terça-feira, 18 de setembro de 2018

Cuidado Angola, cuidado angolanos


Costa em Angola é o tema de abertura do Curto do Expresso por João Vieira Pereira, lá do Bilderberg Balsemão. Isto até parece que há os que sentem um certo engulho na retoma de boas relações com Angola entre os Estados soberanos luso e angolano. Parece, não quer dizer que corresponda à realidade. Angola está a mudar relativamente ao regime de Santos, Portugal mudou relativamente ao regime imposto por Passos Coelho, Portas, Cavaco Silva. Sendo que aquele último foi um monstro político que reinplantou até onde conseguiu o regime deposto em 25 de Abril de 1974. Os portugueses mantiveram nos poderes os Cavacos que se tornaram os Donos Disto Tudo, votaram em Cavaco, no PSD/CDS deles, e tramaram Portugal com décadas de retorno ao antigamente, de modo subtil mas sistemático. A conjuntura global está a ajudar.

E é esse Cavaco, agora ainda mais caduco, que continuamos a sustentar num qualquer palácio de Lisboa, ali para os lados do 31 da Armada, entre Alcântara e Santos. Sendo que ele foi e é o diabo. Resta-nos esperar que morra e que tenha um funeral de pompa pago por todos nós, aliás, como Soares (não se lhe comparando), deverão fazer-lhe vários funerais e cerimónias bacocas caríssimas e pagas por todos nós. Além de o pespegarem mais cedo que tarde no Panteão Nacional, algo que vai virando chiqueiro de más companhias para os distintos portugueses que na realidade ali merecem ter a última e honrosa morada.

Como Cavaco Silva temos mais uns quantos seus formandos por aí, na política ativa. Daqueles que gostariam de retornar ao “Angola é Nossa”. Passos é um deles, mas há muitos mais. Infelizmente.

Felizmente Angola livrou-se do jugo do colonialismo português, perverso, repressor, explorador, carrasco, tantas vezes esclavagista e assassino. Fascista. Afinal esse estilo e postura era o adotado por Cavaco na vida, provou-o quando fez comissão militar nas “colónias”, em Moçambique. Um salazarista assumido que confortavelmente cumpriu dois anos e pouco num gabinete a mostrar o seu apoio à pseudo grandeza do Portugal “maior que a Europa” se o regime que servia juntasse todas as então colónias. Havia mesmo um mapa disso sobreposto ao da Europa, asqueroso panfleto colonial-salazarista-fascista. Que perdurou durante o Marcelismo.

Porquê trazer aqui Cavaco por esta hora? Porque o que agora se pretende de Angola é explorar o mais possível. Prova disso está a visita de Costa àquele país soberano. Na mira está a economia, a economia, os lucros, os lucros, a exploração, a exploração… O neocolonialismo. Era assim que nas políticas de Cavaco tudo funcionava. Costa não está a fazer nada de novo, que Cavaco não tenha feito. O que quer é fazer a retoma dessa política. Principalmente em Angola, Cavaco produziu alguns potes de riqueza (BES, Mota & Cª) de que ainda hoje alguns perduram, que assentaram arraiais com os seus negreiros em Angola, que ainda hoje lá estão e agora querem regressar a Angola “em força” por mérito de Costa. Talvez, se Angola, o seu novo presidente e regime, não se souberem defender.

Os Cavacos são todos suspeitos da sua gana de explorar, afinal são neocolonistas (alguns fascistas) que aparentemente se vestiram de democráticos, justos, honestos. Nada mais falso. E desses a mole vai em crescendo. Cuidado Angola. À boleia de Costa e de um governo português falsamente dito socialista e geringonceiro o que prevalece é o neocolonianismo, as sementes cavaquistas, salazaristas, os que não interessam aos povos porque os escravizam e os roubam. Cuidado, presidente João Lourenço. Cuidado angolanos. (BG | PG)

Bom dia este é o seu Expresso Curto

Mesmo de jeans, Angola fica-lhe tão bem

João Vieira Pereira | Expresso

Não há nada que irrite mais do que classificarem como “um irritante” uma investigação judicial a um caso de alegada corrupção a um procurador.  Não sei de quem foi a ideia, mas mostra uma notória falta de respeito para com a Justiça quando se compara aquela investigação a uma espécie de mosca chata que não nos larga.

