Eduardo
Oliveira Silva – jornal i, opinião
Afinal
onde estão os interesses dos portugueses perante o quadro de tensão que
vivemos?
Além
de fazer cortes de toda a espécie sob as mais diversas formas, o governo não
tem propriamente governado, como ontem assinalava José Pacheco Pereira na
crónica da “Sábado”.
A esta constatação pode somar-se outra: Passos lidera uma sucessão de episódios de conflitualidade que podem permitir-lhe abrir uma crise política, pensando que isso favorece o PSD e a coligação, por poder justificar eleições antecipadas num momento em que o PS está fragilizado.
A
crise pode concretizar-se no momento em que o Tribunal Constitucional decida
sobre questões como a CES, que está em análise no orçamento rectificativo. Uma
eventual decisão desfavorável tem duas respostas potenciais com algumas
variantes secundárias: um aumento imediato de impostos ou o governo fazer crer
que deixou de ter condições para cumprir o seu projecto (como se ele
existisse).
Nos últimos tempos o governo tem afrontado o Tribunal Constitucional e, o que é inédito, os seus membros individualmente, não se limitando às decisões colegiais. Passou até a uma fase em que responsabilizou o TC por discriminar funcionários públicos quando na realidade quem estava a criar o problema era o executivo. Num lampejo de lucidez, a certa altura da tarde de ontem lá anunciou que afinal os subsídios dos funcionários públicos terão regularização homogénea, faltando resolver o problema do sector empresarial do Estado (como se houvesse diferença). Poiares Maduro tinha dito o contrário na véspera. Repetiu o ridículo dos briefings, provando que em termos de coordenação política Relvas faz muita falta. E assim entrámos na fase da pura guerra de guerrilha institucional.
Paralelamente, o governo iniciou um processo de condicionamento do Presidente da República quando fez saber (violando o sigilo das reuniões de trabalho entre Cavaco e Passos) que solicitou que as medidas referentes à austeridade sejam objecto de fiscalização prévia do Tribunal Constitucional. Parece um pedido banal, mas substancialmente é uma forma de condicionar o Presidente, a quem competem essas decisões.
Com
esta manobra o governo procura apresentar Cavaco Silva como protagonista
sistemático de uma luta política que já envolve um órgão de soberania como o
Tribunal Constitucional. Se manda, Cavaco é pró-governo; se não manda, é
pró-Tribunal. Resultado prático: há mais uma instituição metida ao barulho, o
que é mau. Falta ver a reacção de Belém, ou a falta dela.
Eleições lá para Outubro/Novembro são um cenário susceptível de agradar a um governo que não pode ter a certeza de chegar ao fim do seu ciclo numa situação económica melhor que a actual.
A dinâmica do Verão e o impacto positivo do turismo, a par do facto de parte das pessoas terem mais dinheiro no bolso pela reposição salarial e eventuais reembolsos de IRS, podem dar ao governo a ilusão de que seria favorecido num confronto eleitoral, desde que não acarrete totalmente com as culpas políticas de uma crise que leve o país às urnas.
Sobra a questão do Orçamento de 2015, mas a verdade é que, sendo uma situação complexa, não é a maior das desgraças, uma vez que haveria a possibilidade de governar um mês ou dois por duodécimos.
Evidentemente
que estamos no domínio da futurologia, mas a realidade do quotidiano não
permite afastar uma aceleração política, como o próprio primeiro-ministro
admitiu, ao ponto de ter anulado uma ida relâmpago ao Brasil, o que certamente
não terá como única causa o facto de não gostar de futebol.
Perante este cenário global, é caso para perguntar onde entram os interesses
dos portugueses e do país, cuja situação ainda há poucos dias o governo dramatizava
invocando a necessidade de credibilidade externa.
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