segunda-feira, 22 de agosto de 2016

REPUBLICANISMO E CORRUPÇÃO



Trabalhar para o bem comum, perseguir o interesse público, servir a população honestamente e defender princípios republicanos significa possuir virtude cívica. Entretanto, a simples exortação ou a mera esperança na educação das pessoas se tornarem virtuosas é insuficiente.

Antonio Sepúlveda, Flávio Franco e Igor De Lazari (*) – Folha 8, opinião

Éinato ao republicanismo a noção de anticorrupção, de autogoverno dos cidadãos, de não dominação, igualdade, interesse público e representação popular. O republicanismo se opõe inegavelmente a formas de governo de carácter monárquico, aristocrático ou oligárquico. Ao mesmo tempo que não admite categorias ou castas superiores, o republicanismo prega a igualdade, a liberdade de seus cidadãos, inclusive económica, pois a “dependência económica torna impossível que cidadãos sejam seus próprios mestres”.

Com o decorrer do tempo, a corrupção sempre encontra novos caminhos para se instalar no sistema e enfraquecer instituições, afectando as noções republicanas básicas. A corrupção se espraia quando os agentes públicos perdem sua devoção pelo bem público, deixando de ser responsáveis. Quando agentes públicos promovem seus interesses privados, de alguma elite ou oligarquia em detrimento do interesse ou bem público, instala-se a corrupção.

Para manter a República saudável, deve-se prevenir a corrupção do processo político. Deve-se se atentar para a interconexão entre Direito, Política e nossa estrutura social-económica, pois, sem boas instituições atentas aos reais fenómenos do País, pessoas e governos repetidamente se desviarão dos valores democráticos, na tentativa de se auto-entrincheirar politicamente ou de auferir benefícios especiais ou privilégios espúrios. Em suma, procurarão promover, por meios escusos, os seus interesses pessoais.

Sem um adequado conjunto de arranjos e mecanismos legais e constitucionais, a busca pelo interesse público será esmagada pela força dos interesses individuais e de facções; a corrupção individual e estrutural invadirá o sistema e o governo perderá seu carácter republicano. A chave, então, para o funcionamento da República, passa por boas instituições, práticas e leis.

As instituições operam sobre a corrupção por meio da implantação de mecanismos que propiciem maior transparência, deliberação, imparcialidade e responsabilidade dos agentes públicos. Pesquisas apontam ainda que a desburocratização administrativa, além de aumentar a eficiência do Estado, reduz os riscos de corrupção, inimiga central das repúblicas e característica tanto individual quanto de sistemas políticos.

Portanto, a fim de preservar a República, devem ser criadas instituições que preservem e promovam a virtude cívica e estimulem agentes públicos e cidadãos a trabalhar pelo bem comum. Por isso, a preservação dos ideais republicanos entre cidadãos e nas práticas políticas deve ser promovida por meio de estáveis, adaptáveis e eficazes instituições, de modo que se reduza ou elimine hierarquias de dominação e dependência.

(*) Antonio Sepúlveda (professor e doutorando em Direito/UERJ), Flávio Franco (professor e mestre em Direito/UFRJ) e Igor De Lazari (graduando/UFRJ) são pesquisadores do Laboratório de Estudos Teóricos e Analíticos sobre o Comportamento das Instituições – PPGD/UFRJ (CNPq/FAPERJ/Ministério da Justiça).

Leia mais em Folha 8

Cabo Verde. REVER A ATUAÇÃO POLICIAL



Expresso das Ilhas, editorial

A Segurança em Cabo Verde e, em particular na Capital, consti­tui um problema sério que deverá merecer do novo Governo medi­das urgentes. Quase todos os fins­-de-semana há registos de desaca­tos e mortos em assaltos, em guer­ras de gang ou em encontros com a polícia. Homicídios acontecem com uma frequência preocupante. Assaltos com utilização de armas de fogo passaram a ser o mais co­mum. Tem-se a impressão de que ataques dirigidos aos polícias com intenção de morte aumentam. O número de armas a circular desde as artesanais às mais sofisticadas é cada vez maior, indiciando cres­cente procura para compra das mesmas. A falta de cooperação das populações, se não mesmo hostilidade das pessoas em rela­ção à polícia torna o combate con­tra o crime ainda mais difícil. O acontecimento do fim-de-semana passado em São Pedro na cidade da Praia é paradigmático do que se nota em outros momentos em vários outros pontos do país. Dis­paros são feitos contra policiais, há uma resposta policial robusta, feridos são levados ao hospital, a população reage e desenvolve-se uma tensão entre a população e as forcas policiais que mina a con­fiança e diminui as possibilidades de cooperação para a manutenção de ordem e tranquilidade pública nas comunidades suburbanas.

O Governo já anunciou que vai avançar com a videovigilância no âmbito de um programa chama­do Cidade Segura e com a polícia municipal na luta contra as incivi­lidades. Poderão ser medidas sen­síveis que em articulação com ou­tras mais compreensivas tragam mais eficácia para a acção policial. As respostas, porém, quase nun­ca são simplesmente de natureza tecnológica, mas fundamental­mente de natureza organizacio­nal, de cultura institucional e de capacidade técnico-operacional para responder à complexidade dos problemas. Por outro lado, a experiência de outros países têm demonstrado que o restabeleci­mento da confiança na relação com as comunidades nos bairros periféricos das cidades deve ser um dos grandes objectivos a atin­gir para que, de facto, se consiga resultados duradoiros na preven­ção e na luta contra o crime.

As informações que são avan­çadas na página da Polícia Na­cional na internet revelam que a PN continua com as práticas an­teriores de, nos bairros, parar e revistar “stop and frisk” particu­larmente os jovens. São práticas que têm lugar no quadro das polí­ticas chamadas de tolerância zero e de “broken windows” e cujos resultados são hoje muito contes­tados. Não provam que realmen­te fizeram diminuir o crime, mas constata-se que aumentaram as denúncias de violência policial, os casos de descriminação (profiling) e também os sinais de degradação da relação com as comunidades. Os métodos militarizados das uni­dades tácticas da polícia envolvi­das nessas operações podem ser efectivas numa resposta pontual ao crime, mas não são os melho­res para desenvolver a relação de confiança que a polícia precisa de­senvolver com as comunidades. A proximidade das populações tem que ser feita de outra forma para que o objectivo fundamental de se ter ordem e tranquilidade pública seja atingido e reforçado nas pes­soas o sentimento de segurança.

Nos Estados Unidos, onde essa doutrina policial de tolerância zero surgiu e foi aplicada em vá­rias cidades a começar por Nova Iorque desde dos anos noventa, há anos que tem sido revista e em alguns casos completamente descartada. Os resultados mis­tos obtidos com a sua aplicação acabaram por revelar suas insu­ficiências e o seu lado negativo de discriminação social e racial e também da alienação das popula­ções que a polícia devia proteger. A última investigação feita pelo Departamento de Justiça à polí­cia da cidade de Baltimore divul­gada na semana passada trouxe a público com particular acuidade os problemas graves de violência policial, os efeitos nocivos da cres­cente militarização da polícia e as consequências do distanciamen­to das comunidades. Os recentes ataques a polícias em várias ci­dades, transformados em alvo a abater, constituíram um sinal de alerta de que se deve proceder a mudanças urgentes na actuação da polícia.

Também em Cabo Verde, em que o crime continua a aumen­tar, a sensação de insegurança é cada vez maior e até polícias são alvos de assaltos e de agressões a tiro, impõe-se que se reveja com urgência as práticas policiais. Cla­ramente que não estão a resultar, pelo contrário, tendem a provocar uma escalada de violência entre a polícia e os gangs ficando a po­pulação no meio sem segurança e sem confiança que a situação irá melhorar. As mudanças na polí­cia não podem ficar só pela troca de pessoas nas chefias. Há que mudar de atitude, de estratégia e da forma como se relaciona com o público e se utilizam os meios postos à disposição. Ponto assen­te é que não se pode deixar tudo na mesma e esperar que alguma coisa mude.

