Com alguma sorte o crescimento
pode ser superior a 2,2% convertendo então o défice em excedente
Jorge Bateira | Jornal de Negócios
| opinião
A discussão do Orçamento do
Estado para 2019 tem dado atenção a uma lista de medidas que alguns
comentadores consideram ter sido composta sobretudo para um ano de eleições.
Esse não é o meu critério de avaliação de um orçamento.
Acabar com a penalização das
reformas antecipadas, repor algum poder de compra perdido pelas pensões mais
baixas, aumentar um pouquinho o valor abaixo do qual não se paga IRS porque se
é pobre, aliviar em cerca de 5% o custo da luz nos alojamentos com baixa
potência contratada, manter algum apoio aos desempregados de longa duração,
sobretudo quando têm filhos, ou criar um esquema de desconto nos passes sociais
para o transporte público das famílias, tudo isto é o mínimo que se espera de
um orçamento que procure melhorar o bem-estar dos cidadãos mais modestos. É o
normal funcionamento de uma democracia, por muito que isso incomode alguns
(demasiados) analistas.
Compreendo o seu incómodo. Andaram, durante anos, a moer-nos o juízo com a ladainha das contas certas e a aldrabice da austeridade expansionista, como se a economia de um país fosse semelhante a uma economia doméstica. Agora, com um défice previsto de 0,2%, não podem ter o topete de dizer que o orçamento é mau. Ainda por cima, quando foi elaborado pelo presidente do chamado Eurogrupo. Que mais querem?
Compreendo o seu incómodo. Andaram, durante anos, a moer-nos o juízo com a ladainha das contas certas e a aldrabice da austeridade expansionista, como se a economia de um país fosse semelhante a uma economia doméstica. Agora, com um défice previsto de 0,2%, não podem ter o topete de dizer que o orçamento é mau. Ainda por cima, quando foi elaborado pelo presidente do chamado Eurogrupo. Que mais querem?
Há sempre aquele argumento da
necessidade de um excedente, de uma "folga orçamental" para, numa
conjuntura adversa, o défice poder subir através dos estabilizadores
automáticos. Mas isso não é política orçamental, isso é apenas o funcionamento
da imbricação economia-orçamento que (às vezes) não querem ver. Uma política
orçamental, digna desse nome, usa o orçamento para promover o pleno emprego e a
estabilidade dos preços. Como ensina a boa teoria, o orçamento é apenas um
instrumento de política económica para a promoção daqueles objectivos. Bem sei,
na zona euro a política orçamental está proibida. Assim, a próxima crise
financeira vai apanhar vários países ainda a recuperar da última e, mais uma
vez, sem política orçamental para a enfrentar. Um dia destes, virão lembrar-nos
que somos como Sísifo: nova recessão, mais desemprego, novos cortes e novas
recapitalizações, tudo sob a condicionalidade do Mecanismo Europeu de
Estabilidade que passa a substituir a troika.
Isto remete para o cenário de um crescimento de 2,2%. Aqui, importa lembrar que as medidas acima enunciadas, acrescidas do que se destina à Administração Pública (aumentos modestos dos funcionários, progressões nas carreiras, novas contratações), reforçadas por um aumento do investimento público que ainda assim o mantém, em percentagem do PIB, em valores historicamente baixos, terão um efeito multiplicador significativo. O público-alvo tem elevada propensão a consumir produção nacional. Com alguma sorte, o crescimento pode ser superior a 2,2%, convertendo então o défice em excedente, tudo para a maior glória de Mário Centeno e a "credibilidade" de Portugal. As enormes carências do país, essas terão de esperar por nova legislatura.
E se um mau alinhamento dos astros - "Trump-China-Brexit-Itália-petróleo-finança" - fizer descarrilar este cenário, com o regresso do tempo da grande turbulência? Nesse caso, só me resta esperar que ainda haja alguém no governo que saiba para que serve um orçamento, fora do ordoliberalismo dos Tratados, e perceba que a verdadeira política orçamental trabalha articuladamente com a política monetária. Porém, a conversa sobre os 600 milhões que o Banco (que já não é) de Portugal vai entregar ao Estado - depois de avaliar cautelosamente os riscos do seu balanço! -, não me deixa tranquilo. Fica-se com a impressão de que não sabem que um banco central cria a moeda de que precisa e garante sempre o reembolso da dívida pública emitida em moeda nacional.
Isto remete para o cenário de um crescimento de 2,2%. Aqui, importa lembrar que as medidas acima enunciadas, acrescidas do que se destina à Administração Pública (aumentos modestos dos funcionários, progressões nas carreiras, novas contratações), reforçadas por um aumento do investimento público que ainda assim o mantém, em percentagem do PIB, em valores historicamente baixos, terão um efeito multiplicador significativo. O público-alvo tem elevada propensão a consumir produção nacional. Com alguma sorte, o crescimento pode ser superior a 2,2%, convertendo então o défice em excedente, tudo para a maior glória de Mário Centeno e a "credibilidade" de Portugal. As enormes carências do país, essas terão de esperar por nova legislatura.
E se um mau alinhamento dos astros - "Trump-China-Brexit-Itália-petróleo-finança" - fizer descarrilar este cenário, com o regresso do tempo da grande turbulência? Nesse caso, só me resta esperar que ainda haja alguém no governo que saiba para que serve um orçamento, fora do ordoliberalismo dos Tratados, e perceba que a verdadeira política orçamental trabalha articuladamente com a política monetária. Porém, a conversa sobre os 600 milhões que o Banco (que já não é) de Portugal vai entregar ao Estado - depois de avaliar cautelosamente os riscos do seu balanço! -, não me deixa tranquilo. Fica-se com a impressão de que não sabem que um banco central cria a moeda de que precisa e garante sempre o reembolso da dívida pública emitida em moeda nacional.
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