domingo, 10 de dezembro de 2017

A FRENTE NEGRA BRASILEIRA



Carlos Roberto Saraiva da Costa Leite* | Porto Alegre | Brasil 

Há 86 anos, em 16 de setembro de 1931, na cidade de São Paulo, foi criada a Frente Negra Brasileira (FNB). Durante a primeira metade do século 20, a FNB foi a mais destacada entidade negra no Brasil, Com um programa preestabelecido de luta,  visava conquistar posições para o negro em todos os setores da sociedade brasileira.

A entidade se expandiu como grupos homônimos em vários estados, a exemplo do Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo Pernambuco, Rio Grande do Sul e Bahia. Arregimentando milhares de afrodescendentes, esta se converteu num verdadeiro movimento de massa, chegando a atingir o número expressivo de 20 mil sócios.  A FNB  proporcionou à população afrodescendente - excluída e marginalizada - não apenas assistência social, mas  meios  de enfrentar e combater o preconceito.

A Frente Negra Brasileira (FNB) desenvolveu um significativo trabalho socioeducativo e cultural: escola, grupo musical e teatral, time de futebol, departamento jurídico e, na área da saúde, prestou atendimento médico e odontológico. Havia também cursos de formação política, de artes e ofícios, além de ter sido responsável pela publicação do periódico “A Voz da Raça” (1933-1937).

Na época, vicejavam as teses do racismo científico (Eugenia), apregoando a ideia de que negros e mulatos constituiam uma raça “degenerada” e, portanto, estavam predestinados ao desaparecimento. Entre os adeptos dessa concepção de raça estavam Nina Rodrigues (1862-1906) e Monteiro Lobato (1882-1948). Essas teses resultaram em políticas públicas, que incentivaram à imigração europeia, indo ao encontro da ideia de embranquecimento.  

Quanto às mulheres negras, de acordo com um dos fundadores da FNB, o ativista Francisco Lucrécio, estas “eram mais assíduas na luta em favor do negro, de forma que na Frente [Negra] a maior parte eram mulheres. Era um contingente muito grande, eram elas que faziam todo movimento”. Ainda que outros estudos considerem a afirmação acima um tanto exagerada, torna-se importante registrar que as  afrodescendentes exerciam várias funções na FNB.  Na Cruzada Feminina, elas eram  mobilizadas, visando à realização de  trabalhos assistencialistas. Já as Rosas Negras se dedicavam a organizar bailes e festivais artísticos.

A FNB, em 1936, transformou-se num partido político, almejando participar de futuras eleições, a fim de arregimentar votos da “população de cor”. Sob a influência do contexto internacional de ascensão do nazifascismo, a entidade defendeu um programa político e ideológico com características de autoritarismo e ultranacionalismo. Naquele momento, sua principal liderança foi Arlindo Veiga dos Santos que exaltava publicamente o governo do italiano Benedito Mussolini (1883-1945), na Itália, e de Adolfo Hitler (1889-1945), na Alemanha. O próprio subtítulo do periódico “A Voz da Raça” era sintomático: “Deus, Pátria, Raça e Família”, sendo diferente do lema dos integralistas (movimento de extrema direita) apenas pela presença do termo “Raça”.

Neste período, A Frente Negra Brasileira (FNB) organizou uma milícia inspirada nos “boinas verdes” do fascismo italiano. Recebida numa audiência pelo, então, Presidente da República Getúlio Vargas (1882-1954), teve algumas de suas reivindicações atendidas, a exemplo do fim da proibição de ingresso de negros na Guarda Civil de São Paulo. O episódio é uma indicação do poder de barganha que o movimento negro, naquele momento, dispunha no cenário político.  

À época, o racismo se apresentava de forma exacerbada até em forma de anúncio em muitos periódicos: “Precisa-se de empregado, mas não queremos de cor”. A entidade também atuava por meio de alguns movimentos no interior, especialmente nos lugares em que os afrodescendentes não passeavam nos jardins, mas na calçada.

Segundo Abdias Nascimento (1914-2011), o fracionamento da FNB ocorreu devido à polarização política de suas lideranças: Arlindo Veiga dos Santos (1902-1978) liderava o Movimento Patrianovista de caráter nacionalista, monarquista conservador e tradicionalista, alinhando-se à Ação Integralista Brasileira; e José Correia Leite (1900-1989) que se filiava à corrente socialista. Abdias também declarou “Como movimento de massas, foi a mais importante organização que os negros lograram após a Abolição da Escravatura em 1888”.