*Texto originalmente publicado na edição impressa do Expresso das Ilhas nº 768 de 17 de Agosto de 2016

Deputados pedem convocação urgente de plenária do parlamento da Guiné-Bissau



Um grupo de 57 deputados entregou hoje uma petição ao presidente da Assembleia Nacional Popular (ANP), o Parlamento da Guiné-Bissau, Cipriano Cassamá, na qual exigem a convocação urgente da sessão plenária do órgão.

Rui Diã de Sousa, porta-voz do grupo, disse que a petição foi subscrita por 41 deputados do Partido da Renovação Social (PRS), 13 parlamentares expulsos do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), dois do Partido da Convergência Democrática (PCD) e um do Partido da Nova Democracia (PND).

De acordo com Diã de Sousa, antigo ministro das Finanças e um dos 15 deputados expulsos do PAIGC, por divergências com a direção liderada por Domingos Simões Pereira, os subscritores da petição constituem a maioria absoluta de parlamentares em efetividade de funções.

A partir da petição hoje entregue, Rui Diã de Sousa acredita que Cipriano Cassamá "vai ter quer observar a lei e convocar uma sessão extraordinária" da ANP para a discussão e aprovação do programa do Governo do primeiro-ministro, Baciro Djá.

O Parlamento guineense deixou de funcionar há nove meses devido a divergências entre os dois principais partidos, PAIGC e PRS, e há mais de um mês que não se entendem quanto à forma de marcação de uma sessão para debater o programa do Governo.

O PAIGC, que venceu as últimas eleições legislativas, mas arredado do poder, acusa o PRS de lhe ter usurpado a governação, e por ter a maioria na comissão permanente do Parlamento (órgão de decisão dos assuntos que devem ir ao debate) decidiu bloquear o normal funcionamento do órgão.

Rui Diã de Sousa afirmou, à saída da entrega da petição ao líder do Parlamento, que o bloqueio do órgão tem levado a que "assuntos importantes" fiquem por discutir, nomeadamente a revisão da Constituição do país e outras leis.

O deputado também disse que o bloqueio tem impedido a que o Governo "assuma na plenitude as suas responsabilidades" perante o país e os guineenses.

Em nota de imprensa a que a Lusa teve acesso, o presidente do Parlamento fez saber que recebeu a petição que vai encaminhar para os órgãos competentes, as quais, disse, irão dar um tratamento regimental e constitucional ao pedido dos 57 deputados.

MB // EL - Lusa

Brasil. Golpe visa conter a democracia, destruir direitos dos trabalhadores e alienar a soberania




Além do impeachment, o golpe visa conter a democracia, destruir direitos dos trabalhadores e alienar a soberania do país

O golpe em curso não é só parlamentar, mas institucional. Ele envolve desde o empresariado, banqueiros, a grande mídia, setores do Judiciário e da PF.

Fórum 21, em Carta Maior

A derrubada da presidente eleita por mais de 54 milhões de votos é uma parte necessária de um golpe Muito Maior que está em andamento no Brasil hoje. É um golpe para destruir  os direitos sociais que o povo brasileiro conquistou depois que derrubou a ditadura. Para acabar com o regime político que se iniciou com a Constituição de 1988 e garantiu a eleição de líderes populares. Para impedir que futuros líderes comprometidos com o povo possam vir a ser eleitos não só para a presidência da república, mas também para os governos estaduais e para milhares de prefeituras pelo país afora.

A mudança do regime político que os golpistas pretendem implantar significa a revogação da eleição direta para cargos executivos. Ou seja, se o golpe se consumar, todo prefeito, governador e presidente da república terá uma espada sobre sua cabeça: se os donos do poder não gostarem de quem foi eleito, declaram que o vencedor cometeu alguma irregularidade ou não tem apoio político, e cassam seu mandato. Revogam a soberania popular expressa nas urnas.  O voto do povo não terá mais valor e suas vozes serão caladas pela repressão policial e pela censura promovida pelos próprios meios de comunicação controlados pelo grande capital.

Isso poderá ser feito em surdina, através da aplicação distorcida de dispositivos legais em vigor, como vem acontecendo há tempos, e de forma avassaladora no ambiente criado pela operação Lava Jato. Mais adiante, quando as circunstâncias permitirem, a mudança assim produzida será consolidada em fórmulas jurídicas novas, muitas delas de natureza constitucional.

Os magos do regime em formação dão tratos à bola na busca da combinação perfeita de ingredientes conhecidos: parlamentarismo; voto distrital, não obrigatório; redução do tempo e restrições ao acesso à propaganda eleitoral gratuita; restauração do financiamento privado às campanhas. Podem não estar de acordo quanto a meios e modos exatos, mas estão firmemente unidos em torno do objetivo comum:  ampliar as esferas de decisão “independentes”, isto é, blindadas contra os controles democráticos, bloquear a participação popular, expulsar as grandes massas da vida política.

Enquanto confabulam, os golpistas fazem uso sistemático da violência policial para calar o protesto, reforçando a tendência já antes visível de transformação da força policial em polícia política.

O golpe em curso não é só parlamentar, mas institucional. Ele envolve várias atores e instituições, desde o empresariado, os banqueiros, a grande mídia, setores do Judiciário do Ministério Público, da Polícia Federal, formando um campo de poder unificado contra as mudanças  ocorridas no país desde os governos populares de Lula e Dilma: a elevação do salário mínimo de forma sistemática, durante 13 anos e inúmeras políticas sociais que diminuíram a desigualdade social e reduziram a pobreza.

O programa econômico desse bloco antidemocrático é conhecido. Arrocho fiscal dramático a fim de liberar recursos para a remuneração de uma dívida pública permanentemente onerada por taxas de juros indecorosas, aliado a uma política radical de  privatização, que no contexto atual significa entregar, a preços aviltados, setores essenciais da economia nacional ao capital estrangeiro. Desprovido de projetos e estratégias de desenvolvimento plausíveis, o programa em questão acena, no longo prazo, com a miragem da integração nas cadeias produtivas globais e advoga a adesão acrítica aos mega-acordos comerciais liderados pelos Estados Unidos. Ele é, portanto, recessivo, antinacional e desindustrializante.

A contra-face desse projeto econômico nefasto é o ataque maciço aos direitos dos trabalhadores.  A ofensiva começou na Câmara Federal com o projeto de lei sobre a terceirização, logo no início do segundo governo Dilma. Agora ela é comandada diretamente do Planalto, e se traduz em inúmeras propostas em discussão na Câmara e no Senado visando a restringir direitos previdenciários, reduzir despesas com salários e retirar a proteção legal a todas as conquistas dos trabalhadores.

Essa coalizão também se movimenta contra o novo  realinhamento que o Brasil assumiu no cenário internacional adotando posição de maior protagonismo, especialmente na América Latina e nas alianças com os BRICs.

No equilíbrio frágil que marca no presente as relações internacionais, a pretensão de autonomia exibida por um país de  tamanho continental e peso econômico expressivo situado na área de influência direta dos Estados Unidos torna-se inaceitável para os donos do poder em escala global. Os golpistas brasileiros se aprestam a servi-los. Por isso, seus passos estão sendo acompanhados de perto e com grande interesse pelas empresas estrangeiras e por estrategistas da geopolítica internacional.

Mas eles estão sendo seguidos também, com atenção crescente, pelo povo brasileiro, que há vinte anos gritou “Diretas-já” e agora voltará a gritar: “Diretas, sempre”. A resistência popular saberá vencer os golpistas e construir uma pátria mais justa, democrática, livre e soberana.

Créditos da foto: Miguel Schincariol/AFP

Brasil. Legado olímpico arruinado com assassinatos por parte da polícia - Amnistia



O legado dos Jogos Olímpicos 2016, no Rio de Janeiro, foi destruído com, pelo menos, oito mortos em operações policiais na cidade durante o evento e com a repressão de protestos pacíficos, alertou hoje a Amnistia Internacional.

"O Brasil perdeu a medalha mais importante em jogo durante o Rio2016: a chance de se tornar um campeão em direitos humanos", afirmou Atila Roque, diretor executivo da Amnistia Internacional no Brasil.

