A greve de fome na
prisão passa de 100 dias. Os Estados Unidos, e o presidente Obama, estão
lidando da pior forma possível com a questão. Sabe-se que 90% dos detentos
nunca foram acusados oficialmente de crime algum. Após cinco anos de governo,
passou da hora de o presidente cumprir suas promessas de campanha. Por Steven
Hsieh, da AlterNet
Steven Hsieh* -
Carta Maior
Sexta-feira passada
(17) marcou o 100° dia desde o começo da greve de fome na Baía de Guantánamo,
que recapturou a atenção internacional sobre a prisão que o presidente Obama
prometeu fechar quando tentava se eleger, cinco anos atrás.
Autoridades militares disseram que 102 dos 166 prisioneiros estão participando
da greve. Advogados dos prisioneiros dizem que esse número está próximo de 130.
Desde que a greve de fome começou há 100 dias, grupos internacionais, incluindo
o Parlamento Europeu, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e o Alto
Comissariado da ONU para Direitos Humanos, e várias nações com prisioneiros em
Guantánamo pressionaram a administração Obama a soltar os detidos ou fechar a
prisão.
Aqui estão quatro dos fatos mais perturbadores sobre a situação em Guantánamo.
1. A tortura da alimentação forçada
Trinta dos 166 prisioneiros mantidos em Guantánamo estão sendo forçadamente
alimentados - uma prática que é considerada tortura e violação da lei
internacional pelo escritório de direitos humanos da ONU. No início da semana,
a ACLU (sigla em inglês para "União Americana das Liberdades Civis"),
e também um número considerável de organizações para os direitos humanos,
enviaram uma carta para o secretário de Defesa, Chuck Hagel, insistindo no fim
das alimentações forçadas em Guantánamo.
Enquanto os militares dizem que seria "desumano" deixar os
prisioneiros morrerem de fome, vários grupos médicos e de direitos humanos
discordam.
"Sob estas circunstâncias, seguir adiante e alimentar as pessoas à força
não é apenas uma violação ética, mas pode ser elevada ao nível de tortura ou
maus-tratos", disse Peter Maurer, coordenador do Comitê Internacional da
Cruz Vermelha.
O procedimento militar de alimentação forçada envolve empurrar um tubo no nariz
do prisioneiro, através dos seios paranasais, garganta e, eventualmente,
estômago. O processo inflige muita dor e desconforto. De acordo com uma análise de documentos militares feita por Al Jazeera,
prisioneiros são algemados e forçados a "permanecerem sentados vestindo
máscaras sobre suas bocas por cerca de duas horas" enquanto um suplemento
nutricional é empurrado para seus estômagos. "Ao fim da alimentação, o
prisioneiro é removido da cadeira e levado a uma 'cela seca' sem água
corrente", a Al Jazeera conta. "Depois, um guarda observa o
prisioneiro por 45-60 minutos 'para vigiar qualquer indicação de vômitos ou
tentativas de induzir vômitos.' Se o prisioneiro vomitar, o prendem novamente
na cadeira."
2. Supostas tentativas de "desintegrar" os grevistas
Surgiram várias denúncias de que os guardas de Guantánamo estão maltratando os
grevistas com o objetivo de "desintegrá-los". Advogados do
prisioneiro iemenita Musaab al-Madhwani dizem que os guardas perseguem os
grevistas negando-lhes água potável, forçando-os a beber água não potável de
torneiras, e mantendo suas celas em temperaturas "extremamente
geladas", relatou a Agence France-Presse.
Outro advogado contou ao
Russia Today que guardas estão retirando os prisioneiros em greve dos
espaços de convívio e forçando-os a viver em celas individuais para
enfraquecê-los mentalmente.
3. Mais da metade dos prisioneiros de Guantánamo tiveram seus casos
esclarecidos para que sejam libertados. Noventa por cento nunca foram acusados
de crime algum
Dos 166 prisioneiros de Guantánamo, 86 já tiveram seus casos esclarecidos para
que sejam libertados, mas barreiras burocráticas e legais ainda os mantém
presos por tempo indefinido. Em primeiro lugar, o Congresso impôs restrições às
transferências dos presos, requisitando provas de que os possíveis transferidos
nunca ofereceriam nenhum tipo de ameaça à segurança nacional dos EUA no futuro.
Em coletiva de imprensa no último mês, o presidente Obama reiterou este fato,
dizendo que ele "iria necessitar ajuda do Congresso." Ainda, como
vários analistas apontaram, o Congresso também garantiu a Obama o poder de transferir
prisioneiros, um poder que ele nunca exerceu.
O que complica o processo são 56 iemenitas detidos em Guantánamo. Como explicou Alex Kane, o Iêmen é "um poderoso aliado dos
EUA que também possui problemas com a Al-Qaeda na Península Árabe, um grupo que
planejou ataques contra os EUA. Depois que um plano terrorista que supostamente
teve origem no Iêmen foi interceptado, a administração Obama decidiu impedir a
repatriação dos prisioneiros para o Iêmen."
4. Nenhuma possibilidade de sair senão num caixão
A greve de fome se iniciou como uma resposta ao maltrato dos objetos pessoais,
como Alcorões, dos prisioneiros, cometidos pelos guardas da prisão. Mas muitos
analistas, organizações e prisioneiros apontaram que isto foi apenas a gota
d'água. A greve representa a frustração dos prisioneiros por serem mantidos
longe de suas famílias em condições desumanas, alguns detidos por mais de 11
anos.
"Estes homens não estão passando fome para que se tornem mártires... Eles
fazem isso porque estão desesperados," declarou Wells Dixos, um advogados
que representa 5 prisioneiros de Guantánamo. "Eles estão desesperados para
ficarem livres de Guantánamo, eles não veem outra alternativa que não seja sair
num caixão."
Samir Naji al Hasan Moqbel, explicou, numa conversa de telefone publicada na página de opinião do The New York Times, que a
greve de fome é conduzida como um último recurso:
“A situação agora é desesperadora. Todos os prisioneiros estão sofrendo
profundamente... eu já vomitei sangue.
E não há previsão de fim para nosso aprisionamento. Negarmo-nos a comer e
arriscar a vida todos os dias é a escolha que fizemos.
Eu só espero que, por causa da dor que estamos sofrendo, os olhos do mundo irão
se voltem a Guantánamo antes que seja tarde.”
*Steven Hsieh é assistente editorial do site AlterNet e escritor. Para
segui-lo no twitter @stevenjhsieh
Tradução de Roberto Brilhante
Fotos: Outras Palavras
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