Carvalho da Silva - Jornal de Notícias, opinião
"Espremam-se
os velhos" - os de agora e os do futuro - parece ser a palavra de ordem do
Governo, quando observamos as políticas que concretizam a nova vaga de
austeridade.
Os cortes nas
pensões e o aumento dos impostos e outros encargos sobre os reformados e
pensionistas já vêm sendo efetuados desde o início das políticas de austeridade
e empobrecimento, mas agora trata-se de um ataque muito direto e violento.
Tudo o que foi até
aqui anunciado como conjuntural e passageiro fixa-se como definitivo e o futuro
é fortemente constrangido.
A criação de
emprego devidamente remunerado e com direitos, a valorização do tempo do não
trabalho, de direitos sociais fundamentais que se universalizaram, a afirmação
do Estado social, os avanços tecnológicos e científicos em múltiplas áreas e,
desde logo, na medicina, contribuíram para essa conquista extraordinária do
aumento da esperança de vida. Quando nas nossas sociedades há a justa
expetativa de se viver mais anos e com mais saúde, este capitalismo neoliberal
e selvagem impõe políticas que consideram tudo isto um luxo.
Em Portugal, a
redução do valor médio das pensões vem sendo progressiva em resultado das
reformas adotadas em 2001 e 2007 e, apesar do aumento de idosos que se projeta
para o futuro, segundo um estudo da Comissão Europeia que o Governo cita no
Documento de Estratégia Orçamental, o peso da despesa com pensões no PIB não
deverá crescer mais que 0,2 pontos percentuais entre 2010 e 2060. Porquê,
então, este ataque?
Os cortes
anunciados significam a consolidação de uma estratégia há muito desenhada pelas
políticas neoliberais, na União Europeia e no país, e têm quatro objetivos que
se articulam: i) utilizar as pensões, de forma ignóbil, como uma das principais
variáveis de ajustamento orçamental; ii) impor o empobrecimento generalizado da
população para concentrar a riqueza, ainda mais, nas mãos de grandes
capitalistas; iii) encaminhar para sistemas privados as disponibilidades
financeiras dos trabalhadores com melhores salários, perante o cenário criado
de que no futuro só haverá pensões de miséria; iv) impor a conceção de que cada
um trata do seu futuro, ponto final.
A sociedade
portuguesa está a ser empurrada para um estado de pobreza chocante por ausência
de meios de subsistência, mas também por degradação da saúde, de condições de
vida digna e de socialização dos mais velhos e também das crianças.
Nos 4,8 mil milhões
de euros que o Governo quer retirar ao Estado social, 1458 milhões (30%)
incidem sobre os reformados diretamente. Nesse pacote está o aumento da idade
da reforma, novas "contribuições de solidariedade", outros cortes
ainda difíceis de contabilizar e "acertos" ao sistema de cálculo que
elevarão a idade da reforma, diminuindo o valor das pensões. Mas, os cortes em
outras áreas do Estado social, como na saúde, ou os preços elevados dos
transportes, da eletricidade e de outros bens essenciais, também diminuem os
rendimentos aos mais velhos.
Entretanto, foi
anunciado que o Governo deu orientação ao Fundo de Estabilização Financeira da
Segurança Social (FEFSS) para reforçar a compra de dívida pública, aplicando aí
quase todo o dinheiro do fundo. Esta decisão é uma perigosa operação de
engenharia financeira para camuflar a dívida e vai contra as boas regras da
prudência que recomendam a diversificação das carteiras e finge ignorar a mais
que provável restruturação da dívida pública portuguesa. E, se a reestruturação
for desencadeada pelos credores, à moda grega, a Segurança Social não deixará
de sofrer pesadas perdas.
Este FEFSS é
dinheiro dos trabalhadores. De acordo a Lei de Bases da Segurança Social, os
governos devem enviar regularmente, o que nem sempre têm feito, o valor de 2 a 4 pontos percentuais da
quotização dos trabalhadores para o fundo, por forma a que este possa
assegurar, em situação de grande dificuldade, a cobertura das despesas com
pensões por um período mínimo de 2 anos.
É, pois, o futuro
de todas as gerações que está a ser posto em causa com estes saques
vergonhosos, com a destruição de emprego, com a redução de salários.
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