sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Moçambique | SOMOS UM POVO GENEROSO OU ESTÚPIDO?


@Verdade | Editorial

A cada dia que passa fica evidente que os dirigentes e gestores deste país o único sentido de economia que têm é o de esbanjamento desenfreado dos bens públicos. Não é preciso ser um especialista em economia para prever o abismo em que o povo moçambicano tem sido forçosamente empurrado nos últimos tempos. Basta apenas ter o conhecimento semelhante à de milhares de moçambicanos, sobretudo as donas de casa cujo único sentido de economia que conhecem é o de gerir durante um mês 10 quilos de farinha de milho, cinco litros de óleo vegetal e uma lâmina de carapau congelado com um agregado familiar-tipo em Moçambique com pelo menos cinco pessoas.

Isto vem a proposito de inúmeras situações anormais que temos vindo assistir, não obstante a crise financeira sem precendentes que tem fustigado os bolsos dos moçambicanos. Esta semana, os moçambicanos voltaram a ser surpreendidos com a notícia do aumento dos preços de combustíveis, sofucando mais a população. Como se isso no bastasse, o Governo da Frelimo gastou 560 milhões de meticais na aquisição de aeronave executiva Bombardier, modelo Challenger 850, para para o uso específico do Presidente da República, embora o ministro dos Transportes e Comunicações tenha desmentido essa possibilidade.

Os moçambicanos tem assistido o seu poder de compra a cair de forma drástica quase todos os dias. Além disso, a população debate-se com problemas de falta de transportes, unidades sanitárias, escolas e vias de acesso para o seu bem-estar e o desenvolvimento do país. Porém, o Governo continua em investir em coisas que não traz nenhum benefício para a população, como é o caso da aerona executiva que provocou um rombo nos cofres do Fundo de Desenvolvimento dos Transportes (FTC), instituição subordinado ao Ministério dos Transportes e Comunicações.

Diante de toda essa realidade, incluindo a isenção fiscais de três decadas que se pretende dar a ENI e ANADARKO, deixa qualquer indivíduo atónito e com uma dúvida: ou somos um povo rico, ou um povo generoso, ou um povo rico e generoso. Porque só mesmo um povo rico e generoso dá-se ao luxo de aceitar todas essas situações anormais que postergam o seu desenvolvimento. O mais impressionante é que esta situação verifica-se num país onde pouco mais da metade da população encontra-se numa situação de pobreza extrema.

MOÇAMBIQUE | Governo de Nyusi quer dar 30 anos de isenções fiscais a ENI e ANADARKO


O Governo de Filipe Nyusi aguarda que a Assembleia da República chancele a mudança que fez em Maio último na Lei sobre o Regime Específico de Tributação e Benefícios Fiscais das Operações Petrolíferas para responder à demanda da ENI e da ANARDARKO de obterem três décadas de isenções fiscais nas explorações de gás natural que vão efectuar no Norte de Moçambique. O @Verdade solicitou a relação de todos incentivos fiscais concedidos a estas duas multinacionais mas a Autoridade Tributária respondeu que “é informação classificada”.

Enquanto a Autoridade Tributária aperta o cerco aos pequenos e médios empresários que se esforçam para sobreviver a crise que foi criada e tem sido agravada pelos sucessivos governos do partido o Executivo de Filipe Nyusi continua a distribuir benefícios fiscais pelos chamados grandes investidores que vêm a Moçambique explorar os nossos recursos naturais empregando pouco moçambicanos.

O @Verdade apurou que as ansiadas decisões finais de investimento da ENI, que aconteceu em Junho passado, e da Anadarko, que se aguarda no próximo ano, só acontecem porque o Governo aceitou, para além de isentar ambos investidores do pagamento do Imposto sobre o Valor Acrescentado(IVA) e outras taxas fiscais que não revela pretende manter esses benefícios durantes os 30 anos que vão durar as concessões iniciais.

Para o efeito o @Verdade apurou que o Executivo de Nyusi aprovou a 30 de Maio último, na 18ª sessão ordinária do Conselho de Ministros, a revisão da Lei nº27/2014 que estabelece o Regime Específico de Tributação e de Benefícios Fiscais das Operações Petrolíferas, particularmente o seu artigo 40 que é relativo a “Estabilização”.

Actualmente o artigo em questão possibilita uma negociação de uma “estabilidade de dez anos, a contar da aprovação de um plano de desenvolvimento”. Mas, o @Verdade sabe que por imposição dos investidores, o artigo foi alterado para que a estabilidade só comece a contar no início da produção comercial e não prevê qualquer tipo de negociação basta que a multinacional invista 100 milhões de dólares norte-americanos.

A proposta aprovada pelo Governo e que está no Parlamento para ser aprovada prevê no número 1 “É concedida a estabilidade fiscal, relativamente a incidência, taxas e benefícios fiscais previstos no presente regime fiscal, ao titular do direito de exercício de operações petrolíferas, a partir da atribuição do direito e até 10 anos a contar do início da produção comercial, sem afectar os pressupostos de viabilidade e de rentabilidade do projecto.”

“2. A estabilidade a que se refere o número anterior torna-se efectiva mediante o investimento comprovado do montante equivalente a USD 100.000.000,00 (cem milhões de dólares norte-americanos)” e o número 3 estabelece que “O período de estabilidade fiscal previsto no número 1 do presente artigo pode ser estendido até ao termo da concessão inicial, mediante o pagamento de 2% adicionais à taxa do Imposto sobre a Produção, a partir do décimo primeiro ano de produção.”