Implantada a ditadura do “Estado Novo”, em 1937, por Getúlio Vargas, a Frente Negra Brasileira (FNB) e todas as outras organizações políticas foram extintas. O movimento negro, diante do novo modelo político, que se instalara no Brasil, foi diluído e enfraquecido.  O Movimento Negro havia escolhido, desde os anos 20, a figura ícone da Mãe-Preta, cujo monumento foi inaugurado, em São Paulo, somente em 1955,.como parte das comemorações do IV Centenário da Cidade de São Paulo.

O importante jornal O Exemplo (1892-1930), editado em Porto Alegre, por afrodescendentes, registrou a campanha, para que se inaugurasse um monumento alusivo à Mãe Preta.  Um dos principais objetivos da Frente Negra Brasileira era a defesa de uma “Segunda Abolição”, pois a primeira (1888) havia deixado um legado de exclusão social e pobreza, sem oferecer aos libertos a condição de exercerem de forma plena e integrada a sua condição de cidadãos.

Marcada de forma indelével pelo racismo, a vida dos afrodescendentes tem sido árdua nas lutas diárias por melhores condições socioeconômicas. Desmitificando a ideia, em nosso país, da “Democracia Racial”, as estatísticas do próprio IBGE ratificam o quanto se tornam necessárias políticas afirmativas, visando a atenuar os 400 anos de escravidão, cujo legado nefasto, da miséria e da exclusão social, faz-se sentir, até os dias hoje, por um número expressivo da população afrodescendente. A realidade estigmatizada da dicotomia entre a “Casa Grande e da Senzala”, infelizmente, não se esvaziou, nem com o passar dos séculos, desde o Brasil Colônia.

Importante registrar que, além da Frente Negra Brasileira, na década de 30, outras do gênero surgiram, buscando promover a integração do afrodescendente à sociedade de forma mais abrangente, como o Clube Negro de Cultura Social (1932) e a Frente Negra Socialista (1932), na cidade de São Paulo; a Sociedade Flor do Abacate, no Rio de Janeiro, a Legião Negra (1934), em Uberlândia/MG, e a Sociedade Henrique Dias (1937), em Salvador.

No Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, merece destaque a fundação da mais antiga do Brasil, ainda, em atividade: trata-se da Sociedade Beneficente e Cultural Floresta Aurora que foi criada, em 1872, por negros alforriados, um ano após de ter sido assinada a Lei do Ventre Livre (1871).

O caminho dos afrodescendentes tem sido pontuado por lutas, desafios, avanços e retrocessos, porém, diante da nossa condição de um povo miscigenado, não podemos recuar e nem desistirmos do ideal em construir um Brasil com mais justiça e com menos desigualdades sociais, fazendo, finalmente, jus ao verso de uma das estrofes do Hino Nacional “... Dos filhos deste solo és mãe gentil pátria amada Brasil “.
                                                           
* Pesquisador e coordenador do setor de imprensa do Musecom


Bibliografia
FERNANDES, Florestan. Significado do protesto Negro. São Paulo: Cortez, 1989.
LEITE, José Correia Leite. ... E disse o velho militante José Correia Leite. Organização e textos de Luiz Silva (Cuti). São Paulo: Secretaria Municipal de Cultura, 1992.
NONNENMACHER, Marisa Schneider. Tudo Começou em uma Madrugada/ Sociedade Beneficente Cultural Floresta Aurora (1872-2015). Porto Alegre: Medianiz, 2015.
PINTO, Regina Pahin. O movimento negro em São Paulo: luta e identidade. São Paulo, 1993.
SCHWARCZ, Lilia Moritz. O espetáculo das raças: cientistas, instituições e questão racial no Brasil –1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 1993.
SKIDMORE, Thomas E. Preto no Branco: raça e nacionalidade no pensamento brasileiro. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976.

BRASIL | Lula lidera corrida para 2018, e Bolsonaro consolida 2º lugar



Datafolha aponta que ex-presidente ganharia em todos cenários do segundo turno, mas liderança no primeiro passaria para ex-militar caso petista tenha candidatura barrada.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) aparece na liderança da corrida presidencial de 2018, segundo pesquisa do Instituto Datafolha divulgada neste sábado (02/12). O deputado Jair Bolsonaro (PSC), por sua vez, aparece isolado em segundo lugar em quase todos os cenários abordados pelo instituto, superando rivais de centro.

No primeiro cenário, que inclui Lula, Marina Silva (Rede), o governador Geraldo Alckmin (PSDB) e Ciro Gomes (PDT), o petista alcança 34% da preferência do eleitorado. Bolsonaro tem 17%. Marina aparece com 9%. Já Alckmin e Gomes têm 6%, cada. O ex-ministro do STF Joaquim Barbosa (sem partido) alcança 5%. O senador Alvaro Dias (Podemos) aparece com 3%. Manuela D'ávila (PCdoB) tem 1%, assim como o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles.

