terça-feira, 1 de julho de 2014

Portugal: QUANDO PEDRO ANULOU PAULO



Eduardo Oliveira Silva – jornal i, editorial

A crise de há um ano foi péssima, mas Passos superou-a e o governo deve cumprir o mandato até ao fim

Um ano depois da sua demissão irrevogável, Paulo Portas está no governo como vice-primeiro-ministro, mas sem que o CDS tenha ganho mais peso nas decisões, como se tem visto pela evolução dos impostos, por exemplo.

A crise da irrevogável saída de Portas teve basicamente efeitos no reforço da sua posição pessoal e institucional. Permitiu também introduzir no governo um homem ligado às empresas, Pires de Lima, que agrada a investidores e empresários, embora não tenha ainda tido um caso de grande sucesso. Seja como for, Pires de Lima gere bem a sua área, tem peso político e pode ver-se nele um candidato à sucessão de Paulo Portas se este decidir não permanecer à frente do CDS em função dos resultados das legislativas de 2015, às quais evidentemente Portas se apresentará como líder do partido. É nesse sentido que se deve analisar o protagonismo do ministro da Economia dos últimos dias. Para já, o delfim é ele.

Quanto ao governo, nada de novo, a não ser a confirmação de que não há reforma do Estado mas mais do mesmo, nomeadamente cortes nas reformas, nas pensões e nos apoios e prestações sociais. Apenas uma coisa mudou um ano depois da crise que custou milhões a Portugal, aumentando significativamente os juros durante semanas até que a conjuntura europeia alterou o ciclo num sentido positivo para todos os países da Europa. Trata-se da expectativa de duração do executivo. É agora consensual que o governo irá até ao fim sem se desfazer. Estamos, todavia, na fase das manobras entre partidos da coligação, com o CDS a fazer valer a sua posição de charneira para não se comprometer em excesso com alianças futuras.

A estabilidade conseguida há um ano tem muito a ver com a resiliência política de Passos Coelho, que logo afirmou que não se demitia e não desistia do seu mandato. Onde muitos falhariam, Passos soube usar de uma firmeza que serviu de exemplo à cúpula do CDS, que também pressionou Portas para ficar. Este percebeu mesmo que corria o risco de o partido ficar no governo sem ele, embora objectivamente hoje o CDS até tenha menos peso na coligação.

Por essa altura, a crise foi tão grave que até o Presidente estava disposto a convocar eleições antecipadas (as quais hoje já teriam ocorrido) se houvesse um quadro de entendimento futuro dos partidos do arco da governabilidade. Agora essa hipótese está arredada e quando muito poder-se-á retocar o calendário antecipando as legislativas para não termos três eleições sucessivas, embora seja duvidoso que Passos aceite o cenário.

Se Seguro tivesse aceitado a disponibilidade de Cavaco, hoje chefiaria um governo, mesmo que de coligação. Se tivesse avançado, não estaria agora a braços com uma guerra interna no PS, apesar de ter vencido duas eleições. Como há dias ironizava Alberto João Jardim, assistimos à curiosidade de o partido vencedor estar a discutir a liderança e isso não acontecer no partido perdedor. Também na política se pode aplicar aquela máxima dos jogadores e treinadores de futebol quando perdem um jogo depois de o dominar: o futebol é mesmo assim.

A política também.

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