O
problema é que Portugal olha para o seu umbigo europeu e esquece o seu coração
africano. Exactamente ao contrário dos seus antepassados. Um país que deu luz
ao mundo sobrevive agora à luz de um candeeiro… apagado.
Orlando Castro
Portugal
está há muito tempo (há demasiado tempo) adormecido com o sonho europeu,
esquecendo que a sua História está também e sobretudo em África. Ou seja, o
presente (já com cheiro a mofo do passado) é em Bruxelas mas o futuro será – se
ainda for a tempo – certamente em Luanda ou Maputo.
Quando
acordar vai ter um enorme pesadelo. De uma forma geral, Portugal continua a
valorizar o acessório e a subestimar o essencial, seja qual for o governo. Por
isso, julga que o idioma (eu prefiro falar da língua) é algo que não precisa de
ser alimentado, que não precisa de ser valorizado.
É
pena. Por este andar, não tardará muito que a Lusofonia dê lugar à francofonia
ou a outra fonia qualquer.
Em
vez de se potenciar a língua como o principal elo de ligação, como factor
decisivo de todas as outras vertentes da sociedade globalizada, Portugal pensa
que essa é uma vitória eterna. E não é.
No
seio da Europa, Portugal não está a crescer. Está a aguentar-se mal e, embora
ainda não assinada, a certidão de óbito já está passada. Apenas isso. E até mesmo
em matéria cultural poderia dar, ou voltar a dar, luz ao mundo. No entanto
continua a olhar para o umbigo.
Nas
comunidades de origem portuguesa, as novas gerações pouco ou nada falam
português. Nos PALOP (Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa) assiste-se
ao legítimo proliferar dos dialectos locais e ao galopante êxito do inglês. O
Português tenderá (se nada for feito, se tudo continuar na mesma) a ser apenas
uma língua residual.
Ao
contrário do que fazem franceses e ingleses, os portugueses têm por hábito
deixar para amanhã o que deveriam ter feito anteontem.
Não
existe, na língua como noutros sectores, uma conjugação estratégica de
objectivos. Cada um rema para o seu lado e, é claro, assim o barco comum (a
Lusofonia) não chega a nenhum porto. Há projectos sobrepostos, e muitas áreas
onde ninguém chega. Ninguém não é verdade. Chegam os ingleses, os franceses, os
norte-americanos e até os chineses.
A
CPLP (Comunidade de Países de Língua Portuguesa) deveria ser o organismo que,
por excelência, poderia divulgar a língua. Está, contudo, adormecida. Quando
acordar verá que a Lusofonia já morreu…
É
claro que o futuro de Portugal passa necessariamente por África. Acontece que,
nesta altura, a União Europeia mas sobretudo a Alemanha continua a ditar as regras
no seu protectorado lusitano. E, ao contrário de outros tempos, Lisboa não está
interessada em dar luz ao mundo. Ao contrário de muitos outros países que estão
na UE mas também em África. Mas não só.
Ou
seja, a China, por exemplo, está a preparar muitos dos seus melhores quadros
para que dominem a língua portuguesa. Fazem-no para conquistar os mercados
lusófonos. Nada mais do que isso.
De
uma forma geral, todos (mais uns do que outros, importa dizê-lo) continuam à
espera que o burro aprenda a viver sem comer. Mas, quando olharem para o lado,
vão ver que quando o burro estava quase a saber viver sem comer… morreu.
Acresce
que Portugal ainda não percebeu que foi o “pai” mas que os “filhos” já são
independentes. Os países africanos ainda não compreenderam que o “pai” errou em
muitas coisas mas que não é por isso que deixou de ser “pai”.
A
Lusofonia, essa realidade que em muito ultrapassa os 250 milhões de cidadãos em
todos os cantos do planeta, parece condenada a ser ultrapassada, ou até mesmo
aniquilada. Parafraseando Luís de Camões, em português se canta o peito ilustre
lusitano e, na prática, importa recordar que a ele obedeceram Neptuno e Marte.
Além disso, importa dizê-lo, manda cessar (se para tal todos os lusófonos
tiverem engenho e arte) “tudo o que a Musa antiga canta”.
Quando
será que, de forma consciente e consistente, Portugal entenderá que “outro
valor mais alto se alevanta”? Por culpa (mesmo que inconsciente) dos poucos que
não vivem para servir e que, por isso, não servem para viver, continuam os
milhões que se entendem em português a comer e a calar, amordaçados pela
mesquinhez dos que se julgam donos da verdade.
É
claro que, como em tudo na vida, não faltarão os que dirão que não é possível
entregar a carta a Garcia. Dirão isso e, ao mesmo tempo, apontarão a valeta
mais próxima.
A
História do Mundo desmente-os. A História de Portugal desmente-os. Além disso,
não custa tentar o impossível, desde logo porque o possível fazemos nós todos
os dias. Mas não será com esses que se fará a História da Lusofonia apesar de,
reconheço, muitos deles teimarem em flutuar ao sabor de interesses mesquinhos e
de causas que só se conjugam na primeira pessoa do singular.
Para
mim, para nós, a Lusofonia deveria ser um desígnio nacional. Defender esta tese
é, provavelmente, pregar para os peixes. Mas vale a pena continuar a lutar.
Lutar sempre, apesar da indiferença de (quase) todos os que podiam, e deviam,
ajudar a Lusofonia. Será desta? Não creio. Até agora continuam a ser mais os
exemplos dos que em vez de privilegiarem a competência preferem a subserviência.
Folha
8 (ao)
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