Os percentuais de Lula e Bolsonaro variam pouco em outros cenários. Com a opção de uma candidatura de Barbosa, mas sem Marina na disputa, Lula alcança 37%. Bolsonaro aparece com 18%. Alckmin e Gomes aparecem com 8% e 7%, respectivamente. Barbosa, por sua vez, tem 6% da preferência.

Ainda segundo o instituto, Lula ganharia o segundo turno em todos os cenários em que aparece como candidato. Em um confronto com Alckmin, ele ganharia de 52% a 30%. Contra Marina, 48% a 35%. Contra Bolsonaro, o resultado seria 51% a 33%.

Sem Lula, Bolsonaro lidera

No caso dos cenários sem Lula apresentados pelo instituto, a liderança passaria para Bolsonaro. No primeiro cenário, que também não conta com Marina, o ex-militar teria 21% das intenções de voto, seguido por Ciro Gomes, que aparece com 12%. Alckmin e Barbosa têm 11% e 8%, respectivamente.

Em outro cenário sem Lula, mas com a candidatura de Meirelles no páreo, Bolsonaro aparece com 22%. Gomes é o segundo colocado, com 13%, seguido por Alckmin, com 12%. Um possível substituto para Lula – que corre o risco de virar ficha suja nas próximas eleições por causa dos seus problemas com a Justiça –, o ex-prefeito paulistano Fernando Haddad, alcança apenas 3% nesse cenário.

Os números que apontam uma hipotética liderança de Bolsonaro no primeiro turno caso Lula não possa se candidatar são similares em outros cenários sem o petista e com outros candidatos, como Marina e João Dória (PSDB).

A pesquisa foi divulgada pelo jornal Folha de S. Paulo. O instituto conduziu  2.765 entrevistas entre 29 e 30 de novembro, em 192 cidades. A margem de erro é de dois pontos para mais ou menos.

JPS/ots | Deutsche Welle

Dois timorenses e um português detidos em Díli acusados de apoiar fuga de casal português





Díli, 09 dez (Lusa) - Dois timorenses e um português estão detidos em Díli acusados de "favorecimento pessoal" no âmbito de investigações policiais à fuga do casal de portugueses Tiago e Fong Fong Guerra, disseram à Lusa fontes judiciais.

Os três, que estão detidos desde a noite de sexta-feira na esquadra policial de Caicoli, em Díli e que devem ser apresentados a um juiz na próxima semana, são ainda acusados de "falsificação documental", explicaram as mesmas fontes.

Os três foram ouvidos na passada quinta-feira pela Polícia Científica de Investigação Criminal (PCIC) timorense no âmbito de uma investigação à fuga do casal de portugueses, que viajou de barco para a Austrália e, posteriormente, seguiu para Portugal.

Em causa está o artigo 290 do Código Penal timorense que pune com penas de até três anos de prisão ou multa quem "total ou parcialmente, impedir, frustrar ou iludir atividade probatória ou preventiva de autoridade competente, com intenção ou com consciência de evitar que outra pessoa que praticou um crime seja submetida a pena ou medida de segurança".

O crime adicional de falsificação documental é punido com pena de prisão até três anos.

Fontes ouvidas pela Lusa confirmam que os três homens fazem parte de uma lista extensa de pessoas, cidadãos timorenses e estrangeiros, incluindo vários portugueses, que as autoridades de Timor-Leste querem ouvir no âmbito da investigação à fuga.

Tiago e Fong Fong Guerra, que foram condenados a oito anos de prisão em Timor-Leste - o caso ainda não transitou em julgado e foi alvo de um recurso - fugiram para a Austrália, onde chegaram, de barco, a 09 de novembro. O casal chegou a Lisboa no dia 25 de novembro.

A fuga do casal causou tensão diplomática entre Portugal e Timor-Leste, com o assunto a suscitar críticas de dirigentes políticos e da sociedade civil, com artigos a exigir investigações à embaixada de Portugal em Díli.

O ministro dos Negócios Estrangeiros português, Augusto Santos Silva, garantiu que a embaixada em Díli respeitou a legislação portuguesa ao atribuir passaportes ao casal.

Na sequência da fuga para a Austrália, Augusto Santos Silva ordenou a realização de um inquérito urgente à Inspeção Geral Diplomática e Consular.

O casal Guerra renovou os respetivos cartões de cidadão no início deste ano, e mais recentemente foram emitidos passaportes portugueses.

Tiago e Fong Fong Guerra tinham sido condenados em agosto por um coletivo de juízes do Tribunal Distrital de Díli a oito anos de prisão efetiva e a uma indemnização de 859 mil dólares (719 mil euros) por peculato (uso fraudulento de dinheiros públicos).

