quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Angola: O NÚMERO DE DOENTES NO PAÍS É PREOCUPANTE




Alexa Sonhi - Jornal de Angola

O país precisa urgentemente da intervenção do Estado para subvenção dos medicamentos no tratamento ou controlo das Doenças Crónicas Não Transmissíveis (DCNT), para que todos os pacientes possam ter acesso, independentemente dos recursos financeiros.

Na opinião do director dos serviços de cardiologia do Hospital Américo Boavida, Mário Fernandes, o cidadão de renda baixa acometido de uma Doença Crónica Não Transmissível, cujo tratamento é extremamente caro, a esperança de vida é baixa.

"As DCNT não têm cura, logo, o indivíduo passa a conviver com elas até ao último dia de vida e os custos da medicação passam a fazer parte da sua renda mensal e com os salários que se aufere em algumas instituições, fica muito complicado o paciente cumprir a medicação", acentuou. 

 Mário Fernandes disse que, "com a fraca renda mensal alguns pacientes, entre comprar medicamentos e sustentar a família, preferem cuidar das necessidades básicas da família, porque as DCNT têm mesmo um pesado encargo económico", frisou.

O cardiologista Mário Fernandes definiu as DCNT como sendo todas aquelas patologias que não têm carácter infeccioso de transmissão directa por meio de um agente causal entre os seres humanos.

Ele inclui nesse leque as diabetes do tipo 1 e 2, doenças cardiovasculares, respiratórias, hipertensão, asma, doenças mentais, cancro e pessoas que sofrem acidentes de viação, aviação e ferroviário.

De acordo com Mário Fernandes, existe uma tendência hereditária para as pessoas desenvolverem estas patologias.

"O facto de os nossos progenitores serem diabéticos, hipertensos ou com outra DCNT qualquer pode aumentar a probabilidade de algum dia um membro da família vir a contrair também a mesma doença", precisou. O cardiologista disse que este processo não é uma transmissão directa de pais para filhos, logo não se podem incluir nas doenças transmissíveis directas como VIH/SIDA, tuberculose, hepatite B e outras. Mário Fernandes afirmou que muitos chegam a ser diabéticos e hipertensos ao mesmo tempo. "Devido a essa complexidade o doente é forçado, por orientação médica, a ingerir diariamente cinco fármacos diferentes, que custam caro. Há doentes que quando são medicados questionam se vão deixar de sustentar a família para comprar os medicamentos", precisou.
 
O cardiologista garantiu que "não podemos de maneira responsável dividir os pacientes que padecem da mesma doença, entre os que podem pagar a medicação e os que não podem. Isto porque determinados medicamentos, apesar de caros, são também os mais eficazes no controlo de algumas patologias crónicas".

Face à condição financeira dos pacientes, referiu, os médicos, muitas vezes, ficam de mãos atadas, porque sabem de antemão que ao prescreverem uma medicação que o doente deve tomar de forma regular, ele não tem condições financeiras para comprar, e apesar disso, não podem deixar de passar as receitas. "Coloca-se aqui um ­dilema ético e deontológico que dificilmente nós, como médicos, conseguimos ultrapassar, porque devemos guiar-nos sempre pelo conceito de que os medicamentos eficazes são os recomendados e o eficaz geralmente não é mais barato. Por isso, a intervenção do Estado neste aspecto é necessária", realçou.

O cardiologista disse que há países que desenvolveram programas de distribuição gratuita de medicamentos. "Foi um sucesso, porque permitiu que pessoas de baixa renda tivessem acesso aos medicamentos sem que isto pesasse no seu orçamento doméstico", salientou.

Hipertensão

O cardiologista Mário Fernandes fez saber que a hipertensão é o principal factor de risco de doenças cardiovasculares. Acrescenta que a este mal é associado a tuberculose, diabetes, uso do tabaco e do álcool.

Segundo o especialista em cardiologia, todos estes comportamentos e doenças devem ser devidamente controlados e evitados porque podem entupir as artérias, que têm por missão levar o sangue que alimenta o coração. Quanto à utilização dos medicamentos, Mário Fernandes disse que de certa forma o surgimento dos medicamentos genéricos veio preencher uma franja do mercado naquilo que é o acesso a determinados medicamentos a preços mais acessíveis.

Apesar de não querer aprofundar as suas respostas acerca do assunto, o cardiologista afirmou que os medicamentos genéricos são cópias dos originais, que resultam da libertação de patentes.

Por isso, os laboratórios que não investiram na investigação produzem estas cópias, que ficam a um preço mais baixo.

Mário Fernandes defende que não pode haver riscos ou grandes diferenças entre um medicamento original e um genérico, porque não se recorre a fraudes. Logo, os genéricos devem responder às mesmas características do original. 

"Os medicamentos genéricos devem ser devidamente controlados e sujeitos a inspecção periódica para se evitar que se façam cópias que não apresentam efeitos desejados", precisou.  

