Afonso
Camões* | Jornal de Notícias | opinião
Não
fora o Papa, o Benfica ou o Salvador, a maré-cheia dos noticiários estaria,
desde sexta-feira, no ataque informático de grandes dimensões que atingiu
sobretudo empresas de telecomunicações e energia, mas também a Banca e, no caso
britânico, os hospitais do serviço nacional de saúde. "Um ciberataque sem
precedentes", diz a Europol, o gabinete europeu de polícias de
investigação. Foram mais de 40 mil incidentes em 74 países, Portugal incluído.
Nalguns casos, os piratas reclamam resgate em troca de informações sequestradas
nos computadores violados. Confirma-se a profecia do antigo diretor de
segurança norte-americano, James Clapper que, há um ano, alertava que os
ataques cibernéticos são ameaça maior do que o terrorismo jiadista.
Lembram-se
de a Internet nos sorrir como um espaço de liberdade? Ali não existiam estados,
nem fronteiras, nem ideologias, nem poder. Havia apenas pessoas livres,
navegando e comunicando entre si. Esse sonho libertário, imaginado por jovens
de jeans e sapatilhas, é cada vez mais uma utopia irrealizável. Em mãos
criminosas, a Internet é também arma de crime. E converteu-se hoje num espaço
de competição geopolítica que os estados aspiram a controlar. Ou a evitar que
outros controlem.
O
mapa-mundo da pirataria digital é arrepiante. Os ataques, ou invasões, na forma
de vírus ou cavalos de Troia, podem roubar códigos de acesso a contas bancárias
ou alterar e destruir redes elétricas, sistemas de abastecimento de água,
centrais nucleares. Ou seja, podem afetar severamente a vida dos cidadãos e o
normal funcionamento das economias.
As
maiores e mais ricas empresas do Mundo são desse universo de inteligência
eletrónica. Nenhuma delas é europeia. Fora do alcance dos nossos olhares há
também uma geração de armas digitais, com enorme poder de destruição. E nesse
jogo perigoso, China, Rússia, Israel e Estados Unidos vão à frente. Assim como
a pólvora ou a máquina a vapor redistribuíram o poder entre os estados, estamos
perante uma nova revolução. E, nesta, só sobrevive em liberdade quem dominar a
tecnologia digital. A Europa poderia disputar e ganhar o jogo, tem os recursos
para isso. Mas antes deveria tomar consciência de que o seu futuro se joga aí:
generalizar as redes, aperfeiçoar o mercado interno digital, mais wi-fi e sem
roaming, e, sobretudo, fomentar e reter a inovação, para que os nossos jovens
talentos não tenham de emigrar para as Silicon Valley deste Mundo, em busca de
capital e oportunidades.
*
Diretor
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