Os portugueses recorreram da sentença, considerando que esta padecia "de nulidades insanáveis" mais comuns em "regimes não democráticos", baseando-se em "provas manipuladas e até proibidas".


ASP // DM | Fotos extraídas de reportagem de GMN TV.


Francisco Louçã. “Vamo-nos aproximando de um novo colapso financeiro”



Nuno Ramos Almeida | jornal i | entrevista

O crescimento das finanças sombras leva o mundo a repetir crises económicas e financeiras cada vez mais frequentes

Quando pensamos num poder sombra ou numa finança sombra, vêm-nos à ideia procedimentos esconsos feitos por criminosos a lavar dinheiro do crime. Na realidade, a finança e a economia sombra não são isso, são as operações financeiras que estão completamente fora do controlo dos Estados e das instituições internacionais. Essas transações estão no centro do sistema financeiro e estão intimamente ligadas aos vários poderes políticos. “Sombras” é o novo livro de Francisco Louçã e do economista americano Michael Ash sobre esta situação.

Em 1929, a solução que foi encontrada para a enorme crise foi uma solução keynesiana, que contrariava radicalmente as políticas económicas que vinham sendo seguidas. Durante a crise atual, começada em 2007, a solução que se encontrou foi a continuação das políticas anteriores. Qual a razão desta insistência?

Na verdade, a solução keynesiana dos anos 30 é mais moderada do que a lenda descreve, porque foi um chamado keynesianismo militar que acabou por dominar. Onde houve uma expansão keynesiana foi durante o segundo programa do New Deal do Roosevelt [Franklin Delano Roosevelt, que foi presidente dos EUA de 1933-1945 e adotou as políticas do chamado New Deal, um conjunto de programas para combater a Grande Depressão], com grau de investimento relativamente pequeno, mas que teve um efeito de recuperar o conjunto da economia e fazer uma rutura com a doutrina neoliberal, advogada pelo anterior presidente Herbert Hoover, que defendia a ideia de que o mercado resolveria a crise, quando acabou a ser o Estado que a resolveu. Na crise do subprime de 2007-2008, a primeira resposta foi uma resposta de expansão orçamental; foram nesse sentido as primeiras medidas tomadas pelo União Europeia, mas que tiveram uma inversão relativamente rápida.

Pobreza | ANDAM A ENGANAR OS PORTUGUESES - governo e média ocultam números reais



A POBREZA EM PORTUGAL É MUITO MAIOR QUE A DIVULGADA PELOS ÓRGÃOS DE INFORMAÇÃO E PELO GOVERNO

Eugénio Rosa*

Em 30 de Novembro de 2017, o INE divulgou uma publicação com o título “Rendimentos e condições de vida 2017: O risco da pobreza reduziu-se para 18,3%” e logo a agência Lusa, sem analisar a totalidade do documento do INE, repetiu a noticia que o “Risco de pobreza diminuiu para 18,3% em 2016”, o que foi repetido acriticamente pelos restantes media incluindo o Expresso on-line de 30.11.2017. O 1º ministro também fez declarações no mesmo sentido, congratulando-se com a diminuição da pobreza.

Mais importante que os 18,3% era explicar aos leitores como se chegou a essa percentagem, pois os números da pobreza podem ser reduzidos administrativamente. E foi isso que aconteceu como vamos mostrar neste estudo com dados do INE omitidos pelos media.

A TAXA DE POBREZA DE 18,3% DIVULGADA PELOS MEDIA NÃO TRADUZ A POBREZA REAL NO PAÍS

Comecemos por observar o quadros que consta da publicação divulgada pelo INE, cujos dados foram utilizados pelos órgãos de informação.


Se ficarmos por este quadro constante da publicação do INE concluímos que, em Portugal, antes do pagamento de pensões e de outras prestações social, a percentagem de portugueses na situação de pobreza era, em 2016, de 45,2% da população o que, tendo em conta a população total, correspondia a 4.659.997 portugueses. E que após o pagamento das pensões e de outras prestações sociais (daí a importância fundamental da Segurança Social e da CGA) esse número diminuía para 1.886.652 portugueses (18,3% da população total) na situação de pobreza o que não deixa de continuar a ser chocante. Mas mesmo este elevado numero não traduz a realidade como outros dados constantes da mesma publicação do INE revelam, dados esses que foram omitidos pela generalidade dos órgãos de informação o que representou, objetivamente, uma clara manipulação da opinião pública. Mas assim vai o jornalismo em Portugal.