Para o mesmo responsável, as autoridades brasileiras desperdiçaram uma "oportunidade de ouro" para cumprir as promessas que fizeram no sentido de "implementar políticas de segurança pública para fazerem do Rio uma cidade segura para todos".

"A única maneira de desfazer alguns dos muitos erros que ocorreram durante os Jogos é garantir que todos os assassinatos e outras violações dos direitos humanos por parte da polícia sejam efetivamente investigados e que os responsáveis sejam levados à justiça", considerou.

Para além dos oito assassinatos - um número que pode subir por ainda não terem sido confirmadas mortes em duas favelas -, houve relatos de outras violações de direitos humanos, como "invasões de domicílio, ameaças diretas e agressões físicas e verbais por parte da polícia", lê-se num comunicado daquela organização de defesa dos direitos humanos.

A organização não-governamental (ONG) recordou que o número de homicídios provocados pelas forças de segurança na região aumentou nos últimos meses, de 35 em abril para 49 em junho.

"A guerra às drogas e uma abordagem fortemente armada nas operações de segurança do Brasil também tem vindo a pôr polícias em risco", sendo que nos primeiros dez dias dos Jogos Olímpicos, pelo menos, dois agentes foram mortos, alertou.

De acordo com a mesma ONG, "manifestantes foram duramente reprimidos pela polícia, dentro e fora das arenas desportivas".

Manifestações pacíficas foram recebidas com violência policial, incluindo com o uso de armas, como gás lacrimogéneo, e houve pessoas detidas e retiradas das arenas desportivas por vestirem roupas ou segurarem faixas com mensagens políticas, lembrou a organização, falando em violação do direito à liberdade de expressão.

Em São Paulo, a 05 de agosto, uma manifestação culminou com "mais de 100 detenções, incluindo, pelo menos, 15 menores", acrescentou.

"Terminámos os Jogos Olímpicos com políticas de segurança pública ainda mais militarizadas, focadas numa repressão muito seletiva, no uso excessivo da força e de operações policiais de combate em favelas", constatou Atila Roque, frisando que as violações de direitos humanos contra residentes atingem sobretudo jovens negros do sexo masculino.

Para a organização, o Comité Olímpico Internacional (COI) e outros organismos de organização desportiva "não devem permitir que os eventos desportivos serem realizados à custa dos direitos humanos das pessoas ".

ANYN // EL - Lusa

A LÓGICA DO CAPITALISMO NEOLIBERAL



Prabhat Patnaik [*]

O capitalismo é um sistema "espontâneo" no sentido de que a sua dinâmica se caracteriza pelo desdobramento de certas tendências imanentes, tais como a mercantilização de tudo, a destruição da produção pré capitalista e o processo de centralização do capital. Levanta-se a questão: qual é o papel do Estado nesta dinâmica espontânea do capitalismo? Em geral o Estado numa sociedade capitalista ajuda esta dinâmica, removendo entraves e acelerando a operação das suas tendências imanentes. Entretanto pode haver certas conjunturas históricas em que a correlação de forças de classe é tal que o Estado pode ter de actuar para restringir a espontaneidade do capitalismo.

A conjuntura do pós guerra foi uma dessas, quando o enorme crescimento do campo socialista, o surto de confiança da classe trabalhadora nas metrópoles e a ascensão das lutas anti-coloniais de libertação no terceiro mundo, conjugaram-se para colocar uma séria ameaça à própria existência do sistema. A descolonização e a instituição da intervenção do Estado na "administração da procura" para assegurar altos níveis de emprego nas metrópoles (a qual assumiu mesmo a forma de medidas de Estado Previdência nos países da Europa onde a ameaça socialista era mais séria), foram caminhos pelos quais o sistema enfrentou esta ameaça existencial, com o Estado capitalista a actuar em certa medida para restringir a espontaneidade do sistema, embora de modo algum para eliminá-lo (pois isso é impossível enquanto o sistema existe). Além disso, nas economias descolonizadas, os Estados que se constituíram fora da [comunidade] de países socialistas, embora de carácter burguês no sentido de promover o desenvolvimento capitalista, devido à herança da luta anti-colonial também actuaram para restringir a espontaneidade do sistema.

Mas a própria centralização do capital verificada durante este período criou acumulações financeiras maciças cujo impulso para abolir fronteiras nacionais que restringiam sua liberdade de movimento inaugurou o actual regime de globalização que se caracteriza pela globalização do capital e, acima de tudo, da finança. O Estado-nação sob este regime perde sua autonomia face à globalização da finança, uma vez que qualquer movimento da sua parte para actuar de uma maneira oposta às exigências da finança provoca uma fuga financeira e portanto uma crise interna. Portanto, os Estados-nação de facto mais uma vez promoveram, ao invés de restringir, as tendências imanentes do capital. As políticas através das quais eles assim o fazem são aquilo a que chamamos as políticas neoliberais. O neoliberalismo, em suma, restaura a "espontaneidade" do capitalismo". Encarar o Estado neoliberal como a "retroceder" em favor do "mercado" é enganoso – o Estado actua de acordo com as exigências do capital financeiro internacional e da oligarquia corporativa-financeira interna integrada com ele e, com isso, ajuda a "espontaneidade" do sistema.

ASSALTO À PEQUENA PRODUÇÃO 

Uma vez que uma importante tendência imanente é a destruição da pequena produção pré capitalista, esta reafirmação da "espontaneidade" do sistema capitalista mostra-se, inter alia, como um assalto à pequena produção, incluindo a agricultura camponesa, por toda a parte. A crise agrária e os suicídios de camponeses que assistimos na Índia na era neoliberal são simplesmente a expressão deste assalto. Eles ocorrem não porque a agricultura seja "abandonada" sob a administração neoliberal, como habitualmente se pensa, mas por causa desta mesma administração.

Os mecanismos através dos quais se verifica este assalto à pequena produção constituem o que Marx chamou o processo de "acumulação primitiva de capital". Se bem que a acumulação primitiva seja logicamente distinta, e ocorra historicamente antes, do que se pode chamar a acumulação "normal" de capital estudada pormenorizadamente no Capital, ela não está confinada só ao período anterior àquele em que o capitalismo se pôs de pé. Ao contrário, ela ocorre através de toda a história do capitalismo, utilizando colonialismo como sua arma principal, como Marx observou nos seus escritos sobre a Índia. O Estado colonial efectuou esta acumulação primitiva a expensas dos pequenos produtores através dos processos paralelos de "drenagem de excedente" e "desindustrialização", ao passo que o Estado neoliberal utiliza outros instrumentos (como vemos abaixo), mas a sua manifestação na forma de uma crise da pequena produção permanece a mesma. Em suma, a actual crise agrária é uma re-emergência, embora sob circunstâncias mudadas, da prolongada crise agrária da era colonial que fora interrompida por algum tempo durante a era dirigista.

Não [significa] que na era dirigista não houvesse acumulação primitiva de capital: a expulsão de arrendatários(tenants) que assinalou a transição rumo à agricultura capitalista da variedade junker durante este período foi um exemplo óbvio disto. Mas isto foi acumulação primitiva a verificar-se dentro da economia agrária, não infligida pelo grande capital a partir de fora. Agora, verifica-se além disso que tal acumulação primitiva infligida a partir de fora pelo grande capital e pelo Estado neoliberal (o qual ao invés de aparentemente pairar acima das classes e cuidar dos interesses de "todos" torna-se preocupado acima de tudo com a promoção dos interesses da oligarquia corporativo-financeira). Pode-se pensar que quanto a isto não há necessidade de distinguir entre a era dirigista e a era neoliberal uma vez que a acumulação primitiva ocorre sob ambas. A questão entretanto é que a acumulação primitiva da espécie que se verifica neste último período é sobreposta à acumulação primitiva verificada durante o período anterior, a qual também continua no período posterior. É isto que explica a virulência da crise agrária de hoje.

