Tharanga
Yakupitiyage, da IPS – Envolverde
Nações
Unidas, 23/11/2015 – A guerra civil na Síria, caminhando para seu quinto ano, é
um fator fundamental na atual crise de refugiados, a maior desde a Segunda
Guerra Mundial. Mas o conflito armado fez outra vítima, o ambiente. Um informe
da organização independente holandesa Pax analisou as consequências da guerra
civil síria, que começou em março de 2011, no curto e médio prazos, para o
ambiente e a saúde pública.
“Os
incidentes de contaminação em conflitos anteriores, o padrão dos combates e a
insegurança na Síria indicam que as ameaças ambientais podem ser
generalizadas”, afirmou o autor do informe, Wim Zwijnenburg. Com a informação
fornecida por imagens obtidas via satélite, redes sociais e informes da
Organização das Nações Unidas (ONU), a Pax identificou a grande destruição
ambiental provocada em áreas densamente povoadas, fábricas e outras obras de
infraestrutura essenciais, com o consequente risco para a saúde pública.
Por
exemplo, em dezembro de 2014 foi constatado que 1,3 milhão de casas, ou um
terço de todas as moradias do país, estavam destruídas. Os danos deslocaram
milhões de civis e os escombros liberaram substâncias nocivas, como metais,
bifenilpoliclorados (mais conhecidos como PCB) e amianto.
Essas
toxinas, que também são liberadas pelo uso das armas, podem deteriorar a saúde
pública, advertiu Zwijnenburg à IPS, lembrando as consequências sanitárias da
exposição aos escombros das torres gêmeas do World Trade Center, em Nova York,
após os atentados de setembro de 2001. Segundo os Centros para Controle e
Prevenção de Enfermidades dos Estados Unidos, mais de 1.100 pessoas, que
trabalhavam ou viviam perto das torres gêmeas durante o incidente, foram
diagnosticadas com câncer.
O
informe da Pax, intitulado Em Meio aos Escombros, destaca também os danos
à infraestrutura, como as refinarias de petróleo e as fábricas, que geram
poluição atmosférica e contaminam a terra e a água, produzindo mais
consequências negativas para a saúde no longo prazo. Até setembro deste ano, os
bombardeios aéreos da coalizão liderada pelos Estados Unidos haviam danificado
196 instalações petrolíferas na Síria.
Os
combates provocaram o colapso absoluto dos serviços de gestão de resíduos,
acrescentou a organização. O acúmulo de lixo pode provocar grave contaminação
do ar, do solo e da água, além de enfermidades respiratórias e câncer. Esses
não são problemas apenas para os civis que ainda vivem na Síria, mas também
para aqueles que fugiram do país e desejam regressar.
Entretanto,
o impacto de longo prazo que as atividades militares têm sobre o ambiente e a
população em geral continua em grande parte ignorado e sem atenção, afirma o
documento. “Em circunstâncias de paz, existe um forte regime ambiental que
regula nossa sociedade e impede nossa exposição a materiais perigosos. Mas, em
tempos de guerra, esses sistemas entram em colapso ou essas normas são jogadas
no lixo, já que não têm utilidade militar”, explicou Zwijnenburg.
O
colapso das normas ambientais não se limita à guerra na Síria. Desde a queima
dos poços de petróleo no Iraque e Kuwait durante a Guerra do Golfo (1991) até
os danos causados nas zonas industriais e mineiras pelo atual conflito na
Ucrânia, os combates armados representam um alto preço para o ambiente e a
saúde pública.
Por
exemplo, depois de três décadas de guerra, o vizinho da Síria, Iraque, se
converteu em um dos países mais contaminados do mundo. No território iraquiano
persistem os altos níveis de radiação e de outras substâncias tóxicas derivadas
do urânio empobrecido utilizado durante a Guerra do Golfo e a invasão de 2003,
o que provocou o aumento dos defeitos congênitos e da incidência de câncer.
Dados
estatísticos do governo iraquiano indicam que, antes da primeira Guerra do
Golfo, o câncer afetava 40 em cada cem mil pessoas. Em 2005, essa relação
multiplicou para 1.600 para cada cem mil pessoas, e estima-se que continuará
aumentando. O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) destacou
o perigo que os efeitos de longo prazo das guerras implicam para o ambiente e a
saúde.
Segundo
o Pnuma, “os efeitos do dano aos recursos ambientais e naturais em épocas de
guerra e conflito armado continuam muito depois do período do conflito em si”,
alertou o Pnuma em comunicado divulgado por ocasião do Dia Internacional da
Prevenção da Exploração do Ambiente na Guerra e os Conflitos Armados, celebrado
no dia 6 deste mês. “Os conflitos armados têm o potencial de reverter anos de
desenvolvimento e destruir meios de vida”, destacou.
Embora
o Pnuma realize avaliações ambientais posteriores aos conflitos para ajudar os
governos a lidarem com os problemas, o funcionário dessa agência para Assuntos
Ambientais da divisão Gestão Posterior aos Conflitos e Desastres, Hassan
Partow, afirmou que o financiamento é um obstáculo. Não existe um fundo
específico que cubra essas avaliações, explicou. Para poder realizá-las, “é
necessário, para cada conflito, arrecadar dinheiro dos doadores interessados”
no problema, acrescentou.
Após
mais de uma década de guerra na Libéria, o Pnuma não conseguiu mobilizar os
fundos necessários para ajudar a reconstruir a capacidade nacional para a
gestão de recursos e a governança ambiental. Foram financiados apenas 37,5% do
programa, o que forçou a agência da ONU a se retirar do país, acrescentou
Partow. Do mesmo modo, o programa do Pnuma no Líbano para lidar com o excesso
de resíduos, depois do breve mas devastador conflito de 2006 com Israel, só
conseguiu 40% dos fundos necessários.
O
informe da Pax solicita que todas as partes, na Síria e em outros países, levem
em conta as ameaças e reforcem a proteção do ambiente em situações de conflito
armado. Também insiste na necessidade de aumentar a recopilação e o intercâmbio
da informação ambiental para localizar os pontos mais contaminados e mitigar os
riscos para a saúde.
“Um
dia as hostilidades na Síria terminarão. Mas, do ponto de vista da sociedade, a
recuperação também necessitará da ação decidida para enfrentar de maneira
responsável e suficiente os riscos ambientais que o conflito gerou”, enfatizou
Zwijnenburg. Envolverde/IPS
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