O QUE OS MEDIA OCULTARAM SOBRE A POBREZA EM PORTUGAL

Para que se possa entender o caracter precário e insuficiente dos dados do quadro anterior é importante saber como é calculado o chamado “Limiar de risco de pobreza”. Ele corresponde a 60% do rendimento mediano, ou seja, do rendimento auferido pela maioria dos portugueses. Em 2016, o limiar da pobreza correspondia a 5.442€, o que dá 388,71€/mês, se dividirmos por 14. Aquele limiar da pobreza, sendo 60% do rendimento mediano, corresponde a um rendimento mediano de 12.040€/ano, ou seja, 860€/mês. Portanto, a evolução do limiar da pobreza aumenta ou diminui conforme aumenta ou diminui o rendimento mediano em Portugal. Se ele aumentar menos que os preços, a situação dos pobres agrava-se pois ficam com menos poder de compra, mas muitos deles, para efeitos estatísticos, deixam de ser considerados pobres embora estejam em situação pior. Foi isso que aconteceu em Portugal durante o governo do PSD/CDS e da “troika” em que se verificou uma queda dos rendimentos dos portugueses e, nomeadamente, dos rendimentos medianos que foram os mais atingidos pelo enorme aumento de impostos, por cortes nos salários, por aumentos nas remunerações inferiores aos aumentos de preços, pelo aumento brutal do desemprego, etc.

A POBREZA EM PORTUGAL É MUITO MAIOR QUE A DIVULGADA PELOS ÓRGÃOS DE INFORMAÇÃO SEGUNDO O PRÓPRIO INE

Existe na publicação divulgada pelo INE um outro quadro que a Lusa, o Expresso e outros órgãos de informação omitiram mas que é muito importante para compreender a dimensão atual e real da pobreza em Portugal. Esse quadro é o que a seguir se apresenta. Para que não haja dúvidas da sua veracidade copiamos (fizemos um copy/paste), da publicação do INE.


*Eugénio Rosa – Economista – este e outros estudos disponíveis em www.eugeniorosa.com

- Título PG

Portugal | O FISCO QUE APAGUE A LUZ



Pedro Ivo Carvalho | Jornal de Notícias | opinião

Não é fácil de entender - e muito menos de aceitar - quando colocamos a questão nestes termos: os portugueses estão a consumir menos energia, mas estão a pagar mais pela energia que consomem. O Estado forra os cofres, mas o país não descola do estádio de raquitismo energético, uma vez que os índices de conforto estão a anos-luz do desejável. A Comissão Europeia chama-lhe "penúria energética". De uma forma mais prosaica, significa que não temos poder aquisitivo suficiente para nos mantermos ligados e aquecidos. Ao frio, às escuras e sem dignidade nenhuma, portanto. Agora imaginem se não fôssemos um país ameno. Calma, porque nem isso nos vale: morre-se menos em resultado direto do frio na Suécia do que neste paraíso morno.

A diabolização da estratégia predadora dos fornecedores de energia (com a EDP à cabeça) tem um amplo terreno para lavrar, mas convém termos presente que são os impostos que fazem pender a balança para o patamar do ridículo. No trabalho que publicamos hoje, essa perversão traduz-se em números: por cada 10 euros que os contribuintes pagam de eletricidade, 5,2 euros vão direitinhos para a conta-corrente de Mário Centeno no Ministério das Finanças (a média comunitária está fixada nos 3,7 euros). Já por cada 10 euros de gasolina comprada, 6,2 euros correspondem a taxas e impostos; e só no gás é que a pancada é menos violenta: 27% da fatura encontra-se na carga fiscal. Tudo somado, Portugal é, de entre os países da Zona Euro, dos que cobram mais pela luz, pelo gás e pelos combustíveis. Não somos ricos, mas somos excêntricos.

Não é de admirar, por isso, que no mercado da eletricidade (de longe, o setor mais sensível) cerca de 20% dos agregados (mais de 800 mil pessoas) beneficiem da tarifa social de energia. Mas sendo essa proteção social da mais absoluta justiça - e necessidade -, estamos perante uma pescadinha de rabo na boca: por um lado, o Estado cria mecanismos que aliviem os encargos das famílias mais carenciadas; por outro, carrega nos impostos da esmagadora maioria, porque sabe que nenhum agregado pode viver sem luz nem aquecimento. E carregar é mesmo a palavra certa. Como bem assinala Pedro Silva, especialista da Deco, a taxa de IVA na conta da luz e do gás é igualzinha à aplicada, por exemplo, quando adquirimos uma joia ou compramos um refrigerante.

Volto ao princípio: consumimos menos, mas pagamos mais. Se não estivesse tão cara, até acendia a luz para ver se encontrava a lógica debaixo de alguma pedra.

*Subdiretor do JN

GULBENKIAN, FILANTROPIA E PETRÓLEO




Filantropia é um termo de origem grega que significa “amor à humanidade”. Diz-se que Gulbenkian foi um filantropo. Mas não se diz que criou uma corporação petrolífera bem-sucedida, ainda hoje detida na totalidade pela sua Fundação.

