistas encontrar pontos comuns, uni-los e transmiti-los numa
mensagem. Uma das que costuma sussurrar ao microfone é esta: “As tarifas
são a palavra mais bonita do dicionário. Precisam é de uma equipa de relações
públicas para as defender”.
Donald Trump usou-a durante a campanha e usou-a novamente quando foi eleito
para antecipar a guerra comercial que pretende impor ao mundo. O primeiro
ensaio aconteceu com a Colômbia, quando ameaçou com tarifas
ao café se o governo local não aceitasse receber os imigrantes deportados.
Dobrou a vontade dos colombianos e ganhou balanço.
A seguir, Trump decretou taxas alfandegárias sobre os seus parceiros comerciais privilegiados
— que, normalmente, são os que estão mais próximos geograficamente — e sobre o
arqui-inimigo: Canadá, México e, claro, a China. Os argumentos utilizados
vão desde o défice nas trocas comerciais entre países até à epidemia do
opioide fentanil que varreu cidades e vidas americanas.
Contas feitas, estas medidas abrangem 42% — leu bem, 42% — das importações americanas. O
potencial disruptivo nos preços finais e nas cadeias de distribuição é enorme e
com consequências imprevisíveis.
Ora, estas tarifas pesadíssimas entram em vigor na terça-feira, e o Canadá, o
México e a China já garantiram retaliações sobre os produtos norte-americanos. Nos casos canadiano e mexicano,
cujas economias juntas representam apenas um sétimo da economia
americana, esperam-se respostas à la carte, que incidam rotativamente
sobre exportações dos EUA, nomeadamente sobre o influente setor automóvel.
Os três mercados deste continente estão intimamente ligados, há componentes que
circulam livre e diariamente entre as fronteiras de todos, de norte a sul, de
sul a norte, e os representantes preveem o caos.
Trump reconhece que os americanos vão “sofrer” com a inflação, mas
sustenta que a balança penderá a seu favor no final. Os seus teóricos
acreditam em várias coisas: o isolacionismo vai potenciar o dólar, estimular a
indústria norte-americana a produzir mais e os cidadãos também a consumirem
mais internamente; a redução nos impostos levará as empresas a reduzir as suas
margens de lucro sem perder muito dinheiro, absorvendo o impacto da inevitável
subida de preços.
Por outro lado, as tarifas podem contrabalançar a perda de receitas resultante
dos cortes na tributação — e sobretudo funcionar como arma dissuasora para
quiser contrariar as novas políticas de imigração, a diplomacia musculada e as exigências de Trump. E
“muito em breve”, intimidou o presidente dos EUA esta madrugada, a Europa irá ser alvo da estratégia do cobrador da
MAGA.
Weaving?
OUTRAS NOTÍCIAS
O sol. A energia solar bateu novos recordes em Portugal e brevemente
poderá tornar-se a fonte com mais potência instalada.
A candidata. Numa convenção com desfecho previsível, que vitoriou Rui Rocha à
frente da IL, o facto político relevante foi a candidatura de Mariana Leitão à presidência da
República.
O candidato. Marques Mendes despediu-se do comentariado político, assumiu
finalmente a candidatura à presidência da República e testou chavões contra Gouveia e Melo.
As demissões. As mulheres despedidas pelo Bloco de Esquerda em circunstâncias
que o Ministério Público está a investigar, escreveram uma carta
aos militantes do partido a queixarem-se de humilhações. Alguns elementos da oposição interna demitiram-se, Mariana
Mortágua garante não haver nexo de casualidade entre as dispensas das
funcionárias e a crítica.
A manifestação. Milhares e milhares de pessoas manifestaram-se nas ruas de
Berlim contra o “fim do cordão sanitário” que rebentou quando os conservadores
da CDU e os extremistas da AfD votaram juntos uma proposta restritiva sobre
imigrantes que acabou chumbada no parlamento.
Os triunfos. Benfica e Sporting venceram, respetivamente, o Estrela da Amadora (3-2) e o Farense (3-1) e ficam ambos à espera do resultado do
Rio Ave - FC Porto, que se joga esta segunda-feira (20h45).
A história. Portugal perdeu apenas por um golo contra a França (34-35) e terminou o Mundial de
Andebol no quarto lugar, o melhor resultado de sempre numa competição internacional.
Os prémios. Por razões diferentes, Kendrick Lamar e Beyoncé foram os vencedores da noite dos Grammys, que premeiam
anualmente os melhores artistas e álbuns da cena norte-americana. A cerimónia
não correu bem a Taylor Swift.
FRASES
“O Félix era o melhor na capacidade técnica e imprevisibilidade, mas
faltava-lhe a seriedade no treino, o foco, o trabalho de um Rúben Dias”: Renato
Paiva, treinador de futebol
“A máfia odiava Kennedy, a União Soviética sentia-se humilhada, mas não houve
maquinação para matá-lo: Oswald é o responsável”: Gerald Posner, investigador
PODCASTS
Expresso da Manhã: “Entre querer e poder, IL é um partido
unido mas bipolar na relação com o PSD”
O Animal que Ri: “Fico indignada com sistemas que
aceitam a pena de morte. Se for o Estado a matar, já não é crime?”
Facto Político: “Ana Gomes não quer Vitorino, ‘um
espertalhuço, um lobista de negócios’”
O QUE ANDO A LER
“Os Perigos da Perceção”, de Boby Duffy (ed. Zigurate)
Sabia que todos nós subestimamos a percentagem de obesidade nos países a que
pertencemos, mas que sobrestimamos os níveis — o leitor saberia que isto iria
dar aqui, obviamente — de criminalidade? Estas são apenas duas das várias
análises apresentadas neste livro que estuda as nossas perceções, que são
muitas vezes construções abstratas a partir de contextos, estímulos,
informações que recebemos — e que conclui que “talvez estejamos errados acerca
de tudo”.
Bobby Duffy traça a desinformação ao longo dos tempos, reconhece que as
redes sociais acentuam as perceções erradas em que baseamos as nossas
discussões políticas e por isso juntou variadíssimos estudos e sondagens em que
participou para nos alertar para este perigo. Diria que é imprescindível.
Tenha um ótimo dia e uma excelente semana. Continue ligado ao Expresso, à Tribuna, leia os nossos exclusivos e ouça os nossos podcasts.
Até breve
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