Agora que a dita mosca se foi embora,  António Costa aterrou em Luanda. Mas para quem se preocupa tanto com os pequenos irritantes nas relações com aquele país,  a visita do primeiro-ministro não podia ter começado pior.

Desconheço o que se passou na cabeça de quem gere o protocolo nestas viagens, mas alguém cometeu um erro crasso. Não porque António Costa desembarcou do avião vestindo jeans, sem gravata e trajando um ar descontraído que até lhe fica bem. Mas porque o fez em Angola, num dia feriado dedicado à memória do herói nacional Agostinho Neto, demonstrando um total desconhecimento da realidade daquele país onde a formalidade é rei. Como não acredito que o tenha feito de propósito, alguém fez asneira e da grossa. O Público escreve que o primeiro-ministro não estava a espera de uma receção tão solene que até teve direito a guarda de honra.

O caro leitor pode até pode achar que este episódio não teve importância alguma, mas acredite que basta conhecer minimamente Angola para saber que as jeans é que são um irritante totalmente desnecessário.

Se Costa percebeu o erro fez de conta, e bem, que nada se passou. Garantiu que os problemas entre os dois países são passado, quehá sinais positivos para resolver a dívida de Angola às empresas portuguesas, estimada em mais de 400 milhões de euros, e anunciou o alargamento em 500 milhões de euros da linha de crédito de apoio às exportações para aquele país.

Enquanto isso, em Portugal, Marcelo afirmou que a visita do primeiro-ministro é uma "ocasião única" para um entendimento entre os dois países. Até porque “não é por acaso que o primeiro-ministro está lá agora e daqui a dois meses estará cá o Presidente de Angola".

A visita atinge hoje o ponto mais alto. Pelas 11h, António Costa irá encontrar-se com o Presidente João Lourenço. Visita que pode acompanhar no site do Expresso.

Trump outra vez O Presidente norte americano escalou a guerra comercial com a China ao anunciar mais 200 mil milhões de dólares de tarifas sobre a importação dos mais variados produtos chineses. Os mercados não estão a gostar e este deve ser um dos temas que vai marcar o dia. O Governo chinês já convocou uma reunião para discutir o tema mas os analistas dizem que Pequim não está muito preocupado, pois a China tem ferramentas orçamentais e monetárias para lidar com a situação.

E ainda Trump outra vez A administração Trump anunciou que o limite para o número de refugiados aceite nos EUA será, no próximo ano, de 30 mil, o valor mais baixo de sempre.

Até tu Brett A nomeação de Brett Kavanaugh para juiz do Supremo Tribunal dos EUA pode ter de ser adiada, depois de ter sido acusado de ter atacado sexualmente uma mulher quando eram adolescentes. Kavanaugh, que mantém o apoio de Trump, já refutou as acusações e mostrou-se disponível para ir ao Senado depor.

A Guerra voltou para ganhar A série televisiva ‘Guerra dos Tronos’ foi a grande vencedora dos Emmys deste ano ao arrecadar 7 prémios. A noite foi literalmente dividida entre a cadeia HBO e a Netflix, com 23 prémios cada. Veja aqui todos os nomeados e vencedores. E as fotos da passadeira vermelha (sim, é só para assinantes).

O banqueiro dos ricos António Simões já era uma figura importante no topo do HSBC, agora foi indicado para liderar o negócio da banca privada do grupo a nível global.

Energia a todo o gás A Comissão Parlamentar de Inquérito às rendas da energia vai ter mais quatro audições esta semana. Hoje serão ouvidos os antigos presidentes executivos da REN, José Penedos (de manhã), e da EDP, João Talone (à tarde). Confira aqui os senhores que se seguem.

Olha o passarinho Um avião da companhia France Soleil foi obrigado a alterar a sua rota de aproximação ao aeroporto de Lisboa após um avião da TAP se ter cruzado com um dronepouco antes de aterrar.