O termo “filantropia” foi criado por um imperador Romano, no ano de 363, pois achava que o “amor à humanidade” era a característica principal das suas atividades, como sinónimo de caridade.

A Fundação Calouste Gulbenkian, anunciada no Portal de Filantropia, apresenta-se como “criada por disposição testamentária de Calouste Sarkis Gulbenkian. Com um património de 3 mil milhões de euros, atua através de projetos próprios ou em parceria em áreas como a arte, a filantropia, a ciência e a educação distribuindo subsídios, bolsas e apoios. Tem delegações em Paris e em Londres, cidades onde Calouste Gulbenkian viveu. Em Lisboa, tem o Museu Calouste Gulbenkian, o Centro de Arte Moderna, uma biblioteca de arte, orquestra e coro como principais polos de irradiação da sua atividade cultural.” O site refere ainda que “Calouste Sarkis Gulbenkian era um generoso filantropo (…) no seu testamento (1953) deixou bem expresso o seu carácter de filantropo ao legar boa parte da sua fortuna à fundação que quis instituir.” 1

O amor à humanidade não é filantropia. Podemos ver por quem criou o termo. E também pelo exemplo de filantropia distribuído por Gulbenkian e o seu legado. A Partex Oil and Gas talvez terá sido uma das razões pela qual Gulbenkian enveredou pela filantropia. Mas o que tem Gulbenkian a ver com uma petrolífera?

Retiramos este excerto do site da Corporação: “A Fundação Calouste Gulbenkian é uma instituição privada portuguesa de utilidade pública. Os seus fins estatutários estão no campo das artes, caridade, educação e ciência. Criada pelas premissas estabelecidas numa cláusula do testamento de Calouste Sarkis Gulbenkian, os estatutos da Fundação foram aprovados em 1956.  Os seus principais ativos eram a coleção de arte de Calouste Gulbenkian e os seus interesses internacionais no petróleo, principalmente a participação de 5% na Iraq Petroleum Company (…) A Fundação detem 100% da Partex Oil and Gas Group Companies”.

CUBA DA CIVILIZAÇÃO E OS ESTADOS UNIDOS DA BARBÁRIE



Martinho Júnior | Luanda

1- Cerrou o pano dos debates que leva Cuba à Assembleia Geral da ONU anualmente, com uma estrondosa votação de condenação ao bloqueio por parte dos Estados Unidos à maior ilha das Caraíbas.

Os Estados Unidos ficaram isolados uma vez mais, pois a seu favor apenas se registram dois votos: os seus próprios e os do apêndice irredutível que é Israel, como se fossem duas ilhas despóticas, expoentes duma afronta que é um crime contra a humanidade e a mais longa das práticas conspirativas levadas a cabo pela aristocracia financeira mundial!

O chanceler cubano Bruno Rodriguez, veio confirmar face à barbárie do bloqueio que “el pueblo cubano no renunciará jamás a construir una Nación soberana, independiente, socialista, democrática, próspera y sostenible”!...

Bruno Rodriguez não se limitou contudo ao compasso das últimas cinco décadas e meia em relação ao assunto: “no han sido 55 años, señora Embajadora, se equivoca en su primera frase, han sido 26 de estas sesiones y más de un siglo del origen de los hechos que hoy se discuten.

Ella miente, usa el mismo estilo que prevalece hoy en la política estadounidense. Todo empezó antes de que existiera, incluso, la Nación cubana. Cuando el pueblo cubano por vez primera se alza en armas en 1868, ya se habían desatado los apetitos anexionistas y de dominación de lo que era y es hoy el imperialismo estadounidense.

En 1898, usando un pretexto —como caracteriza a la historia moderna de los Estados Unidos—: la voladura del buque Maine en puerto cubano, entraron como aliados de las fuerzas independentistas cubanas y ocuparon el país después como invasores, impusieron la Enmienda Platt, cercenaron la independencia y la soberanía de Cuba; tres ocupaciones militares realizaron, impusieron 60 años de dominio absoluto que terminó el Primero de Enero de 1959 con la entrada del Ejército Rebelde en La Habana y el triunfo de la Revolución Cubana, que hasta hoy libra las mismas luchas que inspiraron a nuestro pueblo hace más de 100 años”…

Dos “projectos” de expansão e ocupação “ultramarina” (Havai, Filipinas, Guam, Porto Rico e Cuba), a ilha rebelde seria o único“fruto que não caiu” e face à persistente barbárie ergueu a civilização socialista, farol, exemplo e vanguarda para toda a humanidade!

2- Para onde caminhou afinal Cuba revolucionária, socialista, independente e soberana?