O assalto à agricultura camponesa assume duas formas. Uma, constituindo acumulação primitiva em termos de "fluxo", implica um esmagamento de rendimentos da agricultura e portanto da lucratividade (tal como o que o sistema fiscal efectuou no período colonial). A outra, constituindo acumulação primitiva em termos de "stock", implica uma transferência de activos dos camponeses a preços vis ("throwaway"), muitas vezes sem o seu consentimento, para corporações e desenvolvedores imobiliários para projectos de "infraestrutura" ou "industriais" (além das transferências que se verificam dentro da economia agrária para latifundiários). Mesmo quando é obtido consentimento, ele não é de todos os produtores dependentes de um lote de terra particular; a compensação não é paga igualmente a todos os produtores. Aqueles que são excluídos perdem evidentemente seus direitos sobre a terra em troca de nada (incluindo direitos costumeiros) e são as vítimas óbvias da acumulação primitiva em termos de "stock".

Esta última questão tem sido muito discutida; vamos portanto concentrar-nos nela. Um certo número de medidas tomadas pelo regime dirigista para melhorar a resiliência e lucratividade da agricultura foi desfeito sob o regime neoliberal, esmagando o campesinato até o ponto em que mesmo a reprodução simples se torna impossível para grande número deles, resultando em suicídios de camponeses (mais de 200 mil na última década e meia). Entre estas estão: acabar o isolamento da agricultura camponesa das vicissitudes das flutuações de preços do mercado mundial que o dirigismo proporcionava por meio de tarifas e restrições quantitativas; colocar camponeses em contacto directo com multinacionais do agro-negócio e corporações internas sem a almofada protectora do Estado; fazer subir preços de inputs através da retirada de subsídios do Estado, exigido pelo facto de que recursos orçamentais fluem cada vez mais para grandes corporações; reduzir a investigação e desenvolvimento agrícola em instituições públicas; terminar serviços públicos de extensão agrícola; cortes severos no investimento público na agricultura; uma retirada progressiva de crédito institucional para o sector de modo a que camponeses tenham de contrair empréstimos a taxas exorbitantes de uma classe de novos usurários; e privatização de serviços essenciais como educação e saúde o que os torna inacessíveis para trabalhadores rurais. Também se podem listar medidas semelhantes que afectam outros segmentos de pequenos produtores: pescadores, artesãos, fiadores e tecelões.

A acumulação primitiva de capital que destrói a pequena produção e liberta trabalhadores para o desemprego não teria provocado o sofrimento que provocou se aqueles "libertados" pela sua destruição houvessem sido absorvidos significativamente dentro do "exército de trabalho activo". Ele não o foram e a razão para isso está na remoção de outra restrição à "espontaneidade" que o dirigismo havia imposto, nomeado sobre o ritmo da mudança tecnológica e estrutural. Em consequência a taxa de crescimento da produtividade do trabalho tem sido tão alta que, apesar das taxas de crescimento aparentemente altas do PIB, a taxa de crescimento do emprego tem sido demasiado diminuta para absorver sequer o crescimento natural da força de trabalho, muito menos os pequenos produtores deslocados à procura de empregos. Certamente o crescente desemprego relativo provocado por isto não se manifestou como tal: ele assumiu a forma de uma proliferação de emprego precário, emprego em tempo parcial, emprego intermitente e desemprego disfarçados (muitas vezes camuflado como "micro empreendedorismo"). O racionamento de emprego em grande medida apagou a própria distinção entre exércitos de trabalho activos e de reserva como entidades separadas. Isto por um lado resultou numa proliferação do lumpen proletariado e por outro numa estagnação ou mesmo declínio dos salários reais dos trabalhadores organizados.

Mesmo que tomemos o período 2004-05 a 2009-10 que supostamente testemunhou crescimento rápido do PIB e que limitemos a nossa atenção ao que o NSS chama de "status habitual" do emprego como um indicador aproximado do emprego correcto, descobrimos que a taxa de crescimento de tal emprego foram uns meros 0,8 por cento ao ano, bem abaixo da taxa de crescimento da própria população (e portanto, aproximadamente, da força de trabalho natural) ainda que ignoremos os pequenos produtores deslocados à procura de emprego. Segue-se portanto que para os trabalhadores como um todo, incluindo trabalhadores agrícolas, camponeses e pequenos produtores e trabalhadores de colarinho não branco, tem havido uma deterioração absoluta das condições de vida reais sob o neoliberalismo. Isto se deve ao facto de que a característica essencial de um regime neoliberal é infligir um processo virulento de acumulação primitiva de capital numa situação de geração de emprego diminuta, o qual também foi exactamente o caso sob o regime colonial.

O paralelo com a crise agrária do período colonial fica sublinhado se olharmos os números da produção cerealífera. A produção líquida média anual per capita de cereais no quinquénio 1897-1902 foi de 201,1 quilogramas para a "Índia Britânica", a qual declinou para 146,7 no quinquénio 1939-44 (os números subsequentes são afectados pela partição). Isto foi um declínio maciço, de mais de 25 por cento, o qual mostra a severidade da crise agrária. No entanto este declínio foi revertido e houve uma melhoria no período pós independência, até o início da "liberalização": o número para a União Indiana como um todo ascendeu para 178,77 kg no triénio concluído em 1991-92. Contudo, o período da "liberalização" assistiu mais uma vez a um declínio: a produção cerealífera líquida anual per capita do triénio acabado em 2012-23 (a qual é comparável com a do triénio anterior) foi de 169,52 kg.

Significativamente, o declínio na disponibilidade líquida per capita de cereais também acompanhou este declínio da produção, o que demonstra a afirmação feita anteriormente acerca da deterioração das condições de vida dos trabalhadores como um todo. A produção líquida anual per capita de cereais, a qual é definida como produção líquida menos exportações líquidas menos acréscimos líquidos a stocks (embora por razões práticas só stocks do governo sejam considerados), ascendeu de 152,72 kg no quinquénio 1951-55 para 177 kg no quinquénio terminado em 1991-92. Para o triénio terminado em 2012-13, este número desceu para 172,1 kg.

DECLÍNIO DA ABSORÇÃO ALIMENTAR 

Este declínio na absorção alimentar que estes números sugerem também é confirmado pelos números da ingestão de calorias per capita. A percentagem da população rural com acesso a menos de 2200 calorias por pessoa por dia (a qual é a referência para definir pobreza rural) aumentou de 58,5 em 1993-94 (o primeiro inquérito NSS do período de "liberalização" para 68 em 2011-12. A percentagem de população urbana com acesso a menos de 2100 calorias por pessoa por dia (a referência para definir pobreza urbana) aumentou de 57 em 1994-94 para 65 em 2011-12. Em termos de fome, a Índia agora classifica-se abaixo da África sub-Saariana e também no que a ONU chama "os países menos desenvolvidos" ("the least developed countries, LDCs"). O facto da fome crescente contradiz afirmações oficiais acerca do declínio da pobreza, mas isto não é surpreendente uma vez que as afirmações oficiais baseiam-se num método espúrio de estimar a pobreza. Este método define uma "linha de pobreza" para o ano base como um nível de referência da despesa (à qual as normas de calorias são cumpridas) e então actualiza-o para anos posteriores utilizando um índice de preços no consumidor a fim de estimar quantas pessoas caem abaixo desta linha. Tais índices de preços no consumidor, contudo, subestimam seriamente a inflação de preços real: eles não levam em conta o aumento no custo de vida devido à privatização de serviços essenciais como educação e cuidados de saúde.

A ascensão do PIB per capita numa situação de absoluta deterioração das condições de vida dos trabalhadores implica um aumento maciço da fatia do excedente no PIB, a qual explica o aumento extraordinário em desigualdades de rendimento e riqueza durante o período da liberalização, como é evidente por exemplo na ascensão do número de indianos bilionários. Ela também explica (num período em que a realização do excedente em ascensão não tem sido um problema devido ao boom) o enriquecimento visível de um segmento da classe média. O rendimento deste segmento é ou derivado directamente deste excedente, exemplo, da sua despesa com consumo de luxo e de actividades associadas à sua extracção, ou dependente do seu crescimento (o qual é o reino da finança). Além disso, a comutação de um conjunto de actividades tais como serviços relacionados com tecnologia de informação (IT) de países metropolitanos para a economia indiana, a qual faz parte de um fenómeno de transferência("outsourcing") para o terceiro mundo que caracteriza a era actual da globalização, também contribui para o seu crescimento. Entretanto, o crescimento deste segmento da classe média talvez seja menor em termos da suadimensão numérica relativa do que em termos do seu rendimento relativo em relação ao trabalhadores.

