segunda-feira, 9 de novembro de 2015

"Explosão demográfica" africana trará nova vaga de refugiados à Europa - especialista



O antigo representante do secretário-geral da ONU em África Victor Ângelo alertou hoje que o grande fluxo de refugiados para a Europa se vai manter nos próximos anos e que outro se seguirá, devido à "explosão demográfica" africana.

Para Victor Ângelo, a solução para este problema "não é fácil" porque passa por "travar o fluxo" na sua origem, ou seja, países como a Síria, "onde há uma crise profunda há cinco anos", onde estão instalados 1.300 grupos armados e onde um processo político vai levar um ano ou dois a desenvolver-se e completar-se.

"Não vai ser possível travá-lo já [o fluxo de refugiados para a Europa], vai demorar algum tempo. Certamente, o ano de 2016 vai ser semelhante ao ano 2015 em termos de grandes movimentos de massas. Provavelmente, em 2017, vamos ver um afrouxamento desses movimentos. Mas na realidade, mesmo que se consiga resolver o problema do Médio oriente, depois começa a surgir o problema de África", afirmou.

Victor Ângelo falava aos jornalistas à margem de uma conferência em Macau, em que foi orador, dedicada ao tema dos refugiados e aos desafios que coloca à Europa.

O antigo representante do secretário-geral da ONU em países como o Chade, Zimbabué, Serra Leoa ou República Centro-Africana sublinhou que "do lado africano há uma explosão demográfica que está em curso" e, "mais tarde ou mais cedo", os jovens daquele continente procurarão uma solução de vida na Europa.

A este propósito, lamentou, durante a conferência, que a Europa tenha, por exemplo, deixado de apoiar e financiar na década de 1980 programas agrícolas em África, essenciais para fixar populações.

Para Victor Ângelo, a resposta europeia à crise dos refugiados passa ainda, entre outros aspetos, por uma "resposta comum", sublinhando que a questão pode ter implicações ao nível da coesão da União Europeia e abrir espaço à desintegração.

Outra consequência que pode surgir é este problema ser explorado por partidos europeus radicais "profundamente racistas" e "profundamente antieuropeus", uma "combinação explosiva" que, aliás, é já uma "tendência cada vez mais visível", considerou.

Para Victor Ângelo, a resposta imediata que a UE tem tentado dar ao fluxo de refugiados "não tem estado de modo algum à altura, antes pelo contrário", apontando que apenas uma ou duas centenas de pessoas, das centenas de milhares que chegaram em 2015 à Europa, viram os seus casos encaminhados.

"Temos de lado um 'iceberg' e do outro lado um cubo de gelo", ilustrou.

Victor Ângelo sublinhou ainda, na conferência, a importância dos apoios às agências da Nações Unidas que lidam com os refugiados, dizendo que a crise migratória deste ano também coincidiu com uma "quebra muito importante" nas verbas do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) e outras estruturas da ONU, que levaram à saída de milhares de pessoas dos campos de refugiados onde se encontravam.

Esta conferência foi organizada pelo Programa Académico da União Europeia para Macau, em parceria com a Fundação Rui Cunha e a Associação de Imprensa em Língua Portuguesa e Inglesa de Macau.

Victor Ângelo integra atualmente a organização não-governamental suíça PeaceNexus e é consultor da NATO.

MP // EL - Lusa

Sem comentários:

Mais lidas da semana