Para onde se dirigiram os Estados Unidos desde a saga de sua expansão de leste para oeste na transversal Atlântico-Pacífico do continente?

Enquanto Cuba mobilizou em estreita identidade para com sua própria história, por via da educação e da saúde, todo o seu povo, mutiplicando as potencialidades da solidariedade e do inbternacionalismo, inclusive mesmo quando sujeita ao “período especial”…

Os Estados Unidos mutiplicaram-se na sua arrogância, transformando a expansão em imperialismo, consubstanciado hoje numa hegemonía que, com base num dólar que não passa duma arquitectura-moeda de expoliação e saque, sustentar mais de 800 bases militares espalhadas pelo mundo, provocando desequilíbrios, tensões, conflitos, guerras, caos, terrorismo, desagregação e miséria, conforme as consequências directas e indirectas de sua actuação, como jamais tivessem renunciado a considerar e tratar os outros como o que fizeram em relação às quase desaparecidas nações autóctones, que pela força e pelo genocidio foram despojadas e reduzidas a peças anacrónicas, em cerrada sobrevivência nas reservas de museu!

Ante nossos olhos, na Assembleia Geral da ONU e a propósito do bloqueio, desfilam todos os anos duas concepções contraditórias, que são um autêntico balanço para toda a humanidade e por isso, fonte de esperança para os espoliados da Terra: 191 esprimiram-se este ano pela civilização, face a 2 ilhas isoladas e anacrónicas por uma barbárie que continua a ser um crime persistente contra a humanidade!

Martinho Júnior - Luanda, 4 de Novembro de 2017

Ilustrações:
Manifestação a favor do fim do bloqueio a Cuba nos estados Unidos;
Painel que traduz a votação contra o bloqueio dos Estados Unidos a Cuba, neste ano de 2017.

A consultar de Martinho Júnior:
Série “Uma fruta que não caiu” (de I a IX), no Página Global (2014 e 2015) – http://paginaglobal.blogspot.com
BLOQUEIO A CUBA, A MAIS LONGA PRÁTICA DE CONSPIRAÇÃO – http://paginaglobal.blogspot.pt/2017/10/bloqueio-cuba-mais-longa-pratica-de.html

A consultar:

JERUSALÉM: A CIDADE QUE EXISTE DUAS VEZES



Em rigor, o mal começou bastante antes do actual Presidente norte-americano. Os EUA estão sem estratégia para o Médio Oriente há bastante tempo.

Tiago Moreira de Sá* | Público | opinião

No magnífico livro Jerusalém: a biografia Simon Sebag Montefiore escreve a certa altura: "Jerusalém é a casa do Deus único, a capital de dois povos, o templo de três religiões e ela é a única cidade a existir duas vezes — no céu e na terra: a graça sem igual do terrestre é praticamente nada para as glórias do celestial ". E, mais à frente, conclui: "sempre houve duas Jerusalém, a temporal e a celestial, ambas governadas mais por fé e emoção do que por razão e factos."

Donald Trump decidiu mudar a embaixada dos Estados Unidos para Jerusalém. Para uns trata-se apenas do cumprimento de uma promessa eleitoral, para outros de mais uma das suas loucuras. A segunda versão parece mais plausível. Mas a grande questão é a de saber se há um “método na loucura”, uma racionalidade no 45.º Presidente americano, neste assunto como em vários outros.

Há aqui duas dimensões distintas: uma interna e outra externa. Na perspectiva da primeira podemos entender a decisão pois ela é popular no essencial da base de apoio de Trump e Israel goza hoje de um amplo apoio nos EUA. Muitos norte-americanos projectam-se na história dos judeus, crendo que ambos partiram para longe, passando por todo o tipo de provações e adversidades, à procura da terra prometida, para criar o céu na terra. Além disso, os horrores do holocausto e o facto de os judeus terem criado a única democracia numa terra de tiranos, em muitos casos sanguinários que não hesitam em matar o seu próprio povo, toca fundo no coração da América.

Já do ponto de vista externo é praticamente impossível perceber a racionalidade de Trump uma vez que se trata de uma decisão má para a região, para os Estados Unidos, para os seus aliados árabes do Médio Oriente (Jordânia, Arábia Saudita, Egipto, etc.) e, sobretudo, para Israel, que será o grande alvo de todas as retaliações.

OS MEUS MENINOS DE GAZA




João Carlos Lopes Pereira [*]

Os meus meninos de Gaza não existem. 

Não existem. 
Não existem. 