Os ciclos de expansão (booms) sob o capitalismo neoliberal são tipicamente associados à formação de bolhas de preços de activos. O prolongado boom capitalista mundial que foi sustentado primeiro pela "bolha dotcom" e a seguir pela "bolha habitacional" e que está subjacente ao boom do período de liberalização na economia indiana, chegou ao fim, sem novas bolhas à vista no futuro previsível. Os dias tranquilos do neoliberalismo estão acabados, o que portanto traz para a agenda histórica uma luta pela sua transcendência. Isto pode ser uma luta combinada, dos trabalhadores que têm sido suas vítimas, e de segmentos da classe média que até agora têm sido seus beneficiários mas actualmente estão à beira de tempos árduos. Mas precisamente por causa desta possibilidade, o capitalismo neoliberal também promoverá tendências fascistas e semi-fascistas a fim de dividir o povo. Reagir a estas tendências é o meio pelo qual a esquerda e as forças democráticas podem avançar.

[*] Economista, indiano, ver Wikipedia 

O original encontra-se em peoplesdemocracy.in/2016/0814_pd/logic-neo-liberal-capitalism . Tradução de JF. 

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/

Apelos para criação de um «exército comum europeu» repetem-se ao mais alto nível



O presidente da Comissão Europeia defendeu ontem a criação de um «exército comum europeu para que a Europa possa cumprir o seu papel no mundo». É a segunda declaração nesse sentido nos últimos meses.

Jean-Claude Juncker afirmou ontem, à margem do Fórum Europeu de Alpbach, na Áustria, a necessidade de políticas comuns nas áreas da segurança e da defesa. Para o presidente da Comissão Europeia, só assim será possível avançar para a criação de um «exército comum europeu para que a União Europeia (UE) possa cumprir o seu papel no mundo».

Estas declarações surgem depois de, em Junho, o presidente da Comissão de Negócios Estrangeiros do Parlamento Europeu ter defendido a criação de «um quartel-general comum e uma coligação de boa vontade [termo utilizado por George W. Bush para designar a coligação que liderou na agressão ao Iraque, em 2003]. Um exército da UE deve surgir desse grupo». O alemão Elmar Brok, membro da CDU, o partido de Angela Merkel, assumiu esta posição poucos dias depois do referendo em que os britânicos optaram pela saída da UE (Brexit).

Fontes diplomáticas citadas pela Sputniknews afirmam que o Brexit pode ser uma oportunidade para «activar a ideia da criação de forças armadas conjuntas da UE».

A criação de umas «forças armadas europeias» foi relançada por Juncker em Março de 2015, a propósito do conflito na Ucrânia. Na altura, o responsável defendeu que essa medida «enviaria uma mensagem clara à Rússia», posição em que foi acompanhado pela Alemanha, sendo o governo britânico um dos principais opositores.

A União Europeia, apesar das limitações nas suas competências em matérias de defesa e política externa, tem desempenhado papéis de destaque em recentes operações de desestabilização e agressão, como aconteceu com a aprovação de uma resolução, pelo Parlamento Europeu, que apoiava uma zona de exclusão aérea na Líbia, que possibilitou a intervenção da NATO e o conflito que dura até hoje.


Portugal. O COMBATE NECESSÁRIO À EVASÃO FISCAL



AbrilAbril, editorial

As sucessivas polémicas, leaks e «papéis», envolvendo as principais instituições financeiras mundiais, grandes grupos financeiros ou seus representantes, continuam sem respostas políticas ao problema.

O combate à fraude e evasão fiscal é um imperativo dos tempos que vivemos. As sucessivas polémicas, leaks e «papéis», envolvendo as principais instituições financeiras mundiais, grandes grupos financeiros ou seus representantes, continuam sem respostas políticas ao problema.

A intenção do Governo português de criar mecanismos de monitorização sobre fluxos financeiros susceptíveis de indicar fugas ao fisco é uma necessidade. O tempo de proclamar intenções sem nunca tomar medidas efectivas e duradouras já lá vai.

O diploma que o Governo tem em preparação prevê que as instituições bancárias comuniquem à Autoridade Tributária o saldo das contas bancárias dos residentes em Portugal. O mecanismo é a transposição de uma directiva europeia que resultou de um acordo sobre evasão fiscal com os Estados Unidos da América.

O propósito é que a máquina fiscal possa usar a informação para detectar informações na alteração da situação patrimonial que indiciem práticas ilícitas. Os dados de cidadãos estrangeiros seriam enviados para as entidades dos seus países, num regime de reciprocidade.

A cooperação internacional nesta área é, também, não só útil mas necessária. E não se pode ficar pela troca de informações: são urgentes medidas para pôr fim aos paraísos fiscais, a começar pelo nosso pequeno offshore – a Zona Franca da Madeira.

Mas, se a intenção é boa e necessária, a Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) levanta questões pertinentes, no parecer dado ao anteprojecto remetido pelo Governo.

A opção de exigir a comunicação dos saldos de todas as contas de residentes em Portugal, com ou sem o limiar dos 50 mil euros recentemente avançado, acarreta problemas de constitucionalidade. Para lá de questões formais, a CNPD alerta que tal medida representa um «restrição desnecessária e excessiva dos direitos fundamentais à protecção de dados pessoais e à reserva da vida privada».

Vários casos recentes puseram a nu a necessidade de adoptar medidas para combater o crime económico. Mas, ouvidas as justas preocupações da CNPD, importa que o Governo afine agulhas para que isso seja feito sem pôr em causa direitos e garantias fundamentais, como é a reserva da vida privada.

ESCLAVAGISTAS PORTUGUESES CONTINUAM IMPUNES. GOVERNOS E JUSTIÇA INDIFERENTES



Já hoje abordámos ao de leve o que o Jornal de Notícias trouxe a público. É fraude. É público. E a justiça faz o quê? E o governo faz o quê? Assobiam para o lado, cúmplices dos modernos esclavagistas que exploram ao arrepio das normas estabelecidas e da lei os jovens portugueses e todos os outros trabalhadores vítimas. A maioria dos empresários só não o faz se de todo não puderem, sabendo-se impunes porque nem a Autoridade para as Condições do Trabalho, nem os governos, nem a justiça, os penaliza. Em vez de fiscalizarem como devem e com a frequência que possa combater atos e a mentalidade esclavagista dos empresários assobiam para o lado e deixam andar. Quando algumas das fraudes e ilegalidades cometidas são denunciadas publicamente assistimos ao jogo do empurra dos diversos organismos reguladores e dos próprios governos. Perante fraudes e crimes públicos, como o que o JN denunciou hoje a PGR fica muda e queda. Ora para o cidadão comum o que é descrito como fraude é crime e se vem a público é a denúncia que perfaz a obrigação de uma investigação àquela moldura penal. Ou não será assim?

E o Fisco o que tem a dizer e a fazer?

Também o fisco deveria explicar como é que o dinheiro que é declarado por pagamento aos estagiários depois volta a entrar nas empresas devido aos estagiários terem a imposição de devolver grande parte daquilo que lhes pertence. Ou essas verbas não entram mais nas contas e vai para o “saco azul”? E isso não é motivo de penalização? Esses empresários, que beneficiam de subsídios do IEFP quando admitem estagiários, perante esta operação fraudulenta não declaram o retorno dessas verbas? E então? Fisco, e então?

Do JN trazemos o trabalho de Rogério Matos que já foi libertado na edição online – hoje de manhã era exclusivo do JN impresso. A complementar também pode ler o que diz uma estagiária de arquitetura, vítima do esquema fraudulento com dinheiros públicos. A jovem resume a exploração a que devido às circunstâncias foi sujeita: "Era isto ou trabalhar de borla".

