Jorge
Heitor* - O Máximo
O
contra-almirante guineense José Zamora Induta é actualmente acusado de
vários crimes, entre os quais o de terrorismo, por alegadamente ter procurado
contrariar o golpe de Abril de 2012, dado pelo general António Indjai, que
anteriormente o afastara de Chefe do Estado-Maior das Forças Armadas.
“Parece
que se estava à procura de fazer uma coleção de todos os crimes que se
encontram na lei penal. Infelizmente foi isso que aconteceu", disse José
Paulo Semedo, advogado de defesa de Zamora Induta, que nestes último meses
regressara a Bissau, ido de Portugal, onde se encontrava exilado. No dia 21 de
Outubro de 2012, a cidade de Bissau foi palco de mais um acontecimento, de
contornos mal definidos, apresentado como uma tentativa de golpe contra os
golpistas que em Abril se haviam apossado do poder e colocado com Presidente de
Transição Manuel Serifo Nhamadjo. António Indjai, o Presidente e o Governo de
Transição por ele patrocinados acusaram um grupo de militares, alegadamente a
soldo do contra-almirante José Zamora Induta, de haverem preparado uma
intentona, possivelmente com o intuito de colocarem as coisas no ponto em que
estavam antes de Abril, com o primeiro-ministro de então, Carlos Gomes Júnior,
em vias de vir a ser eleito Presidente da República. O grupo de operacionais acusado
pelo duo golpista Indjai-Nhamadjo era comandado pelo capitão Pansau Intchama,
que estivera a frequentar um curso em Mafra e que atacou o quartel dos
pára-comandos, em Bissalanca, nas imediações do aeroporto de Bissau, com o
alegado intuito de recolocar as coisas no pé em que estavam uns sete meses
antes. Segundo o entender de António Indjai, de Manuel Serifo Nhamadjo e do
Governo golpista por eles instalado, Pansau Intchama teria sido enviado de
Lisboa pelo contra-almirante Zamora Induta, com o apoio de Carlos Gomes Júnior,
de Portugal e de outros países da CPLP. Em sintonia com Indjai e com o renegado
Nhamadjo, também o Partido da Renovação Social (PRS) denunciou então o que
seriam as manobras de Zamora Induta e dos seus amigos lusófonos para anular o golpe
de estado de Abril, que tão nocivo tinha sido para a Guiné-Bissau. Uma equipa
de seis advogados está a preparar a contra argumentação de Zamora Induta às
acusações de que é alvo e que o tornam susceptível de mais de 20 anos de
cadeia, num país onde reina a impunidade e onde ninguém tem sido condenado por
tantos crimes cometidos desde os tempos da luta armada e dos primeiros anos da
independência. José Zamora Induta é atualmente o único acusado no caso da
alegada tentativa de golpe de estado de 21 de outubro de 2012, dado que outras
pessoas, entre as quais o líder do ataque ao quartel dos "bóinas
vermelhas" em Bissau, o referido capitão Pansau N'Tchama, seu antigo
guarda-costas, beneficiaram o ano passado de um indulto presidencial. Ainda nunca
ninguém julgou os assassinos de uma série de personalidades guineenses, mas
parece que se quer julgar alguém cujo principal crime poderia ter sido acabar
com o Governo colocado em funções pelos golpistas que impediram a segunda volta
das eleições presidenciais de 2012, que quase de certeza iriam ser ganhas por
Carlos Gomes Júnior. António Indjai e Manuel Serifo Nhamadjo estão a viver
tranquilamente a sua vida, depois de todo o mal que causaram ao país, e Zamora
Induta serve de arma entre o tão controverso Presidente actual, José Mário Vaz,
e o líder do PAIGC, Domingos Simões Pereira, que foi afastado de
primeiro-ministro, num conluio com o PRS. Vaz, visto por alguns como uma
espécie de ditador na linha de João Bernardo Vieira, "Nino", deu a
entender que Zamora Induta teria voltado a Bissau para ajudar Domingos Simões
Pereira a reforçar-se como primeiro-ministro e a fazer-lhe sombra. Agora, o
país da grande impunidade, onde ainda nem sequer se sabe com todos os
pormenores as circunstâncias em que morreram Amílcar Cabral e Francisco Mendes,
"Chico Té", tem nas mãos aquele que poderá ser um bode expiatório de
muita coisa, um contra-almirante que não é bem visto pelo general António
Indjai, que chegou a ser seu adjunto. No dia 1 de Abril de 2010, o então Chefe do
Estado-Maior Adjunto, Indjai, deteve Zamora Induta e, também, o
primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior, que inclusive ameaçou de mandar fuzilar,
só não o tendo feito por a reacção popular haver sido muito forte. Carlos Gomes
Júnior voltou então a exercer funções, para definitivamente vir a ser derrubado
dois anos depois, por esse mesmo António Indjai que deveria estar agora a
responder perante os tribunais, pelo muito mal que já fez à Guiné-Bissau. No
entanto, em vez de Indjai quem vai aparecer no banco dos réus é José Zamora Induta,
possivelmente acusado, entre muitas outras coisas, de ter feito conluio com
Carlos Gomes Júnior para matar um seu antecessor como Chefe do Estado-Maior
General, Tagme Na Waie, e inclusive Nino Vieira. Alegação esta que chegou a ser
feita, a dada altura, pelo antigo primeiro-ministro Francisco José Fadul. O
mesmo Fadul acusou Zamora Induta de haver eliminado o general Ansumane Mané,
que fora líder da Junta Militar que em 1999 derrotou Nino Vieira, obrigando-o a
exilar-se em Portugal. Enfim, uma Guiné-Bissau onde tudo é possível, incluindo
os crimes mais torpes e as mais violentas acusações.
*Jornalista
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