CULTURA INDÍGENA NO MPLA!





(Crónica ligeira do momento que passa)

Martinho Júnior | Luanda 

Tem uns que agitam as águas à superfície e são bons, mas há dúvidas que não sejam assimilados que têm tanto a ver com passado!

Tem outros que mergulham às profundezas e agitam as águas que são correntes de profundidade, ainda podem ser ou não assimilados, talvez estejam em mutação, provavelmente podem ser do presente!

Tem finalmente outros que se batem pelas grandes nascentes e esses são, filosoficamente e em relação ao futuro, os indígenas!

Martinho Júnior - Luanda, 17 de Novembro de 2917

Clinton, Assange e a guerra à verdade



John Pilger

Em 16 de Outubro a Australian Broadcasting Corporation (ABC) divulgou uma entrevista com Hillary Clinton: uma das muitas destinadas a promover o seu livro-de-ajuste-de-contas sobre o porquê de não ter sido eleita Presidente dos EUA.

Folhear o livro da Clinton, What Happened (O que aconteceu), é uma experiência desagradável, como uma dor de barriga. Calúnias e lágrimas. Ameaças e inimigos. "Eles" (os eleitores) foram objecto de uma lavagem ao cérebro e foram arrebanhados contra ela pelo odioso Donald Trump com a cumplicidade de eslavos sinistros enviados da grande treva conhecida como Rússia, apoiados por um "niilista" australiano, Julian Assange.

Em The New York Times foi publicada uma notável fotografia de uma jornalista a consolar Clinton, que acabara de entrevistar. A líder perdedora era, acima de tudo, "absolutamente feminista". Os milhares de vidas de mulheres que esta "feminista" destruiu quando no governo – Líbia, Síria, Honduras – eram irrelevantes.

Na revista New York, Rebecca Traister escreveu que Clinton finalmente exprimia "alguma legítima indignação". Até lhe era difícil sorrir: "tão difícil que os músculos da cara lhe doíam". Certamente, concluía, "se atribuíssemos aos ressentimentos das mulheres o mesmo destaque que concedemos aos rancores dos homens, a América seria forçada considerar que todas estas mulheres iradas poderão ter algo a dizer".

Patacoadas deste tipo, trivializando a luta das mulheres, vêm marcando as hagiografias mediáticas de Hillary Clinton. O seu extremismo político e o seu belicismo não têm importância. O seu problema, escreveu Traisler, foi "as pessoas terem-se fixado em seu prejuízo nas histórias dos correios electrónicos". Ou seja, terem-se fixado na verdade.

Os emails divulgados do director de campanha de Clinton, John Podesta, revelaram uma ligação directa entre Clinton e o apoio e financiamento do jihadismo organizado e do Estado Islâmico (ISIS). A fonte principal do terrorismo islâmico, a Arábia Saudita, desempenhou um papel central na sua carreira.

Boaventura: o risco da desimaginação social



Em tempos de crise, capital flerta com hiper individualismo. Segundo sua lógica, competição é o máximo; cabe à cultura, e à religião, aceitar a guerra de todos contra todos

Boaventura de Sousa Santos | Outras Palavras

O social é o conjunto de dimensões da vida coletiva que não podem ser reduzidas à existência e experiência particular dos indivíduos que compõem uma dada sociedade. Esta definição não é neutra. Define o social pela negativa, o que permite atribuir-lhe uma infinidade de atributos que variam de época para época. É, por outro lado, uma definição eurocêntrica porque pressupõe uma distinção categorial entre o social e o indivíduo, uma distinção que, longe de ser universal ou imemorial, é específica da filosofia e da cultura ocidentais, e nestas só se tornou dominante com o racionalismo, o individualismo e o antropocentrismo renascentista do século XV, os quais viriam a ter em Descartes o seu mais brilhante teorizador. Tanto é assim que a máxima expressão desta filosofia–cogito ergo sum, “penso logo existo”– não tem tradução adequada em muitas línguas e culturas não eurocêntricas. Para muitas destas culturas, a existência de um ser individual é não só problemática como absurda. É o caso das filosofias da África austral e do seu conceito fundamental de Ubuntu, que se pode traduzir por “eu sou porque tu és”, ou seja, eu não existo senão na minha relação com outros. Os africanos não precisaram esperar por Heidegger para conceber o ser como ser-com (Mitsein).

Muito esquematicamente, podemos distinguir na cultura eurocêntrica que serviu de base ao capitalismo moderno dois entendimentos extremos do social. De um lado, o entendimento reacionário, que confere total primazia ao indivíduo e o concebe como um ser ameaçado pelo social. Segundo tal lógica, os indivíduos, longe de serem iguais, são naturalmente diferentes e essas diferenças determinam hierarquias que o social deve respeitar e ratificar. Entre essas diferenças, duas são fundamentais: as diferenças de raça e as diferenças de sexo. No outro extremo está o entendimento solidarista, que confere primazia ao social e que o concebe como o conjunto de regras de sociabilidade que neutralizam as desigualdades entre os indivíduos. Entre estes dois extremos foram muitos os entendimentos intermédios, nomeadamente os entendimentos liberais (no plural), que viram no social o garante da igualdade dos indivíduos como ponto de partida, e os entendimentos socialistas (também no plural), que viram no social o garante da igualdade dos indivíduos como ponto de chegada.

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