É espantoso como na humanidade se mantém a mentalidade esclavagista. Neste exemplo específico a denúncia está feita mas tudo vai ficar em águas de bacalhau. A impunidade dos esclavagistas conta com a subserviência e cumplicidade dos governos e dos organismos estatais que têm a obrigação de pôr cobro a tais abusos, a tais fraudes, a tais crimes.

Assim não acontece. Muito provavelmente existem no rol dos infratores, nos  escritórios de advogados, “doutos” que fazem parte de partidos políticos do nefasto Arco da Governação e da Corrupção, idem em ateliers de arquitetos – pelo menos nesses de colarinhos brancos, engravatados, com semblantes de respeitabilidade mas que são de facto grandes vigaristas. Esclavagistas da modernidade nas vestes e na aparência dos métodos, contudo, no substancial, são verdadeiros negreiros nas naus de governos que os acolhem e lhes oferecem impunidade, impunidade, impunidade. Caso para considerar: tudo farinha do mesmo saco.

Leia a “pérola” sobre os empresários sevandijas no JN, a seguir.

Mário Motta / PG

Patrões obrigam estagiários a devolver salários

Os estágios profissionais promovidos pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) estão a ser alvo de uma fraude em larga escala.

Ao que apurou o JN, há muitos patrões que não só exigem aos jovens estagiários que lhes devolvam a comparticipação da empresa no salário (que oscila entre 20% e 35%), como ainda lhes impõem que sejam eles a pagar a taxa social única (23,75%) que corresponde à entidade empregadora. Ou seja, dos 691 euros ilíquidos mensais que um estagiário com licenciatura recebe, até 400 podem acabar, por debaixo da mesa, nas mãos dos empresários que os contratam.

Em causa poderão também estar eventuais delitos de natureza fiscal, uma vez que as empresas declaram essas despesas com pessoal, conseguindo os respetivos benefícios em termos de IRC, mas recebem o dinheiro de volta, desta vez sem o declarar ao Fisco. Segundo o presidente do Conselho Nacional da Juventude, o esquema configura pelo menos uma "autêntica lavagem de dinheiro".

Hugo Carvalho confirmou que lhe chegam muitas denúncias, mas admitiu que nenhuma queixa foi formalizada. A explicação é simples: os jovens precisam destes estágios, seja para ter acesso à profissão que escolheram, seja para conseguir algum rendimento, e aceitam a chantagem dos empregadores, acabando por ser, eles próprios, coniventes com o esquema fraudulento.

Contactado pelo JN, o IEFP, organismo que gere a atribuição dos estágios profissionais, e que assegura o pagamento da maior fatia do subsídio (entre 65% e 80%), afirma desconhecer esta prática. Mas salienta, ainda assim, que qualquer entidade empregadora envolvida neste tipo de situação dispõe de um prazo reduzido para promover a sua correção, sob pena de ser obrigada devolver os apoios financeiros concedidos e ficar impedida de aceder a outros. "O IEFP está atento a fenómenos do género que possam ocorrer e apelamos a quem tenha conhecimento de alguma irregularidade, ou seja vítima dela, que a denuncie de imediato aos nossos serviços", refere fonte oficial.

Esta fraude sedimentou-se sobretudo nos setores mais afetados pela crise económica: arquitetura, pequeno comércio, psicologia e advocacia, entre outros. No entanto, e com a exceção da Ordem dos Psicólogos, tanto as ordens dos engenheiros, advogados e arquitetos, como os sindicatos, passando pela Confederação Portuguesa das Micro, Pequenas e Médias Empresas, ou movimentos de cidadãos como os Precários Inflexíveis, todos afirmam desconhecer esta prática.

Desconhecimento

A Ordem dos Arquitetos, por exemplo, diz não ter qualquer papel na relação entre entidades empregadoras e o IEFP, "nem obtém qualquer informação sobre a atribuição de subsídio à remuneração do estágio". Até junho deste ano, entraram 495 novos profissionais neste setor. Em todo o ano passado foram 833.

O mesmo desconhecimento é partilhado pela Ordem dos Engenheiros, ainda que garanta "condenar e denunciar publicamente qualquer ocorrência de que lhe chegue informação". Até julho deste ano, deram entrada na Ordem 3204 novos membros.

A Ordem dos Advogados passou a permitir que os estágios profissionais dessem acesso à profissão em outubro passado, mas acrescenta que teve o cuidado de proibir expressamente a retenção de qualquer verba por parte dos empregadores. A bastonária, Elina Fraga, mostra-se surpreendida e diz que não chegou ao seu conhecimento qualquer queixa. "Essa prática é completamente ilegal. Se a Ordem tiver conhecimento de que tal acontece em algum escritório de advogados, remete o caso para o órgão disciplinar", frisa. A sanção pode ir desde a mera advertência à expulsão para o prevaricador.

Apenas a Ordem dos Psicólogos conhece bem esta prática e apresenta um plano para a combater: foi criada há três anos uma equipa de trabalho para vigiar as 3500 entidades com quem a Ordem tem acordos para receber estagiários.

Numa situação em concreto, em que uma estagiária foi abordada pela entidade empregadora para devolver a comparticipação suportada pela empresa, foram cortadas as relações com essa empresa. Mas também é verdade que não foi feita qualquer queixa formal junto do Instituto do Emprego e Formação Profissional.

Rogério Matos – Jornal de Notícias

Pagar o estágio: "Era isto ou trabalhar de borla"

Ana conta ao JN que se viu obrigada a pagar o seu estágio de nove meses num ateliê de arquitetura para poder inscrever-se na Ordem dos Arquitetos.

O nome é fictício, mas a história é verídica. "Não há mais nada", atira Ana. "O setor está a passar por dificuldades e eu tenho de obter o título profissional. Era isto ou trabalhar de borla", acrescenta.

Em abril do ano passado, depois de procurar ateliês que a aceitassem e a remunerassem pelo seu trabalho, durante o período de estágio obrigatório para conseguir acesso à Ordem, esta jovem graduada com o Mestrado pela Faculdade de Arquitetura de Lisboa, acabou por desistir e aceitou pagar o estágio do próprio bolso.

No final do primeiro mês de trabalho, entregou ao patrão cerca de 160 euros, que correspondiam à comparticipação da empresa no subsídio de 691 euros ilíquidos. No entanto, e ao segundo mês, o patrão subiu a parada e, para além da devolução da comparticipação do ateliê no subsídio, exigiu a Ana que que pagasse também a taxa social única que corresponde à entidade empregadora (23,75%, ou seja, 164 euros). Após uma curta negociação, Ana acordou com o patrão um pagamento de 300 euros mensais. Se se tiver em conta que Ana teve ainda de pagar os descontos para a Segurança Social e para o IRS, sobrou menos de metade do subsídio inicial. O que não impediu o patrão de lhe apontar "a sorte que tem".

Ao fim de nove meses de estágio, o empregador acrescentou uma última fatura: queria 1500 euros (o equivalente a custos com seguros de trabalho e outras despesas) e Ana, com receio de não receber a minuta para entregar na Ordem, provando a realização do estágio, ponderou pagar. A minuta, no entanto, foi entregue e, até hoje, os 1500 euros não foram pagos.

Ao que apurou o JN, só por este ateliê de arquitetura já passaram pelo menos mais três jovens que pagaram o seu estágio do próprio bolso, em condições fraudulentas semelhantes à de Ana.