Era um porto… romano Foi descoberto, em Vila do Bispo, um porto romano com dois mil anos, com o melhor estado de conservação identificado até hoje em Portugal.

Comporta não As associações ZERO e Transparência e Integridade defendem que exigências atuais de ordenamento do território não são compatíveis com projetos imobiliários especulativos e por isso querem travar a venda da Herdade da Comporta. Pergunta: quem é que paga a dívida de quase €130 milhões à Caixa Geral de Depósitos? Eles?

Adeus à perninha O Bloco de Esquerda tinha feito a proposta e agora o Conselho Superior do Ministério Público e o Conselho Superior de Magistratura concordam: os magistrados que queiram aproveitar a reforma para fazer uma ‘perninha’ na arbitragem fiscal devem perder, de forma definitiva, o direito à condição de jubilados, e o suplemento remuneratório a que têm direito.

E adeus mister “toupeira” Paulo Gonçalves, assessor jurídico do Benfica e arguido no caso e-toupeira, pediu para sair por “razões de natureza pessoal”. Dizem que para se dedicar à sua defesa num processo judicial, em nada relacionado com o exercício de funções que tinha no clube.

Um precário para mim…. um precário para ti Nos municípios, mais de metade dos trabalhadores precários não foram, até agora, integrados com um contrato de trabalho sem termo, e muitos vão mesmo ficar sem ele. É essa a conclusão a retirar de uma amostra de 34 municípios portugueses.

As associações também se abatem A morte anunciada da Associação Industrial do Minho (AIMinho) em 2013, ano em foi abalada por uma operação policial que procurava provas de fraude na aplicação de fundos comunitários, foi agora concretizada. A assembleia de credores confirmou a liquidação, com os votos do Novo Banco a serem decisivos.

A Lua é japonesa Maezawa, o jovem milionário japonês que fundou o maior negócio online de venda de roupa no seu país, foi escolhido por Elon Musk para ser o primeiro passageiro do projeto Space X e assim ser lançado numa viagem à volta da Lua.

Esperança síria Mais uma tragédia humanitária pode ter sido evitada depois da Rússia e a Turquia terem acordado criar uma zona desmilitarizada em Idlib e que sirva de tampão entre as forças rebeldes e o exército sírio.

Encontro de irmãos É a terceira reunião entre os líderes das Coreias. O Norte recebe o Sul.

Comboios de água Vapor e água são as únicas emissões dos novos comboios quer circulam entre algumas cidades alemãs. Os primeiros do mundo movidos a hidrogénio.

Bruxelas says nay O Brexit parece uma novela negra. Segundo o The Guardian, Bruxelas quer que o Governo Britânico 'veja o abismo' que uma situação de não acordo provocaria antes de as negociações chegarem a bom porto. A relação entre os dois blocos está cada vez mais tensa depois de Macron ter dito que quer delinear os termos de um futuro acordo já e não deixar nada para depois do dia ‘D’, 29 de Março de 2019.

Go Florence, please go A tempestade Florence já passou mas há áreas dos estados da Carolina que continuam ameaçadas por cheias, já que o leito dos rios continua a subir.

Go Mangkhut, please go Nas Filipinas continuam as buscas pelos mais de 40 trabalhadores que ficaram soterrados nos escombros de uma mina de ouro na sequência da passagem do tufão Mangkhut. Só naquele país já há mais de 100 vítimas mortais. A tempestade espalhou uma onda de destruição em alguns países do sudeste asiático.

Moscovo diz sim, Kiev diz não A Rússia diz ter provas de que a Ucrânia foi responsável pela queda do avião da Malaysia Airlines, em 2014, numa região controlada pelos separatistas pró-russos. "É outra mentira e falsidade da Rússia”, assim reagiram as autoridades ucranianas à acusação.

Os jornais do dia O Público destaca a visita de António Costa a Angola, (tema que faz capa em todos os jornais), mas a escolha de manchete vai para a informação de que o Governo quer que o SNS tenha dentistas em todos os concelhos até 2020. O Jornal de Notícias conta que há um inquérito na escolas que está a causar polémica e a gerar acusações de racismo. O jornal ‘i’ diz que André Ventura já tem 2500 assinaturas para destituir Rui Rio. O Correio da Manhã escreve que há reformas pagas com 9 meses de atraso. E o Negócios opta por denunciar que as empresas já estão a sentir a alta do preço da energia.

