Um Conselho de
Estado revelador
Pedro Marques Lopes
– Diário de Notícias, opinião
1 Só alguém muito
ingénuo acreditaria que a reunião do Conselho de Estado seria para debater as
"perspectivas da economia portuguesa no pós-troika, no quadro de uma
economia união económica e monetária efectiva e aprofundada". Também
ninguém acreditaria que se tenha perdido sete horas a debater a necessidade dum
"aumento de competitividade e de crescimento sustentável" ou "se
a União Económica e Monetária deve criar condições para que a União Europeia e
os Estados-Membros enfrentem, com êxito, o flagelo do desemprego", como
consta do comunicado final. Mal estávamos se existissem pessoas no Conselho de
Estado que pensassem que não era preciso combater o desemprego ou promover o
crescimento. Mas não foi preciso especular sobre os temas que foram debatidos...
Poucos dias bastaram para que se soubesse muito do que se passou na reunião.
Já não seria pouco
termos percebido que o Presidente da República apenas convocou o Conselho de
Estado não para discutir o pós-troika mas para segurar o Governo. Tentar criar
a ilusão de que os seus conselheiros estariam também interessados no consenso
em redor duma solução em que só Gaspar e Passos Coelho acreditam.
O comunicado que
falava do dito consenso estava até já escrito, mas os conselheiros mostraram
que só Cavaco Silva acompanha o ministro das Finanças e o primeiro-ministro. E,
assim, mais isolado ficou o Presidente da República. Mais, Cavaco Silva
convocou um Conselho de Estado para que este apoiasse a sua insustentável
posição de não deixar cair o Governo e fragilizou-o ainda mais quando ficou
claro que a ruptura entre o Governo e a esmagadora maioria dos sectores sociais
é irreversível. Mais: pela primeira vez, até pessoas fora do jogo partidário e
conhecidas pela moderação, como Jorge Sampaio, falaram claramente da possibilidade
de eleições antecipadas.
Este Conselho de
Estado foi mais um tremendo erro político de Cavaco Silva: mostrou que o
consenso em redor das políticas do Governo é impossível e mostrou que o
Presidente é incapaz de ser um moderador, um agregador de vontades, um
verdadeiro garante do regular funcionamento das instituições, ou seja, é uma
inutilidade institucional.
Provavelmente mais
grave ainda foi a indicação que este Conselho de Estado nos deu sobre o
respeito pelas instituições dos nossos mais relevantes actores políticos.
Foi dado mais um
passo no processo de degradação das instituições. E este processo, como é
óbvio, acontece por causa das pessoas que as servem. Soubemos da convocação do
Conselho de Estado por um comentador que também é conselheiro de Estado;
tivemos conhecimento dos pormenores da discussão através de membros não
identificados que ignoraram olimpicamente a obrigatoriedade de sigilo. No
fundo, nada que não se passe no Governo, em que as mais pequenas discussões no
Conselho de Ministros se sabem passados poucos minutos e os jornais chegam ao
limite de contar que o primeiro-ministro faz apelos aos ministros para que
respeitem a confidencialidade...
Em vez de gente com
sentido de Estado e consciente das imensas responsabilidade que tem, temos
algumas pessoas que se portam como concorrentes dum qualquer reality show,
desesperadas por tudo revelar, como se um Conselho de Estado ou de Ministros
fosse uma espécie de jogo em que se ganham pontos por contar histórias. Como é
que pessoas que têm este tipo de comportamento podem legislar sobre violações
ao segredo de justiça ou criticar quando processos em investigação aparecem nos
jornais?
Os reality shows já
tinham chegado à justiça, agora estão por todo o lado.
Não sei o que será
pior: não termos Presidente da República quando mais precisávamos, se este
desrespeito pelas instituições que os nossos mais importantes políticos
revelam.
2 Wolfgang Schäuble
disse que "não existem derrapagens orçamentais" e que Portugal é um
caso de sucesso "no ajustamento a que está a proceder". Só falta
mesmo dizer-nos que há petróleo no Beato.
3 Talvez não fosse
má ideia explicar a Vítor Gaspar que os créditos fiscais não dão grandes
resultados quando as empresas não conseguem vender a ninguém, ou seja, obter
receitas. Talvez até seja por isso que os bancos, nomeadamente a CGD, têm dito
que não aparecem projectos de investimento para financiar.
Título PG - imagem Ferroadas
Sem comentários:
Enviar um comentário