“O
BES, que tem 55,71% do BESA, vai impugnar as decisões tomadas na reunião dos
accionistas que decorreu esta quarta-feira. Queixa-se de ter sido convocado
para a reunião em cima do prazo e de a sua representante ter sido impedida de
entrar na assembleia geral, alegadamente por ter chegado atrasada”, afirma o
jornal português Expresso.
Orlando Castro - Folha 8 Diário
Nada
de novo, portanto. Esta novela (ver notícia Sonangol, BESA, Banco Económico,
regime & Cª) vem mostrar, mau grado os arautos angolanos e portugueses, que
não basta virar os binóculos ao contrário para que o jacaré vire lagartixa.
Angola
está na moda e, por isso, pouco importa que o regime da república seja
monárquico. É um país rico e estável (não importa o preço dessas estabilidade)
e por isso é o epicentro de grandes negócios, de volumosos investimentos. Se
todo o mundo sabe onde fica Luanda, Portugal ainda melhor sabe. É um daqueles
casos em que a mão estendida tem resultado sempre. Ou quase.
Não
admira, por isso, que Portugal continue de cócoras. Lisboa sabe quem manda e,
sobretudo, quem continuará a mandar por muitos anos.
Qualquer
empresa (bancos incluídos) pública ou privada quer ter negócios com Angola.
Depois de se afirmar como uma potência militar na região, o país está agora a
conduzir a locomotiva económica, preparando-se para ser um caso paradigmático,
pouco importando outros níveis da sociedade, nomeadamente de seriedade e
honorabilidade.
E
para o sucesso ser completo, é preciso olhar mais além. É por isso que, por
exemplo, o ministro das Relações Exteriores, Georges Chikoti, defende a
necessidade do fortalecimento do processo de internacionalização das empresas
angolanas, à semelhança da Sonangol e, sobretudo, do império empresarial
liderado por Isabel dos Santos.
Segundo
o ministro, as políticas públicas de apoio e promoção às empresas que pretendem
lançar-se no mercado internacional devem constituir uma plataforma do Estado,
para garantir a sua participação de forma competitiva e sólida, na perspectiva
de crescimento nos mercados internacionais.
De
acordo com o ministro, a iniciativa do Executivo em apoiar a
internacionalização das empresas angolanas deve ser amplamente apoiada pelas
instituições financeiras e afins, de modo a conferir maior confiança e
estabilidade das empresas públicas.
Na
mesma linha, o ministro da Economia, Abrahão Gourgel, considera que o programa
nacional de desenvolvimento do Executivo inclui a internacionalização de
empresas e a diversificação da economia nacional e o fortalecimento do sector
empresarial público.
George
Chikoti reafirma o compromisso do Estado de criar uma base económica controlada
por angolanos, com vista a ultrapassar o desnível competitivo que separa as
empresas nacionais das de referência internacional.
“É
necessário adoptar uma política proteccionista que estimule a competitividade
das empresas e da formação da classe empresarial do país através de programas
específicos, voltados para a capacitação de formação de empresários e
gestores”, defende George Chikoti, acrescentando que “é importante a
operacionalização do Fundo de Fomento Empresarial e o desenvolvimento do
programa ‘Feito em Angola’, para promover a contratação pública de produtos
nacionais, com a devida monitorização das empresas que tenham aderido ao
programa”.
Sendo
crescente o interesse de entidades estrangeiras que solicitam investimentos
angolanos, George Chikoti garante que o Governo dará todo o apoio para que isso
aconteça, seja em matéria de facilidades financeiras ou inclusive no
fornecimentos de equipamentos.
Ainda
não há muito tempo, era então ministro dos Negócios Estrangeiros deste mesmo
Governo, Paulo Portas afirmou que Portugal considerava que o fenómeno das
“Primaveras Árabes” foi provocado pela asfixia da liberdade e pela falência de
regimes autoritários.
Traduzindo
as afirmações de Paulo Portas, que têm obviamente leituras diferentes consoante
os protagonistas, ficou a saber-se que em Angola, embora o regime autoritário
de Eduardo dos Santos esteja socialmente falido e a liberdade já nem respire,
tudo é diferente.
Embora
José Eduardo dos Santos esteja no poder desde 1979, sem nunca ter sido
nominalmente eleito, ainda está no galarim dos bestiais e por isso merece toda
a confiança, apoio, solidariedade e outras mordomias. Quando passar a besta,
então sim, Paulo Portas vai dizer que o regime angolano asfixiava a liberdade.
De
facto a liberdade já não respira e o regime angolano é autoritário, para além
de desonesto e pouco sério como hoje o demonstrou no caso BESA. A liberdade só
existe para pensar o que o regime quer, e o regime mostra todo o seu
autoritarismo e desonestidade ao querer que os seus súbditos sejam carne para
canhão.
“Muitos
destes países (árabes) pedem muita informação a Portugal e solicitam muitos constitucionalistas,
muitos políticos experientes no nosso país, para lhes poderem dizer o que é que
aconteceu há cerca de quatro décadas em Portugal e como é que se fez a
transição de uma Constituição para outra, de um regime para outro. Nós nessa
altura tivemos seis governos provisórios até chegarmos à normalidade
constitucional”, disse Paulo Portas quando visitou a Tunísia.
Para
Paulo Portas, repita-se, foram a falta de soluções, a ausência de liberdade e o
poder prolongado de regimes autoritários as causas das mudanças nos países do
Norte de África. Quando disse isto estaria a pensar no seu grande, embora
recente, amigo José Eduardo dos Santos?
Seja
como for, o governo português continua desesperadamente à espera da OPA (Oferta
Pública de Aquisição) do MPLA sobre Portugal. Que importa que Angola seja de
facto, que não formalmente, uma ditadura? Sim, o que é que isso importa tanto
para o governo português supostamente social-democrata, para um
vice-primeiro-ministro democrata-cristão ou para um presidente da República que
é um misto de nada com coisa nenhuma?
A
única coisa que conta é o petróleo, que é um bem muito – mas muito – superior
aos direitos humanos, à democracia, à liberdade, à cidadania, à seriedade.
Reconheça-se, contudo, que a hipocrisia não é uma característica específica de
Portugal, se bem que tenha nele alguns dos seus mais latos expoentes.
E
como Angola tem petróleo, ninguém se atreve a perguntar a Paulo Portas se acha
que Angola respeita os direitos humanos. Além disso, como não poderia deixar de
ser, ele não vê o que se passa mas amplia o que gostava que se passasse. Vai
daí não se cansa (embora sem a mesma efusividade de José Sócrates) de enaltecer
os méritos do regime angolano.
É
claro que em Angola, tal como nos restantes países da Lusofonia, existem muitos
seres humanos que continuam a ser gerados com fome, nascem com fome e morrem,
pouco depois, com fome. Mas, é claro, morrem em português… o que significa um
êxito também para Portugal.
Recordam-se
que, no dia 6 de Maio de 2008, o músico e activista Bob Geldof afirmou, em
Lisboa, que Angola era um país “gerido por criminosos”? Ele disse, mas nem
Cavaco, nem Sócrates, nem Passos Coelho, nem Paulo Portas ouviram. E não
ouviram porque as verdades são duras e Eduardo dos Santos, não iria gostar que
eles dissessem que ouviram.
Mas
que continua a ser gerido por criminosos, isso continua.
Sem comentários:
Enviar um comentário