segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

PROBLEMAS DA NIGÉRIA



Roger Godwin – Jornal de Angola, opinião

A Nigéria encontra-se afundada num imenso mar de problemas de diversa ordem, económica, social, política e militar e que, logicamente, está a preocupar os países vizinhos.

Atingida fortemente pela crise provocada  pelo abaixamento contínuo do preço do petróleo, a Nigéria reduziu em cerca de 200 mil barris por dia a sua produção de crude, quando comparada com os valores apresentados em Novembro de 2014. 

Com esta descida, a Nigéria deixou-se ultrapassar por Angola como primeiro produtor de petróleo do continente africano, uma situação que já levou o ministro do Estado e dos Recursos Petrolíferos, Emmanuel Ibe Kachikwu, a dizer que o seu país tem que alterar os seus processos de trabalho de modo a recuperar rapidamente a posição agora perdida. 

Mas este é apenas um dos muitos problemas com que se está a deparar o novo Governo nigeriano, empossado há cerca de um mês pelo presidente Muhammadu Buhari, que se vê agora a braços com uma série de situações que ameaçam, fortemente, a sua estabilidade interna, seja do ponto de vista social ou político. 

O grupo Boko Haram, que chegou a parecer estar quase neutralizado, voltou a reaparecer em cena desencadeando uma série de acções que semearam a morte e o terror na região nordeste do país, quase logo a seguir ao ataque que as forças governamentais efectuaram contra o Movimento Islâmico, uma organização  xiita. 

A situação é de tal forma grave que alguns países vizinhos decidiram, discretamente, aceitar ajuda militar externa para evitarem males maiores e assim defender as suas populações. 

Os Camarões, por exemplo, foram os menos discretos e abriram já as suas fronteiras para a entrada de militares estrangeiros, norte-americanos e britânicos, que passarão a ocupar algumas posições de protecção a zonas consideradas “mais sensíveis”. 

Depois de durante quase um ano norte-americanos e britânicos terem trabalhado com os Camarões e a Nigéria no fornecimento de informações e na formação de técnicos capazes de preparar a luta contra o terrorismo, a partir de agora a sua presença passará a ser mais “acutilante” e, por isso, mais visível. 

Esta decisão do Governo dos Camarões deve-se ao agravamento da situação no interior da Nigéria e ao receio de que este país não seja capaz de evitar a expansão da actividade terrorista para lá das suas fronteiras. 

Recentemente, um tribunal nigeriano anunciou a anulação da pena de morte de 66 soldados que se terão recusado a combater os terroristas alegando, para isso, “convicções religiosas”. 

De acordo com o mesmo tribunal, essas penas foram transformadas em sentenças de dez anos de prisão, tendo essa revisão judicial sido feita a pedido do general Tukur Buratai, o homem que o presidente Buhari encarregou de coordenar todo o combate contra o Boko Haram. 

Neste momento, a Justiça  nigeriana está a analisar mais 600 processos que envolvem militares que teriam desertado dos seus postos quando se aperceberam da aproximação dos terroristas.  Um dos grandes problemas com que se depara a chefia militar nigeriana no combate ao Boko Haram é que a maioria dos efectivos professa a religião muçulmana, a mesma dos terroristas. E tem sido com base na religião que o grupo tem conseguido mobilizar efectivos e convencê-los a lutar por um poder que dificilmente podem atingir. 

Mas os actuais problemas da Nigéria não se ficam apenas a dever à crise do petróleo e ao fanatismo do Boko Haram, uma vez que outros existem que, se não forem anulados, podem, a muito breve prazo, atingir proporções bastante graves. 

Um desses problemas é o reacender da questão do Biafra, por via da acção do movimento separatista que dá pelo nome de “Povo do Biafra” e que chegou já a ter uma rádio ao seu serviço. Há menos de uma semana o antigo director dessa rádio e assumido líder do movimento, Nnamdi Kanu, foi libertado por um tribunal de Abuja, tendo a notícia sido recebida com grande entusiasmo por alguns dos seus seguidores. 

No apogeu desse entusiasmo, alguns dos seus apoiantes chegaram a organizar algumas manifestações de apoio, tendo numa delas, realizada em Onitsha, havido violentos confrontos com a polícia, dos quais resultaram a morte de três pessoas. 

Numa altura em que a Nigéria está determinada  a  lutar contra as suas fraquezas, tendo o Presidente Buhari aberto várias frentes de combate no sentido de moralizar a função pública através de um feroz combate à corrupção, a questão da instabilidade ganha uma dimensão alarmante e que pode deitar tudo a perder. 

Alguns apoiantes do Presidente atribuem o reacender da questão do Biafra e alguns apelos discretos à desmobilização na luta contra o terrorismo a uma manobra orquestrada por forças que não estão interessadas em que a situação mude. 

Embora não o tenha dito de forma directa, o próprio Presidente, num recente discurso fez alguma ligação entre estes problemas e a “herança” que recebeu do antecessor, Goodluck Jonathan, a quem não se cansa de atribuir responsabilidades pelo que não foi feito, durante demasiados anos, no combate à corrupção e ao Boko Haram. 

Na verdade a dimensão de um país como a Nigéria e a sua importância para o progresso de todo o continente africano obrigam a que a sua situação interna seja seguida com a devida atenção, de modo a que aquilo que por lá se vier a passar não contagie os países vizinhos. 

À cautela, os Camarões já decidiram actuar, abrindo as suas portas à ajuda militar externa, uma decisão relativamente perigosa, porque pode comportar compromissos que, mais tarde, se podem mesmo voltar contra os seus interesses políticos. 

Mas os outros vizinhos da Nigéria que seguem atentamente o que se passa no país, estão certamente preocupados por saberem que sentirão os efeitos do que lá acontecer, sejam eles positivos ou negativos.

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