Luís
Reis Ribeiro- Dinheiro Vivo
"O
Banco Central Europeu não tem legitimidade democrática, os seus decisores não
foram eleitos", acusou hoje Paul De Grauwe, professor da Universidade de
Leuven e da London School of Economics. Para o economista, "a crise do
euro não terminou".
Na
palestra que deu na conferência "Afirmar o futuro", organizada pela
Fundação Gulbenkian, em Lisboa, o economista arrasou com o "sucesso da
zona euro" mostrando que a região entrou em divergência com o grupo de
países que tem moeda própria (não euro), como Reino Unido, Suécia, Polónia.
Tudo
porque o BCE ficou a tomar conta da reanimação da economia via crédito (lado da
oferta) e os Governos passaram para segundo plano na promoção do crescimento e
do investimento.
"É
preciso consertar o lado da procura", reclamou. "A Alemanha tem
dinheiro [via endividamento] quase de graça", tem a obrigação de fazer
mais investimento. Mas há um "dogma" que antes tem de ser vencido:
que o investimento só pode ser financiado com receita, nunca com dívida.
"Nem
as empresas fazem isso. Temos de acabar com essa regra estúpida",
defendeu.
De
Grauwe fez um estudo sobre o que aconteceu nos últimos anos ao Reino Unido e à
a Espanha, que apresentou em Lisboa.
"O
Reino Unido pôde desvalorizar a moeda, a libra. Conseguiu lidar melhor com esta
segunda fase da crise. Estabilizou a dívida". "Espanha teve de
aplicar mais austeridade e, no entanto, a dívida continuou subir".
Com
um crescimento nominal superior no RU e muito mais baixo em Espanha, esta ficou
com um problema grave para servir a dívida. É que o crescimento nominal da
economia é inferior à taxa de juro de longo prazo.
E
quem diz Espanha, diz Portugal, frisou.
Com
desvalorização cambial, torna-se mais fácil servir os juros.
Mas
o seu ponto vai mais além. "O que a História nos mostra é que em casos de
crise é o governo que força o banco central a fornecer liquidez. Não foi o que
aconteceu na zona euro."
"O
BCE não tem legitimidade política porque os seus decisores não foram
eleitos" e "a governança que hoje temos não serve; não podemos
aceitar e não vamos aceitar que esta seja a forma de gerir o sistema no longo
prazo".
Portanto,
continuou o economista belga, "temos de criar um governo europeu e o banco
central tem de ficar subordinado ao poder político". O Parlamento Europeu
também precisa de mais poder, defendeu.
E
o que temos hoje? "O banco central tem de ser o prestamista (credor) de
última instância. Para os bancos e para os governos. Isto desapareceu na zona
euro, mas antes os países beneficiavam desse tipo de instituição", na
altura em que tinham moeda própria".
Hoje,
os países do euro, e no caso dramático da periferia, fazem "emissão de
obrigações numa moeda que não controlam" cujo o valor é definido pelos
mercados.
"O
euro é assim como uma moeda estrangeira. E os países do euro são como a
Argentina que emite em
dólares. No fundo, tornámo-nos todos argentinas",
defendeu De Grauwe.
Mas
não é só a hegemonia do BCE na gestão desta crise que teve um efeito
destruidor.
"Os
credores deviam ter dado mais tempo à periferia para ajustar."
"Se
alguma austeridade era necessária, e eu não digo que alguma coisa não tinha de
ser feita, deveria ter havido um equilíbrio. Os credores deviam ter feito mais
para puxar pela economia europeia, investindo mais".
Mas
"por por cada devedor descuidado, há um credor descuidado", disse
Paul De Grauwe arrancando sorrisos por toda a sala.
"A
objeção dos credores em relação a estas críticas é que tudo isto é temporário e
pdem aos países devedores que sejam pacientes, que a austeridade dará
resultados mais tarde".
"Mas
eu pergunto. Quanto tempo devemos ser pacientes?"
Segundo
cálculos do economista, para reduzir a dívida de Portugal e Irlanda para
metade, os países vão levar no melhor dos cenários 15 anos. No pior, mais de 25
cinco. "Vão ser décadas de austeridade", exclamou.
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