O QUE DIZEM OS NÚMEROS

€73,87 euros é o preço mínimo a pagar por mês para ver todos os jogos do Benfica esta época. Por ano, são quase 900 euros só para acompanhar todas as competições de futebol.

2,1% é quanto caiu o número de turistas em Portugal, no mês de julho e em termos homólogos

Há zonas de Lisboa onde 34% das casas já são ocupadas por turistas.

LIDO

“Acredito que os professores de Portugal são isto. Eu, como professor, tenho a certeza que os professores de Portugal são dos melhores do mundo, porque têm esperança, porque transmitem essa esperança, porque olham para o futuro e porque estão disponíveis” — Marcelo Rebelo de Sousa

“Quando aceitei este convite, não sabia quanto ia ganhar” — Cristina Ferreira em entrevista à SIC

“Apesar de termos, literalmente, dado o peito às balas e de o tribunal ter decidido a ilegalidade/extemporaneidade de qualquer ato eleitoral antes de decididas as questões disciplinares criadas pelas duas putativas comissões de JMS, nada foi capaz de evitar que as eleições acontecessem” – Bruno de Carvalho e Alexandre Godinho

O QUE EU ANDO A LER

Infelizmente não consegui estar ontem no Porto para ouvirRichard Thaler. O Nobel da Economia é um dos meus favoritos. A forma como nos faz olhar o mundo, e coloca em causa anos e anos de correntes económicas consideradas à prova de bala, é absolutamente genial.

A economia comportamental é poesia num mundo que se perde em modelos econométricos e vibra com sistemas de equações lineares. Por isso os racionalistas detestam-no quando expurga da teoria económica as decisões otimizadoras dos agentes económicos e usa a psicologia ou outras ciências sociais para explicar, por exemplo, porque poupamos tão pouco.

O economista deu uma entrevista ao Expresso (que pode ler no final deste longo artigo sobre os 10 anos da crise financeira) que não deve perder. E se ficar curioso com o que é um ‘Homer Economicus’ atreva-se a atacar Nudge, que já recomendei neste espaço, ou Misbehaving, o meu preferido, por ser uma viagem biográfica pela história do pensamento económico moderno.

Este Expresso Curto fica por aqui. Amanhã regressa pelos dedos de Paula Santos. Tenha uma ótima terça-feira.

Quem se serve e a quem serve a concertação?


Não há trabalhadores que, perdendo o seu salário, se sintam felizes terem de recorrer à greve; as lutas sociais são inerentes ao capitalismo, ao antagonismo de interesses entre capital e trabalho.

Vítor Ranita | AbrilAbril | opinião

No dia 30 de Maio, patronato, UGT e Governo, chegaram a acordo sobre as alterações a introduzir na legislação laboral. A CGTP-IN, a mais representativa Central Sindical, em discordância, ficou de fora. Portanto, houve consensos. O acordo legitimou apenas o que interessava subscrever por alguns dos participantes. Mas tal não impediu o ministro Vieira da Silva de opinar: «Um bom acordo para o país». E essa, por certo, também foi a opinião da Comissão Europeia, empenhada na reversão dos direitos laborais.

Segundo os insuspeitos Mário Pinto e Amândio de Azevedo, «a subordinação e a dependência dos trabalhadores constituem características do seu estatuto social tradicional1». Provavelmente será essa a razão da satisfação pessoal com que o sindicalista Carlos Silva se prontifica a subscrever o que interessa às confederações patronais. Enfim, idiossincrasias!

Naturalmente a Confederação Empresarial de Portugal secundou a opinião do ministro Vieira da Silva. E ficou reafirmada a concepção do Governo – António Costa assinou o acordo – que identifica os interesses nacionais com os interesses particulares do grande capital. Dito de outro modo, os governantes em exercício deixam clara a opção de classe que privilegiam, apenas parcialmente condicionada pelo conjuntural compromisso político-orçamental com os partidos à sua esquerda.

