Instalada alta tensão nas
relações entre José Eduardo dos Santos e o seu sucessor
A intenção de Isabel dos Santos
levar o Estado angolano à barra dos tribunais acaba de abrir um novo capítulo
na ‘guerra’ que, desde que Eduardo dos Santos abandonou o poder, opõe o clã
familiar deste ao Presidente João Lourenço.
Em causa está a anulação do
contrato de construção do porto da Barra do Dande, no valor de 1500 milhões de
dólares, e a retirada da licença da compra de diamantes à Odissey que havia
sido atribuída à empresária angolana.
Inconformada com estas decisões,
Isabel dos Santos exige, no primeiro caso, uma choruda indemnização e, no
segundo, acaba de endereçar uma carta à empresa pública de comercialização de
diamantes Sodiam em que admite recorrer a todas as “opções legais” para fazer
prevalecer os seus direitos.
Se para revogar o contrato da
construção do porto do Dande, João Lourenço evocou “a falta de transparência”,
relativamente à Sodiam as autoridades alegam que o destino dado a uma garantia
soberana de cerca de 150 milhões de dólares contraída junto do BIC ameaçava
deixar o Estado de mãos atadas.
“Envolveram a Sodiam num negócio
falido em que o dinheiro da garantia soberana, ao servir para pagar as dívidas
que o antigo proprietário da De Grisogono havia contraído junto de bancos
suíços, resultava num pesado fardo para os cofres da empresa”, disse ao
Expresso fonte do Ministério dos Recursos Minerais e Petróleos.
A subida de tom das acusações que
Isabel dos Santos profere contra o Estado, ao potenciar a tensão entre o antigo
e o novo Presidente, está, para muitos observadores, a tornar irreconciliável a
relação entre ambos.
Tornando-se cada vez mais notória
a perda de controlo de José Eduardo dos Santos em relação aos filhos, em sentido
contrário João Lourenço continua a dar mostras de firmeza na imposição do seu
poder pessoal.
“Se algumas pessoas estavam
convencidas de que claudicaria para se dobrar aos intentos da antiga família
presidencial, estão redondamente enganadas”, confidenciou ao Expresso fonte dos
serviços de inteligência.
Não admira, por isso, que as
autoridades venham a endurecer as suas posições relativamente às aquisições de
ativos com recursos do Estado, que constituem parte significativa da fortuna de
Isabel dos Santos.
“Ela não se pode esquecer da
forma como entrou na Unitel e na Galp e como, por alegado interesse do Estado,
se apossou da Cimangol, assim como através da constituição da Atlantic
Ventures, dois meses antes da saída do pai, quis entrar na empreitada da
construção do porto do Dande”, advertiu fonte do gabinete de João Lourenço.
Para defesa da sua causa, a filha
do ex-Presidente contratou alguns dos melhores advogados angolanos, que estão a
ser assessorados por alguns dos escritórios de advogados mais reputados em
Portugal.
“Ao tentar mover processos contra
o Estado arrisca-se a colocar o pai na condição de principal testemunha pela
outorga das garantias soberanas”, disse o jurista Jerónimo Amaral.
Sérgio Raimundo, advogado de
defesa do antigo governador do Banco Nacional de Angola, Valter Filipe,
envolvido no escândalo do desvio de 500 milhões de dólares, considera que
Eduardo dos Santos deve ser arrolado como peça chave neste processo.
“Depois do que está a ser
descoberto em desabono da família, não acredito que aceite sujeitar-se a
tamanha exposição”, disse um antigo membro do seu gabinete.
Mas os problemas do clã do
ex-Presidente angolano não ficam por aqui. O seu sucessor deu uma machadada nos
seus interesses ao fazer uma verdadeira ‘revolução’ na política de
comercialização de diamantes.
Com esta nova política, João
Lourenço põe fim ao monopólio que, neste domínio, desde 2000, era detido por
Isabel dos Santos através da Ascorp e de outras empresas por ela controladas.
A empresária angolana, o irmão
Danilo dos Santos e outros membros da nomenclatura do regime faziam parte dos
chamados clientes preferenciais.
Através deste estratagema, os
diamantes eram comprados com uma margem inferior entre 30% a 40% do valor real
do mercado, e os produtores, além dos royalties e outros impostos, eram ainda
obrigados a pagar à Sodiam um valor adicional a título de goodwill.
Com a aprovação da nova lei, ao
mesmo tempo que é extinta a categoria de clientes preferenciais e são
introduzidos os contratos de longo prazo, pela primeira vez as sociedades de
exploração mineira passam a dispor de uma quota de 60% para a compra e venda da
respetiva produção.
“Com esta abertura, grandes
investidores como a De Beers ou a Rio Tinto começam a dar sinais de confiança
no nosso mercado”, garantiu ao Expresso fonte do Ministério dos Recursos
Minerais e Petróleos.
Gustavo Costa, correspondente em
Luanda | Expresso | Foto de Rui Duarte Silva
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