domingo, 25 de outubro de 2015

BISSAU: O PROCESSO DE ZAMORA INDUTA



Jorge Heitor* - O Máximo

O contra-almirante guineense José Zamora Induta é actualmente acusado de vários crimes, entre os quais o de terrorismo, por alegadamente ter procurado contrariar o golpe de Abril de 2012, dado pelo general António Indjai, que anteriormente o afastara de Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas. 

“Parece que se estava à procura de fazer uma coleção de todos os crimes que se encontram na lei penal. Infelizmente foi isso que aconteceu", disse José Paulo Semedo, advogado de defesa de Zamora Induta, que nestes último meses regressara a Bissau, ido de Portugal, onde se encontrava exilado. No dia 21 de Outubro de 2012, a cidade de Bissau foi palco de mais um acontecimento, de contornos mal definidos, apresentado como uma tentativa de golpe contra os golpistas que em Abril se haviam apossado do poder e colocado com Presidente de Transição Manuel Serifo Nhamadjo. António Indjai, o Presidente e o Governo de Transição por ele patrocinados acusaram um grupo de militares, alegadamente a soldo do contra-almirante José Zamora Induta, de haverem preparado uma intentona, possivelmente com o intuito de colocarem as coisas no ponto em que estavam antes de Abril, com o primeiro-ministro de então, Carlos Gomes Júnior, em vias de vir a ser eleito Presidente da República. O grupo de operacionais acusado pelo duo golpista Indjai-Nhamadjo era comandado pelo capitão Pansau Intchama, que estivera a frequentar um curso em Mafra e que atacou o quartel dos pára-comandos, em Bissalanca, nas imediações do aeroporto de Bissau, com o alegado intuito de recolocar as coisas no pé em que estavam uns sete meses antes. Segundo o entender de António Indjai, de Manuel Serifo Nhamadjo e do Governo golpista por eles instalado, Pansau Intchama teria sido enviado de Lisboa pelo contra-almirante Zamora Induta, com o apoio de Carlos Gomes Júnior, de Portugal e de outros países da CPLP. Em sintonia com Indjai e com o renegado Nhamadjo, também o Partido da Renovação Social (PRS) denunciou então o que seriam as manobras de Zamora Induta e dos seus amigos lusófonos para anular o golpe de estado de Abril, que tão nocivo tinha sido para a Guiné-Bissau. Uma equipa de seis advogados está a preparar a contra argumentação de Zamora Induta às acusações de que é alvo e que o tornam susceptível de mais de 20 anos de cadeia, num país onde reina a impunidade e onde ninguém tem sido condenado por tantos crimes cometidos desde os tempos da luta armada e dos primeiros anos da independência. José Zamora Induta é atualmente o único acusado no caso da alegada tentativa de golpe de estado de 21 de outubro de 2012, dado que outras pessoas, entre as quais o líder do ataque ao quartel dos "bóinas vermelhas" em Bissau, o referido capitão Pansau N'Tchama, seu antigo guarda-costas, beneficiaram o ano passado de um indulto presidencial. Ainda nunca ninguém julgou os assassinos de uma série de personalidades guineenses, mas parece que se quer julgar alguém cujo principal crime poderia ter sido acabar com o Governo colocado em funções pelos golpistas que impediram a segunda volta das eleições presidenciais de 2012, que quase de certeza iriam ser ganhas por Carlos Gomes Júnior. António Indjai e Manuel Serifo Nhamadjo estão a viver tranquilamente a sua vida, depois de todo o mal que causaram ao país, e Zamora Induta serve de arma entre o tão controverso Presidente actual, José Mário Vaz, e o líder do PAIGC, Domingos Simões Pereira, que foi afastado de primeiro-ministro, num conluio com o PRS. Vaz, visto por alguns como uma espécie de ditador na linha de João Bernardo Vieira, "Nino", deu a entender que Zamora Induta teria voltado a Bissau para ajudar Domingos Simões Pereira a reforçar-se como primeiro-ministro e a fazer-lhe sombra. Agora, o país da grande impunidade, onde ainda nem sequer se sabe com todos os pormenores as circunstâncias em que morreram Amílcar Cabral e Francisco Mendes, "Chico Té", tem nas mãos aquele que poderá ser um bode expiatório de muita coisa, um contra-almirante que não é bem visto pelo general António Indjai, que chegou a ser seu adjunto. No dia 1 de Abril de 2010, o então Chefe do Estado-Maior Adjunto, Indjai, deteve Zamora Induta e, também, o primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior, que inclusive ameaçou de mandar fuzilar, só não o tendo feito por a reacção popular haver sido muito forte. Carlos Gomes Júnior voltou então a exercer funções, para definitivamente vir a ser derrubado dois anos depois, por esse mesmo António Indjai que deveria estar agora a responder perante os tribunais, pelo muito mal que já fez à Guiné-Bissau. No entanto, em vez de Indjai quem vai aparecer no banco dos réus é José Zamora Induta, possivelmente acusado, entre muitas outras coisas, de ter feito conluio com Carlos Gomes Júnior para matar um seu antecessor como Chefe do Estado-Maior General, Tagme Na Waie, e inclusive Nino Vieira. Alegação esta que chegou a ser feita, a dada altura, pelo antigo primeiro-ministro Francisco José Fadul. O mesmo Fadul acusou Zamora Induta de haver eliminado o general Ansumane Mané, que fora líder da Junta Militar que em 1999 derrotou Nino Vieira, obrigando-o a exilar-se em Portugal. Enfim, uma Guiné-Bissau onde tudo é possível, incluindo os crimes mais torpes e as mais violentas acusações.

*Jornalista

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