quinta-feira, 15 de outubro de 2015

MEDIADORES DE “MÃOS ATADAS” PARA RESOLVER CRISE EM MOÇAMBIQUE



O cerco à casa do líder da RENAMO, Afonso Dhlakama, que teve lugar na cidade da Beira na semana passada, poderia ter resultado num conflito armado de maiores dimensões, considera o analista Silvestre Baessa.

Caso os mediadores da crise moçambicana não tivessem estado na cidade da Beira no dia do cerco à casa do líder da RENAMO, na passada sexta-feira (10.10), a crise militar teria assumido dimensões mais graves, diz Silvestre Baessa.

Em entrevista à DW África, o especialista em boa governação lembra que o papel destas figuras não está muito claro, mas a garantia de segurança dada por eles a Afonso Dhlakama foi posta em causa com o cerco das forças policiais.

DW África: Que avaliação faz do papel dos mediadores no cerco à casa de Afonso Dhlakama na cidade de Beira?

Silvestre Baessa (SB): Eu acho que foi relevante na medida em que nos termos como ocorreu o cerco foi oportuno estar na Beira naquele momento. Acredito que a ausência de uma terceira parte que merecesse a confiança de Dhlakama naquele espaço poderia tornar a situação muito mais complicada.

É bem verdade que a posição da RENAMO, de Dhlakama sobretudo, naquele momento era muito enfraquecida. Acho que ele foi apanhado de surpresa, até porque se sentiu traído pelo facto de os mediadores terem dado garantias de que ele podia sair das matas e que havia condições de segurança, para logo a seguir sofrer o cerco e colocar-se numa posição delicada.

Foi oportuno estar na Beira naquele momento porque isso também permitiu evitar situações mais complicadas como, por exemplo, a resistência da RENAMO e o que aconteceria depois numa situação de confrontação direta entre as partes e aí poderíamos ter uma situação muito pior daquela que aconteceu.

DW África: Está prevista a extensão do papel dos mediadores neste campo de maior tensão?

SB: Claramente que não. O papel do mediador não foi muito claro no âmbito de diálogo político que está a decorrer entre a RENAMO e o Governo. Nunca ficou muito claro se era diálogo ou negociações. E depois o papel dos mediadores também ficou meio diluído, pareciam mais observadores nacionais nas conversações que em nenhum momento procuravam aproximar e facilitar as partes nas questões mais complicadas. Ao longo de todo este período foi um papel sem grande relevância.

A segunda vez que os mediadores apareceram a desempenhar um papel significativo foi na altura quando o presidente Dhlakama saiu de Satunjira, que teve a cobertura da comunidade internacional, e agora neste momento. Mas eu creio que nos termos como as coisas ocorreram ficou mais evidente que os mediadores têm muito pouco a fazer para buscar uma solução física. Parece-me que há uma terceira parte neste jogo, neste xadrez. Eu digo terceira porque há uma parte que se chama Governo em que podemos personificar essa parte no Presidente Nyusi. Há uma segunda parte que é a RENAMO e há uma terceira parte que é aquela em que se sente o desgaste deste diálogo que não resulta em nada e que começa a colocar em prática uma segunda saída para esta crise que se arrasta há muito tempo e que é forçar militarmente a RENAMO a desarmar-se.

DW África: Se os mediadores não estivessem lá, como teria sido?

Ficou muito claro que a intenção do dispositivo militar na casa de Dhlakama visava desarmar as forças da RENAMO, a sua segurança. A ausência desse grupo poderia resultar num confronto militar.

DW África: Será o modelo de recolha compulsiva o ideal nesta situação?

O realismo que tem estado a decorrer nesta matéria é um realismo que diz que o conflito não pode ser eterno. Ou seja, está-se há mais de 20 anos a tentar uma solução com intervalos mais longos entre as negociações e as situações de crise efetiva. A oportunidade permite fazer com que seja mais arriscado quanto foi esta situação da Beira. Quando temos situações destas, o radicalismo ou o extremismo nas opções vem ao de cima. É um posicionamento mais rijo o que acaba por imperar.

Nádia Issufo – Deutsche Welle

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