As
negociações em curso entre o regime fundamentalista islâmico e pró-terrorista
da Turquia e a União Europeia podem resumir-se numa palavra: tráfico.
Tráfico
de conveniências inconfessáveis, tráfico de influências, tráfico de seres
humanos desprotegidos, tráfico de mentiras. Nada que tenha a ver com democracia
e muito menos com direitos humanos.
É
impossível que os dirigentes da União Europeia e dos 28 Estados membros
desconheçam o regime autoritário e corrupto de Erdogan, família, amigos e
comparsas, o seu apoio aos mais sanguinários dos grupos terroristas – Estado
Islâmico e Al-Qaida -, a sua perseguição à minoria curda, o modo como falsifica
eleições, o processo de instauração gradual de uma ditadura político-religiosa.
Impossível, entre outras razões, porque a Turquia é membro da NATO e, hoje em
dia e cada vez mais, o que diz respeito à NATO di-lo também em relação à União
Europeia.
Relembro
agora alguns argumentos que fazem parte da história da União Europeia e que até
agora têm travado, ano-após-ano, as negociações para admissão da Turquia na
comunidade dos 28. O principal obstáculo invocado tem sido o das contradições
entre o regime turco e as normas democráticas exigidas pela União Europeia,
pesem embora os “passos” que em Bruxelas se admite terem sido dados por Ancara
em direcção à democracia, isto antes da entrada e enraizamento no poder dos
fundamentalistas islâmicos “moderados” de Erdogan & Cia. Outro
inconveniente muito conhecido, esgrimido principalmente por xenófobos
“democratas-cristãos” do Partido Popular Europeu, é o de que a Turquia não se
enquadra no perfil cultural, religioso e civilizacional da União Europeia. Além
disso, argumenta-se, a Turquia não é apenas um país europeu, cultiva estruturas
económicas que não se compadecem com o liberalismo imposto no interior da
União, na Turquia permanecem estruturas desrespeitadoras da “economia de
mercado”, sem contar com a perseguição à minoria curda, grosseira violação dos
direitos humanos.
Isto
era o que se argumentava até agora. Assim se escondendo, convenientemente para
quem usa a União Europeia a seu belo prazer, como é o caso da Alemanha, as
verdadeiras e incómodas razões, que têm a ver com a dimensão geográfica,
demográfica e económica da Turquia e o impacto da livre circulação dos cidadãos
turcos no espaço comunitário.
A
situação alterou-se de uma penada. O que ontem era argumento contra tornou-se
vantagem de hoje, tudo se mantendo enovelado em mentiras enquanto se desenvolve
uma descarada traficância.
A
Alemanha e o séquito de dirigentes que segue a senhora Merkel como se fora o
flautista de Hamelin redescobriram a Turquia como um prometedor membro da
União, a prazo muito mais curto do que antes se dizia embora Ancara esteja
agora muito mais próximo da ditadura político-religiosa do que há cinco, dez
anos. Para isso, de acordo com os raciocínios interesseiros de Bruxelas,
Berlim, Paris e Londres, deve a Turquia travar o fluxo de refugiados para o
espaço comunitário no quadro do combate “à praga”, como diz o senhor Cameron, e
das medidas correspondentes ao estado de lotação esgotada de imigrantes, como
invoca o também xenófobo Manuel Valls, primeiro ministro de Hollande em França.
Em
troca desses úteis e bons serviços dispõe-se a União Europeia a bonificar a
Turquia em mais de três mil milhões de euros – provavelmente a extorquir aos
contribuintes dos 28 – e a acelerar com o regime de Ancara o processo de
negociações para a admissão plena.
Toma-lá-dá-cá.
Onde antes se invocavam a democracia e os direitos humanos deixaram de ser
inconvenientes algumas realidades turcas, como a violação flagrante de normas
democráticas, a repressão sem dó de minorias, o uso e abuso do confessionalismo
como regime político, o apoio comprovado da Turquia aos mais cruéis dos grupos
terroristas, que, por sinal, a União Europeia diz combater. Na União Europeia
nenhum dirigente ignora que o regime turco infiltra mercenários ditos
“islâmicos” na Síria, arma, financia e treina bandos do Estado Islâmico e da
Al-Qaida, mantém em actividade serviços de recrutamento de terroristas em todo
o mundo.
No
fundo, nada disto destoa. A União Europeia que trafica nestes termos com a
Turquia é a mesma que dispara troikas contra os povos dos países membros menos
favorecidos, a mesma que invoca poder de veto sobre os orçamentos dos Estados
nacionais.
Na
União Europeia, a exemplo do que acontece na Turquia, há muito que os
princípios deixaram de vigorar. O que conta são os fins, ao alcance de um
qualquer diktat e de oportunos tráficos de conveniências.
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