Rogério Matos – Jornal de Notícias

OLIMPÍADAS DOS GOLPISTAS NO BRASIL… E TAMBÉM EM PORTUGAL – O IEFP DE NADA SABE




Expresso Curto servido por Henrique Monteiro. Vindo de umas boas semanas de férias regressou com a pica quase toda. Que bom. Claro que abre com os Jogos Olímpicos, essa distração, alienação, competição, que envolve in loco uns largos milhares a assistirem mas fora dos estádios e demais palcos olímpicos mantém mais de duas centenas de milhões de brasileiros reféns dos golpistas que tomaram os poderes político-judiciais, entre outros. António Mourão cantava nos tempos salazaristas-fascistas em Portugal “Oh Tempo Volta P’ra Trás” (correspondente no Brasil ignoramos) mas sem a saberem cantar Temer e capangas é isso mesmo que estão fazendo. A ditadura pseudo-branda está em marcha. Tudo cozinhado e alinhado pelos sábios ciosos dos EUA que estão a fomentar na América Latina o golpismo e retomar com a força de antes os privilégios no seu quintal das traseiras, assassinando, reprimindo e explorando os latino-americanos. As Pátrias dos heróis resistentes estão a ser ocupadas por regimes que servem os EUA e o tal neoliberalismo-fascista a que agora chamam democracia. Claro que no Curto Henrique Monteiro não escreve com esta clareza e objetividade. Nem pode, apesar de não ser novidade. O tio Balsemão e o Tio Sam são unha com carne. O Bilderberg é mais que o sabugo entre as ditas unhas e a carne. Fazem tudo e todos parte da mesma “geringonça  criminosa” que trama os povos pelo mundo inteiro, ou quase todos.

Empresários salafrários

Completo no Jornal de Notícias está o título “Patrões obrigam estagiários a devolver salários”. Completo só poderá ler se pagar, comprando o JN impresso. Podemos adiantar que estes patrões estão a tramar estagiários formados em direito ou que para lá caminham, e nas mesmas condições estagiários de psicologia, de arquitetura, pequeno comércio e… por aí a fora. A sacanagem patronal de colarinho branco é impune. Estamos a pagar para aqueles javardos explorarem quem está a começar as suas profissões. Os futuros “doutores” ou não estão a comer o pão que o diabo amassa servindo salafrários da profissão que escolheram e que não param de roubar pelo simples motivo de beneficiarem de impunidade sistemática. Porque ainda não lemos tudo de fio a pavio não nos queremos espalhar e escrever o que não corresponde ao golpe dos porcos de colarinho branco, dos tais “doutores”. Mas lá iremos e faremos as devidas referências apuradas aqui no PG. Ressaltemos que o IEFP não sabe de nada, a CGTP alertou o governo mas nada aconteceu, a suposta Autoridade para as Condições de Trabalho... nada fez, nem faz. Nenhum dos jovens estagiários apresentou queixa… quem sabe é o Conselho da Juventude. A vigarice é enorme. Querem uma aposta que os sacanórios daqueles empresários “doutores” ou não vão ficar impunes? Ah pois é! E a seguir lá partem para outra golpada, os salafrários. São olímpicos e descarados golpistas.

Inicio de semana. Desfrute o melhor possível das poucas coisas agradáveis que se lhe depararem. Aproveite para pensar na trampa de sociedade em que andamos a chafurdar. Bom banho de lama… e caca - que é o que mais contém esta fossa em que tanto lutamos para sobreviver. A exploração é inaudita. Basta!

Bom dia, se mesmo assim conseguir. Acompanhe a prosa de Henrique Monteiro, fresco das férias.

Mário Motta / PG

Bom dia, este é o seu Expresso Curto

Henrique Monteiro – Expresso

Foi bonita a festa, pá… voltemos à dura realidade

Estes Jogos Olímpicos, que foram uma vitória para o Brasil pelo modo pacífico e bastante organizado como decorreram, deixam dois nomes inesquecíveis. O primeiro é Usain Bolt (completou 30 anos ontem) nos 100 e 200 metros no Atletismo (também na estafeta 4x100 com a Jamaica) que em três Olimpíadas conseguiu nove medalhas de ouro na velocidade, ou seja todas as que podia ganhar, além de ser detentor dos respetivos recordes mundiais. O segundo é Michael Phelps, norte-americano conhecido como torpedo de Baltimore, na Natação, que tem 23 medalhas de ouro ao longo de quatro Olimpíadas e todos os recordes que um atleta pode conseguir. Só em Pequim 2008 conseguiu oito medalhas de ouro, batendo uma antiga marca de Mike Spitz, também ele dos EUA e nadador, que durava desde 1972. Este ano, no Rio, além de ser o nadador mais velho (31 anos e 40 dias) a ganhar uma medalha de ouro, conseguiu mais quatro medalhas de primeiro lugar e uma de prata. Ambos se retiram, sem um sucessor à altura. Embora, para o futuro fique uma menina de 19 anos, Simone Biles, também norte-americana, que deslumbrou o mundo na Ginástica com quatro medalhas de ouro e uma de bronze.

De resto, 19 dias de competição, 10 500 atletas e 28 modalidades depois, os EUA, como tem sido habitual, foram o país que mais medalhas arrecadaram (121, das quais 46 de ouro), seguidos de uma surpreendente Grã Bretanha (67 medalhas, 27 de ouro) e só depois a China (70 medalhas, mas apenas 26 de ouro). A Rússia ficou-se pelo quarto lugar e a Alemanha pelo quinto (ver aqui a tabela).

Portugal, na sua modestíssima 78º posição, como se pode ver nesta infografia do ‘Público’, teve das piores participações de sempre e a pior desde 1992, em Barcelona, ficando apenas com uma medalha de bronze conquistada por Telma Monteiro. No entanto, a participação global foi bastante melhor do que o medalheiro dá a entender (o chefe da delegação, José Garcia, diz mesmo que foi a melhor se contarmos as vezes que ficámos nos seis primeiros lugares). De facto, não se pode esquecer a boa prestação dos ciclistas, do nosso representante no Triatlo, ou das provas de ténis de mesa, de canoagem e de saltos em hipismo. Para não falar em Nelson Évorae Patrícia Mamona que deram o seu melhor. Ainda assim, o 'Correio da Manhã' de hoje titula garrafalmente que "Portugal pagou 17 milhões pela medalha de bronze"

Depois da festa de encerramento, que tal como a de abertura foi sentida e desta vez um pouco mais carnavalesca (teve Pixinguinha, Noel Rosa, Braguinha, tudo interpretado por Martinho da Vila), embora não tão sincronizada como em Pequim 2008 ou tão tecnológica como em Londres 2012, o Brasil voltará à dura realidade. Os escândalos que ficaram um pouco esquecidos, o 'impeachment' da presidente Dilma cujo processo vai continuar... Numa palavra, o interregno de paz (e assim era na antiguidade) acaba. E, por cá, o mesmo. Passado o efeito do Europeu de Futebol e passadas as esperanças olímpicas as atenções viram-se para o fraquíssimo desempenho da Economia, para as pequenas guerras dentro da geringonça e no seio da caranguejola. Tudo como dantes... Quartel-General em Abrantes! Como dizia um velho provérbio.

OUTRAS NOTÍCIAS

Os líderes europeus da Alemanha, França e Itália Merkel,Hollande e Renzi - reúnem-se esta tarde em Ventotene, uma pequena ilha na Itália, para discutir o futuro da Europa depois do 'Brexit'. Ao mesmo tempo, os três dirigentes visam preparar acimeira de líderes em Bratislava, a 16 de setembro.

Será verdade o que Yascha Mounk, doutor em Teoria Política, leitor em Harvard e a fazer o pós-doutoramento em relações EUA-Europa no programa do German Marshall Fund, escreve na revista ‘Slate’: Terá havido uma semana em que a democracia faleceu? Este é mesmo o título do artigo (em inglês). E a semana não é longínqua; foi a que começou na segunda-feira, 11 de Julho. O que se passou? Quase tudo: Depois do ‘Brexit’, Cameron demitiu-se e Theresa May foi para o Governo inglês, levando eurocéticos como Boris Johnson; o ataque terrorista em Nice, quinta-feira, 14, iniciou uma longa discussão em França sobre a imigração; no dia seguinte, sexta-feira, dia 15, o célebre e ainda por explicar golpe na Turquia que redundou na perseguição de todos os opositores de Erdogan. E, como cereja em cima do bolo, Trump apoiou o Brexit, aproveitou Nice para a sua campanha anti-islâmica e culpou Obama e a sua política pelo golpe turco. Ou seja, em meros sete dias, os populistas, como Boris em Londres, Le Pen em França, Erdogan na Turquia e Trump nos EUA conseguiram abalar os fundamentos democráticos do Ocidente.

