Carlos
Pimenta – jornal i, opinião
A
subserviência do político em relação ao económico faz-se tanto nacional como
internacionalmente. O crime organizado de colarinho branco aproveita-o sempre
que pode
1.
Afirmar que a corrupção faz parte da natureza humana, ou que é um produto
cultural, engana-nos e reforça a inoperacionalidade social. A corrupção
envolvendo baixos recursos, a mais frequente, pode criar essa ilusão. Contudo
não é ela que destrói o nosso labor por uma vida mais digna, e impede que
sejamos plenamente cidadãos.
Muito
mais preocupante é a corrupção que enfraquece a autonomia relativa da política
perante o mundo dos negócios. A propriedade cria poder, a produção e a
apropriação da riqueza moldam as interacções sociais dominantes, os
referenciais ideológicos. E se os economicamente poderosos sempre tiveram
intensa e sistemática capacidade de influenciar a organização política vigente,
a fortíssima concentração da riqueza mundial num restrito número de famílias, a
circulação dos capitais sem entraves e a desregulação têm diminuído a fraca
autonomia do Estado em relação ao poder económico. A postura social-democrata
de controlo político da actividade económica metamorfoseou-se na dependência do
Estado do funcionamento dos mercados, espaços invisíveis e míticos de
manifestação do poder da propriedade.
A
corrupção de elevados recursos pretende quebrar os poucos laços de autonomia
que o Estado preserva.
Esta
arma da subserviência do político em relação ao económico faz-se tanto nacional
como internacionalmente. O crime organizado de colarinho branco aproveita-o
sempre que pode.
O
financiamento privado das campanhas eleitorais enche as contas dos políticos e
o domínio dos senhores do dinheiro, mas diminui a confiança das populações,
aumenta o absentismo, reduz a solidariedade, enfraquece a democracia,
transforma progressivamente "um voto, uma pessoa" em "um euro,
um voto".
3.
O caso Espírito Santo tem revelado algumas facetas deste mundo sórdido.
Agora
que já saiu do átrio, a sucessão de acontecimentos apontam o calvário para
muitos: novas fraudes a serem descobertas, prolongado fechar de olhos da
supervisão, declarações políticas de apoio a Ricardo Salgado (que participou num
Conselho de Ministros sobre política económica!) quando já havia dados
suficientes para se ter intervindo, subserviência ao Banco Central Europeu,
risco sistémico sobre o débil e endividado sistema bancário português, impactos
de desestruturação e destruição da actividade produtiva do país.
As
declarações formais da primeira hora esfumam-se e a CGD, o Estado e os
contribuintes pagam uma parte do que os antigos administradores e proprietários
colocaram em contas protegidas pelo sigilo.
A
pressa de vender pode não ser apenas tontearia, ausência de senso comercial e
preocupação orçamental. É uma forma de arquivar investigações inoportunas
(veja-se, por exemplo, as comissões da compra dos submarinos e a chantagem
implícita de Ricardo Salgado), quiçá render luvas e vender barato a
"amigos", de campanhas eleitorais e circuitos financeiros
internacionais previamente estabelecidos.
Escreve
à sexta-feira
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