Sobre a sua preferência entre os originais e genéricos, Mário Fernandes disse que ao passar receitas, guia-se pelo princípio activo da substância para que o paciente possa sentir-se bem. Logo, os medicamentos podem ser originais ou genéricos, o que conta mesmo é a disponibilidade financeira do paciente. "Mas não obrigamos os pacientes a usar uma determinada marca de medicamentos porque até não é ético. A não ser aqueles medicamentos que são recentes no mercado mundial, esses não podem ser discutíveis", frisou. 

Dificuldade no cumprimento das dietas  Para a endocrinologista e directora clínica do hospital geral de campanha, Eunice Sebastião, além da medicação, o paciente com diabetes e hipertensão deve também cumprir dieta para a doença ser devidamente controlada.

"Muitos reclamam dizendo que não têm dinheiro para seguir à risca a dieta, visto que uma vez diagnosticada a doença os pacientes terão que conviver com ela a vida toda", disse.

De acordo com a endocrinologista, a dieta não é tão difícil assim, razão pela qual ela define a dieta como sendo um programa regrado de alimentação que deve ser mantido de forma regular, onde o paciente deve ingerir pouca gordura, açúcar, sal, fazer as refeições a horas, com intervalos não superiores a três horas. "A prática do exercício físico deve fazer parte das actividades diárias do paciente. A pessoa com diabetes deve também ter muito cuidado com o seu corpo, porque tende a ficar mais sensível e qualquer feridinha pode alastrar-se acabando por ser fatal", alertou.

Cuidado com o peso das crianças

Segundo Eunice Sebastião, nos últimos tempos está a crescer o número de crianças com doenças crónicas não transmissíveis incluindo as diabetes. Muitas crianças nascem com quatro ou mais quilogramas. Isto já é bastante preocupante.

Outras crianças, à medida que vão crescendo, tornam-se mais fortes e os pais acham normal. A médica aconselha que isto deve ser motivo de preocupação, porque tais crianças acabam por desenvolver diabetes que lhes vão acompanhar a vida toda.

Para o cardiologista Mário Fernandes, a nível das crianças e adolescentes existem dois grandes problemas. O primeiro tem a ver com as doenças congénitas do coração, que precisa muitas vezes de intervenção cirúrgica e o segundo está relacionado com a febre reumática, doença que atinge muitas crianças e adolescentes. "Esta patologia grave resulta de infecções na garganta, que produzem toxinas que atacam as válvulas do coração e por falta de conhecimento as pessoas encaram as faringites como algo banal, usando formas de tratamento estranhas como esfregar limão com cinza na garganta. Isto só torna a infecção mais disseminada", disse o especialista.

Cresce número de pacientes com DCNT. Tanto no Hospital Américo Boavida, no de campanha e em alguns consultórios médicos, o número de pacientes com doenças crónicas tem aumentado.

Mário Fernandes sublinhou que o índice de rotação de cama na unidade que dirige é alto. Das 30 disponíveis para os serviços de cardiologia, todas ficam ocupadas diariamente com novos pacientes em estado avançado de hipertensão e diabetes. As abordagens dessas patologias, apelou, devem ser feitas sempre a nível primário. "Qualquer pessoa minimamente conhecedora dos novos aparelhos de medição de tensão arterial pode ajudar o outro a medir a sua tensão para saber se está no nível ou não. Se fizermos isto, vamos diagnosticar a doença mais cedo e evitar as complicações, porque as formas mais graves de manifestações de problemas com o coração são as tromboses, ataques cardíacos, derrames que levam muitas vezes à morte", conclui o médico.

A endocrinologista Eunice Sebastião disse que o hospital de campanha registou no primeiro semestre deste ano cerca de 300 novos pacientes com diabetes. Já no consultório particular que também dirige, localizado no centro da cidade, foram registados cerca de 600 novos pacientes com diabetes.

Para a especialista, este número ainda pode aumentar porque muitos têm a doença mas por falta de consultas regulares desconhecem. "Nós, como profissionais, muitas vezes nos apercebemos que o paciente já padece da doença ou poderá desenvolver pelo estilo de vida que leva", referiu.

Formas de prevenção

Quando um paciente sofre de uma Doença Crónica Não Transmissível, necessita de um controle bastante rigoroso e a falta de acompanhamento gera agravamento.

Diante disso, pode-se perceber que o melhor a fazer é investir na prevenção. Porque quando é feita a prevenção as possibilidades de a pessoa vir a adquirir uma DCNT são infinitamente menores, além da redução de custo que estas doenças acarretam.

E como forma de prevenção, os dois especilaistas aconselharam que as pessoas que estiverem acima do peso normal devem fazer por diminuí-lo, usar moderadamente o álcool, manter uma actividade física saudável, diminuir o consumo de sal, comer frutas, verduras, legumes e cereais, porque esses  alimentos são ricos em fibras alimentares, cálcio, potássio e magnésio, que são muito pobres em gorduras saturadas.

Também se deve consumir lacticínios, como leite e seus derivados e se forem desnatados e sem sal contribuem muito para a diminuição da pressão arterial.

Evitar fumar e controlar a tensão. Todos estes elementos, se forem respeitados, ajudam em grande medida na prevenção das Doenças Crónicas Não Transmissiveis.

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