Nos últimos 45 anos estive na
decisão de muitíssimas, algumas das maiores e mais prolongadas, greves
realizadas em Portugal.
Manuel Guerreiro | Abril Abril |
opinião
Sempre tive a preocupação de que
fossem claros e transparentes os objectivos da greve, provocasse o maior custo
aos patrões e ou governos responsáveis pelo seu desencadear, e tivesse o menor
impacto colateral nos utentes das empresas e serviços afectados pela greve.
Os piquetes de greve eram
constituídos e instruídos para garantir a segurança dos equipamentos e
instalações, e no caso de serviços públicos e sociais serem afectados, sempre
se tomavam medidas e despenderam valores significativos para produzir informação
a esclarecer os utentes para lhe permitir atenuar as consequências e impacto da
greve.
Ainda assim, quando as greves
eram de maior impacto, sempre as vi serem zurzidas pelos partidos da direita,
PSD e CDS-PP, pela maioria da comunicação social e «opinadores» de serviço.
Desde finais de Novembro,
assistimos à greve dita «cirúrgica» envolvendo umas dezenas de enfermeiros dos
blocos operatórios de cinco unidades do SNS, formalmente declarada pela novel
Associação Sindical Portuguesa de Enfermeiros (ASPE), constituída em finais de
Junho de 2017, com sede em Ovar, e, também pelo novel Sindicato Democrático dos
Enfermeiros Portugueses (SINDEPOR), constituído em Setembro do mesmo ano, com
sede em Évora, patrocinada pela Ordem dos Enfermeiros Portugueses – onde os
ditos sindicatos, é público, reúnem.
Extraordinário que esta greve não
tenha sido objecto de critica intensa, ao contrário conta com o apoio
embevecido do PSD e CDS-PP, embora seja claramente contra os utentes dos blocos
cirúrgicos de cinco das principais instituições de saúde pública portuguesa,
como qualquer pessoa com um mínimo de experiência facilmente constata,
especialmente se reflectir sobre as alarmistas declarações dos dirigentes ditos
sindicais e da senhora Bastonária da Ordem dos Enfermeiros, conhecida activista
e ex-dirigente do PSD.
Bastonária que em vez de falar de
como salvaguardar os cuidados de saúde aos doentes necessitados, eventualmente
da justeza das reivindicações e da adesão dos profissionais à greve, vem agitar
a opinião pública com as consequências das greves sobre os utentes, mais de 5
mil actos cirúrgicos por realizar.
Sobre este alarmista parlar, não
vi os «opinadores» zurzir os promotores da greve, e já soube haver apelos para
a reflexão sobre o direito à greve dos trabalhadores da administração pública.
Com sinceridade, depois duma
greve tão irresponsável e oportunista, com consequências tão dramáticas, os
apelos à reflexão sobre o direito à greve, obviamente, visam liquidar o
direito, não é preciso tirar nenhum «doutoramento» em reflexão para enxergar
tal desiderato.
Há situações em que não podemos
ficar-nos pelas manifestações de muita perplexidade e pouca acção.
Não questiono as reivindicações
dos enfermeiros portugueses, que me parecem justas e oportunas, nem o direito
básico dos enfermeiros lutarem por elas, incluindo o recurso à greve, porque
isso é básico para um ex-sindicalista defensor do sindicalismo de classe e dos
direitos e interesses dos trabalhadores, sejam eles enfermeiros, empregados de
super's, hipermercados e logísticas, médicos, juízes, guardas prisionais,
magistrados do ministério público, ferroviários, metalúrgicos ou outros.
Questiono a actuação da senhora
ministra da Saúde e do Governo porque essa, sim, me deixou perplexo, quando,
depois do que vimos e ouvimos das «Ordens» sobre as greves, a propósito das
consequências para os utentes, oiço a mesma garantir que «tenho a certeza de
que, se estiverem em causa riscos deontológicos, as ordens profissionais
garantirão que os doentes não são colocados em risco».
Não! Quem tem de dar
garantias de que os utentes são bem e adequadamente tratados, em tempo
oportuno, é a senhora ministra da Saúde e o Governo.
Outra anormalidade desta greve!
É mesmo uma anormalidade, porque
não conheço que alguma vez tenham sido pagos dias de greve com fundos
recolhidos directamente ou via internet, como é anunciado ter acontecido com
esta.
Anunciam, com a greve ainda em
curso, que já recolheram, em poucos dias, mais de 360 mil euros para pagar os
dias de greve. Dizem que vão fazer uma recolha, ainda maior, para pagar aos
grevistas da próxima greve, já anunciada para Janeiro, nos blocos operatórios
de mais unidades do SNS.
Participei em algumas campanhas
de recolha de fundos, com destinos bem mais populares do que para financiamento
de greves impopulares, e nunca tive notícia que se tenham recolhido, em tão
pouco tempo, valores tão significativos.
Não acredito em bruxas, mas que
as há, há!
Por isso, é preciso saber quem
financia quem, e não é porque a recolha é feita via net, que não deve ser
possível saber da origem das transferências para estes pagamentos.
Há muitos interesses em jogo,
alguns bem endinheirados, aos quais muito interessa o desprestígio do SNS e das
suas unidades mais apetrechadas e capacitadas, a transferência dos actos
clínicos por fazer no público para o privado, bem como a liquidação do direito
à greve.
É altura de agir, travar o passo
a aventuras que usando e abusando da liberdade e da democracia, criam as
condições para o seu funeral, e o retorno a tempos que queremos nunca mais ver
repetidos!
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