Não têm sangue, nem pernas, 
nem carrinhos de bebé. 
nem olhos, riso ou sandálias. Nem orelhas. 
Nem brinquedos. Nem calções, 
nem jardins, nem casas onde dormir, 
nem pais, avós ou irmãos. 
Nem chão, nem água, nem flores, 
nem língua, lábios, nariz, mamilos, berço ou lençóis. 
Nem têm lápis de cor. Nem manhãs. Nem amanhãs. 
Como não tiveram ontens. 
Não têm coisa nenhuma porque, afinal, não existem. 

Os meus meninos de Gaza 
já foram solucionados pelos homens do Sião. 
E nem foi preciso gás. Nem fornos de cremação. 


[*] Jornalista. 

Este poema encontra-se em http://resistir.info/ 


NA ONU, A INCAPACIDADE USA DE ADMITIR A REALIDADE



QUATRO VETOS SUCESSIVOS SOBRE A MENTIRA DE KHAN SHEIKHUN

Thierry Meyssan*

Enquanto os Presidentes Putin e Trump avançam na questão síria, os altos- funcionários de origem USA na ONU encetaram um braço de ferro com a Rússia. Recusando investigar um crime sobre o qual já tomaram posição a priori, provocaram não um, mas quatro vetos no Conselho de Segurança. Para Thierry Meyssan, o comportamento esquizofrénico dos Estados Unidos na cena internacional atesta, ao mesmo tempo, a divisão da Administração Trump e o declínio do imperialismo dos EUA.

Decididamente poucas coisas mudaram desde o 11 de Setembro de 2001. Os Estados Unidos persistem em manipular a opinião pública internacional e os meios das Nações Unidas, por razões diferentes é claro, mas sempre com o mesmo desprezo pela verdade.

Em 2001, os representantes dos Estados Unidos e do Reino Unido, John Negroponte e Stewart Eldon, asseguravam que os seus dois países acabavam de atacar o Afeganistão em legítima defesa após os atentados cometidos em Nova Iorque e Washington [1]. O Secretário de Estado, Colin Powell, prometia distribuir no Conselho de Segurança um dossiê completo apresentando as provas da responsabilidade afegã. Continuamos à espera, 16 anos mais tarde, por esse documento.

Em 2003, o mesmo Colin Powell vinha explicar ao Conselho de Segurança, aquando de uma intervenção difundida pelas televisões do mundo inteiro, que o Iraque estava igualmente implicado nos atentados de 11-de-Setembro e que preparava uma nova agressão contra os Estados Unidos, por meio de armas de destruição maciça [2]. No entanto, assim que deixou as suas funções no seio do governo dos EUA, o General Powell admitia, num canal de televisão do seu país, que as muitas acusações do seu discurso eram todas falsas [3]. Continuamos à espera, 14 anos depois deste discurso, do pedido de desculpas dos Estados Unidos perante o Conselho de Segurança.

COMO EXPLODIR O MÉDIO ORIENTE



Ao “reconhecer” Jerusalém, Trump atende sua base sionista e evangélica. Mas seu objetivo geopolítico enlouquecido é uma aliança com Israel e Arábia Saudita, para esmagar o Irã

Phyllis Bennis, no Alternet | Outras Palavras | Tradução: Mauro Lopes

O plano de Trump para reconhecer Jerusalém como a capital de Israel e no futuro transferir embaixada dos EUA de Tel Aviv para Jerusalém não vai prejudicar os esforços de paz – porque na verdade não há esforços de paz em andamento. Os protestos já começaram, e a raiva está aumentando não apenas entre os palestinos, mas em todo o mundo árabe e muçulmano, entre vários governos, incluindo aliados chave dos EUA, e entre pessoas em todo o mundo.

Para compreender o que representa este movimento é preciso enxergá-lo a partir de duas perspectivas diferentes.

A primeira delas: reconhecer Jerusalém como a capital de Israel reflete a necessidade de Trump aplacar tanto seus principais doadores que dão sustentação a Israel nos EUA, em particular o magnata dos cassinos Sheldon Adelson, como o componente cristão-sionista de sua base evangélica de direita. Os partidários de Israel no Congresso orquestraram uma lei em 1995, determinando a mudança da embaixada, mas dando ao mesmo tempo uma saída ao presidente – que poderia postergar a decisão alegando risco à segurança nacional. Todos os presidentes desde então aproveitaram a brecha, incluindo Donald Trump há seis meses. Os parlamentares pró-Israel podiam culpar o presidente, a Casa Branca podia lamentar que ameaças à segurança dos EUA impediam a mudança… todos ficavam felizes.

Mas o compromisso da campanha de Trump para a mudança da embaixada é mais importante para seus apoiadores mais influentes do que era para os presidentes anteriores. Além disso, as seguidas derrotas de Trump no Congresso incentivaram-no a cumprir sua promessa sobre Jerusalém. Trump chamou esse movimento de “reconhecimento da realidade”.

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