Nuno
Ramos de Almeida – jornal i, opinião
No
momento em que o PS entroniza António Costa e este reclama a maioria absoluta
para um programa de pacto de estabilidade com voz doce, parte da Europa
revolta-se
Um
dos mais prestigiados analistas do jornal "Financial Times", Wolfgang
Münchau, escreveu com todas as letras há poucos dias: "Vamos assumir que
partilha o consenso do que a zona euro devia estar a fazer neste momento. E que
especificamente defende que devia haver mais investimento público e
reestruturação da dívida. Agora faça a seguinte pergunta: se for um cidadão de
um país da zona euro, qual é o partido político que tem de apoiar para que isso
aconteça? Pode ficar surpreendido, mas não tem muita escolha. Na Alemanha, o
único que está próximo dessa agenda é o Die Link, os antigos comunistas; na
Grécia será o Syriza; e em Espanha o Podemos, que lidera neste momento as
sondagens", assim começa o artigo intitulado sintomaticamente: "A
esquerda radical tem razão no que respeita à dívida na Europa."
Wolfgang
Münchau avisou que em mais lado nenhum se podia ver uma agenda realista para a
Europa. Os socialistas e os sociais-democratas macaqueavam algumas medidas
avulso quando estavam na oposição para depois cumprirem caninamente, como
Hollande, o plano contrário. Bastou assistir à cerimónia que entronizou António
Costa este fim-de-semana, e à ausência de definição clara do que vai ser o
programa económico, caso sejam governo, para perceber que estamos perante um
discurso de Miss Universo a garantir que deseja "a paz no mundo". É
bonito, mas não indicia nada de bom, pelo menos fora do desfile em fato de
banho.
Num
episódio da série "Yes, Minister", um assessor de comunicação
aconselhava o governante: "Se vai anunciar algo que faça uma mudança real,
escolha um cenário com mobiliário tradicional, um fato formal e música
clássica. Se for para ficar tudo na mesma, vista uma roupa informal, use um
quadro contemporâneo como fundo e troque a 'Sagração da Primavera', de
Stravinsky." Neste fim-de-semana, no Congresso do PS, pudemos ouvir Maria
do Céu Guerra, e várias declarações de esquerda, quando soubemos que a
governação, seja qual for o partido do bloco central que for eleito, continuará
a virar à direita, apesar de o PS continuar a fazer pisca-pisca à esquerda.
Só
é possível cortar com o desastre em que nos encontramos rompendo com a política
dos credores. Não aceitando o Pacto de Estabilidade. Exigindo uma vida
democrática em que os cidadãos decidem o futuro do seu país, em vez de
permitirem que ele seja imposto por uma burocracia não eleita, em prol do grande
capital financeiro rentista que vive à conta dos contribuintes e da destruição
dos serviços públicos.
Em
quase todos os países sujeitos aos ditames da troika houve uma alteração das
forças políticas. Portugal é até agora a excepção. Isso deve-se apenas a uma
razão: as forças políticas que se opõem às políticas de bloco central não
deviam ter como único objectivo condicioná-las, mas vencer, para traçar outro
rumo. Ora isso só é possível afirmando a vontade de não aceitar as condições de
impossibilidade que nos querem impor.
Como
escreve Wolfgang Münchau, a tragédia da zona euro está na resignação aos
partidos do centrão que vão conduzir a Europa a uma situação económica
equivalente a um Inverno nuclear.
Editor-executivo - Escreve
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