O bombista suicida que matou, pelo menos, 50 pessoas numa festa de casamento entre curdos, na Turquia, teria entre 12 e 14 anos, disse o presidente Erdogan, que acusou o autodenominado Estado Islâmico, ou Daesh, pelo ataque.

Há ainda a questão dos filhos do embaixador iraquiano em Lisboa que deixaram em estado muito grave um rapaz de 15 anos, depois de uma querela entre aqueles (gémeos de 17 anos) e o adolescente português Ruben Cavaco. Além do problema da imunidade diplomática, a polícia pensa que eles podem já estar fora do país. Entretanto, Augusto Santos Silva, ministro dos Negócios Estrangeiros diz que Portugal fará tudo para apurar a verdade dos factos.

No sábado o Expresso revelava as contas mais secretas do Grupo Espírito Santo, ainda na sequência das investigações aosPanamá Papers. O esquema é tão complexo que só mesmo um desenho o consegue explicar. Para quem for assinante, aqui está o essencial.

Entretanto, noutro imbróglio diferente, mas que não deixa de ser embaraçoso, vem a saber-se, via SIC Notícias, que o Presidente Marcelo não concorda com a alteração da lei que o Governo quer fazer para encaixar na administração da Caixa Geral de Depósitos os nomes que foram apontados. Já houve quem dissesse (Editorial do ‘Público’ de dia 19) que a CGD devia ser o Waterloo de Mário Centeno. Porém, Napoleão à parte, tudo aquilo – desde o modo como foi conduzido o processo, às recomendações do BCE - cheira a vergonha por todo o lado. Não é sem razão que Nicolau Santos lhe chama “a enorme e lamentável trapalhada” e Pedro Santos Guerreiro descreveu os diversos “embaraços” do processo e salienta que a forma como foi dirigido “prejudicou a nossa imagem e a da Caixa”.

Estas e outras (entre as quais a manchete do 'Público' onde se afirma que os 120 dirigentes do IEFP afastados exigem que a exoneração seja anulada, provocando dez queixas em tribunal) levaram Marques Mendes a dizer que Agosto foi o pior mês para o Governo. Já o 'Jornal de Negócios' tem uma notícia inesperada: O imposto sobre heranças fica na gaveta.

O Bloco de Esquerda quer saber se pessoas deficientes institucionalizadas podem desempenhar tarefas sem remuneração. Tudo isto porque no Instituto Monsenhor Airosaumas senhoras deficientes gastam duas horas por dia a ajudar a fazer hóstias. Mas o Bloco nunca ouviu que tudo isto é para a remissão dos pecados e AMDG (Ad Maiorem Dei Gloria) ou seja, para a maior Glória de Deus (lema dos Jesuítas)? É importante que se esclareça tudo! Só o ‘Público’ deu, no domingo, duas páginas ao assunto… Depois do Orçamento do Estado não vejo coisa com mais relevância.

O futebol nacional aí está de volta. Os suspeitos do costume tiveram resultados diversos: o Porto ganhou 1-0 ao Estoril, no Dragão, com um golo tardio (84 minutos) da sua nova estrela que veio da formação, André Silva (assinou contrato até 2021 com cláusula de rescisão de 60 milhões). O Sporting também por 1-0, mas no campo do Paços de Ferreira, com um golo de Adrien ao fechar a primeira parte (ambos os jogos no sábado). E o Benfica, ontem à noite, escorregou na Luz com o Setúbal, com um empate a uma bola. O Vitória marcou primeiro e os campeões nacionais empataram de penalti já perto do fim. O Braga, que já é o quarto grande só joga hoje contra o Rio Ave e pode apanhar Porto e Sporting na frente. Pode ler tudo isto e muito mais na Tribuna Expresso, um site diferente de desporto que o Expresso e a SIC agora disponibilizam.

FRASES

“Todos os dias me arrependo da geringonça”, Catarina Martinslíder do Bloco de Esquerda, numa entrevista ontem ao ‘Público’ (a frase é mais bombástica do que o conteúdo da entrevista).

“Clinton não é uma candidata popular nos Democratas. Tem uma série de aspetos pessoais negativos. Muitas notícias se poderiam fazer acerca dela. Mas tudo foi engolido pelo candidato buraco negro que é Donald Trump”, Rick Tyler, Republicano e adjunto do Governador do Texas, Ted Cruz, ex-rival de Trump na nomeação doGrand Old Party (Republicanos).

“O tradicional sistema bipartidário está a desintegrar-se através da Europa, mas é o centro-esquerda, e não o centro-direita, que tem sofrido os maiores abanões e mais razões tem para estar ansioso sobre o futuro”. Tony Barber, num texto sobre o populismo político, publicado no ‘Financial Times’

“A imunidade diplomática cobre a liberdade de circulação das pessoas. Portugal não pode determinar qualquer limitação ao raio de circulação do embaixador ou das pessoas das suas relações ou da sua missão que gozem também da imunidade”, Augusto Santos Silva no ‘Público’ a propósito da alegada agressão dos filhos do embaixador do Iraque a um jovem português, em Ponte de Sor.

"“Dos Santos amigo, o povo está contigo”, “Dos Santos amigo, o povo está contigo”. Quem diria. Tão antiga, mas tão atual e arrepiante". Manchete do 'Jornal de Angola', sem recordar que Dos Santosestá no poder desde 1979, ou seja há 37 anos e foi reeleito para mais um mandato no partido do poder, o MPLA, com a sensacional marca de 99,6%,

O QUE EU ANDO A LER

Raimundo Lúlio é um nome que pouca gente conhecerá. Ramon Llull, seu verdadeiro nome, menos ainda. Podemos, pois, perguntar-nos como foi Luísa Costa Gomes lembrar-se de tal personagem histórica para um romance que é uma espécie de biografia em que os espaços desconhecidos se preenchem (bem, hábil, elegantemente) com a imaginação da autora? Não faço ideia, nem isso será o mais importante. ‘Vida de Ramon’ foi escrito originariamente em 1991 e agora reescrito e revisto e aumentado em 2016 numa edição D. Quixote.

Mas afinal quem é este Ramon? É um filósofo medieval, ligado aos franciscanos, que defende que não tem de haver contradição entre razão e fé ou entre filosofia e teologia. Terá nascido em 1232 ou em 1235 na cidade que se chama hoje Palma de Maiorca (Baleares), centro de disputas entre muçulmanos, judeus e cristãos. No seu tempo ainda a cruzada contra os Cátaros (albigenses) estava a terminar com o cerco de Monségur, ainda o reino de Aragão, de que as Baleares passam a fazer parte, era independente de Castela, tendo Ramon convivido com todos. Quando se converte definitivamente ao cristianismo em 1263, publica 10 anos depois ‘O livro dos gentios e dos três sábios’, dedicando-se a tentar converter muçulmanos. Conhecido por ‘árabe cristão’ ou ainda por ‘doutor inspirado’ ou ‘doutor iluminado’ é das figuras mais enigmáticas e maravilhosas da Idade Média no que toca ao pensamento e à forma de escrita (é o primeiro a usar uma língua neolatina, a que é hoje o catalão, nos seus textos, cerca de 280, segundo Umberto Eco, alguns também escritos em árabe). O opúsculo ‘Vida Coetânea’ é praticamente a fonte original da sua vida. Sendo de autor anónimo é publicado como apêndice desta edição de 2016 de Luísa Costa Gomes, que assim presta um verdadeiro serviço à cultura e ao entendimento da nossa ancestralidade.

E, por hoje, é tudo. Despeço-me com amizade, como há 50 anos terminava os seus programas o engº Sousa Veloso, figura mítica da TV Rural, na RTP, e recordo-vos que às 18 horas tendes o Expresso Diário e pela fresca de amanhã novo Expresso Curto.

Boa semana de trabalho, ou de férias para os assisados que ainda as gozam ou começam agora a gozá-las.

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