sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

Portugal | O AR QUE SE RESPIRA


Manuel Barbosa* | Jornal de Notícias | opinião

1 Há os que olham para o copo e o veem meio cheio. E há os que o veem meio vazio. Qualquer dos pontos de vista é defensável. Veja-se o caso da Operação Lex, o mais recente escândalo judicial a abalar a nação. Há quem valorize o facto de a Justiça mostrar que ninguém, nem os mais poderosos, está acima da lei, cortando a direito, mesmo quando entre os alvos se encontram os seus (dois juízes, neste caso). Como há, por outro lado, quem destaque o facto de a Justiça se estar a transformar num espetáculo mediático, promovendo condenações na praça pública, ainda antes de o suspeito perceber sequer do que é acusado. Com o devido respeito por outros pontos de vista, e apesar da natural preocupação com as distorções provocadas pela segunda premissa, parece-me claro que é a primeira que deve prevalecer. Não vivemos num mundo perfeito, a Justiça é executada por homens e mulheres, onde também habitam pecados como a soberba, a incompetência ou a cobiça (nem os juízes estão a salvo). É certo que não sabemos como vai acabar a Operação Lex (e, já agora, como vai acabar a investigação um pouco mais esdrúxula aos bilhetes para a bola do ministro Mário Centeno). Não sabemos se resultará numa acusação e, ainda menos, numa condenação, seja dos corruptores, dos corrompidos ou de ambos. Mas também é certo que não se pode exigir à Justiça que investigue e acuse apenas aqueles que tem a certeza de conseguir condenar. Como é certo que, com mais ou menos atropelos, se fica quase sempre com a sensação de que o ar fica um pouco mais respirável.

2 Os números não mentem, mas, tal como no copo de água, podem encher-nos ou esvaziar-nos o entusiasmo. Veja-se o caso do emprego. Os dados mais recentes apontam para uma taxa de desemprego de 7,8% (há 14 anos que não era tão baixa). E dizem mais: nos dois primeiros anos da atual legislatura, ou seja, do Governo suportado pela "geringonça", houve uma criação de emprego líquida (diferença entre os que apareceram de novo e os que desapareceram) de 286 mil postos de trabalho. Soltem os foguetes. Mas não apanhem as canas. As boas notícias não devem ser usadas como uma vassoura que atira as más para debaixo do tapete. E estas são variadas: o emprego precário ganha terreno (dois terços dos novos contratos); a regra ainda é a dos salários miseráveis (40% dos novos contratos pagam o salário mínimo); o desemprego jovem continua a níveis estratosféricos (22,1%); a taxa de desemprego não contabiliza 900 mil pessoas inativas ou em situação de subemprego (a fazer uns biscates ou a trabalhar a tempo parcial). O ar está mais respirável para alguns, mas há demasiada gente a ficar para trás.

*Editor-executivo do JN

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