Quando o entendimento na Concertação Social provocou nesses partidos acentuadas críticas, e Carlos César, presidente do grupo parlamentar do PS, admitiu a introdução de ajustamentos ao conteúdo do acordo firmado na Concertação, de novo se manifestou a convergência de atitudes entre o patronato e a UGT.

Seguiram-se entrevistas nos jornais, divulgação de comunicados, declarações aos repórteres de serviço: António Saraiva ameaçou retirar-se do acordo em caso de mudanças adicionais na Assembleia da República à alteração das leis do trabalho obtida com a cooperação da UGT; por sua vez, Carlos Silva, num autêntico frenesim, do alto do seu telhado de vidro acusou pateticamente a CGTP-IN de ter posições ideológicas, e procurou influenciar os parlamentares, sobretudo os do seu partido, o PS, para que respeitassem integralmente as mudanças da legislação laboral por ele subscritas.

Vem a propósito recordar que, desde há décadas, os sistemáticos ataques aos direitos dos trabalhadores, em que se irmanaram PS, PSD e CDS-PP, podendo variar de designação (pacto social, tectos salariais, congelamento da contratação colectiva, moderação salarial, sucessivos pacotes laborais, caducidade forçada dos antigos contractos colectivos…) orientaram-se pelas reivindicações patronais e serviram os interesses que ditaram as citadas palavras do actual Ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social.

O Bloco Central na origem da concertação social em Portugal

No essencial a concertação mantém o carácter instrumental que levou à criação do Conselho Permanente de Concertação Social, em Março de 1984, por Decreto-Lei do PS de Mário Soares e do PSD de Mota Pinto, então coligados no chamado governo do Boco Central.

Para melhor se lhe compreender o objectivo instrumental importa lembrar as circunstâncias da época, um tempo de graves problemas sociais e de muitas e grandes lutas laborais: o aumento anual do custo de vida chegava aos 33%; havia para cima de 100 mil trabalhadores com salários em atraso; acentuava-se o alargamento da precariedade e da aplicação do lay-off; o desemprego atingia meio milhão de desempregados; novas ameaças contra a qualidade de vida e de trabalho avizinhavam-se com a aceitação das imposições do FMI. E foi neste contexto que o governo do Bloco Central, presidido por Mário Soares, arauto das virtudes do diálogo social, ficou marcado pela intervenção das forças militarizadas nos conflitos laborais e pela detenção de 284 sindicalistas que se manifestavam à porta do primeiro-ministro.

Então, como hoje, a CGTP-IN, por opção fundada na defesa dos interesses de classe dos trabalhadores era, e continua sendo, o adversário em comum combatido pelos governos ligados ao capital, pelas confederações patronais e pela UGT. E é neste quadro que se deve entender o propósito instrumental do Conselho Permanente de Concertação Social e a sistemática negação ao acolhimento das propostas da CGTP-IN, pela parte maioritária dos seus membros, representantes patronais e apoiantes dos correspondentes interesses de classe.

Será essa maioria de apoios suficiente para satisfazer o capital? Não, muito por via da capacidade de luta da CGTP-IN e na opinião de alguns Mestres em Direito das Empresas.

Efectivamente, Ricardo Gosau da Mota Veiga Pereira, na sua dissertação de mestrado, defende que «os últimos anos têm sido caracterizados por um grande número de greves que têm um impacto verdadeiramente nefasto na economia2» e que, por isso, «impõe-se reflectir se o sistema jurídico português prevê mecanismos que permitam resolver o “inevitável conflito de interesses” entre trabalhadores e empregadores, resultante da subordinação e dependência dos primeiros aos segundos3».

Creio que não é necessário possuir formação superior para entender o seguinte: primeiro, não há trabalhadores que, perdendo o seu salário, se sintam felizes por serem forçados a participar numa greve; segundo, que a razão maior das greves é a intransigência patronal face às legítimas reivindicações dos assalariados; e, finalmente, que essas lutas sociais estão relacionadas com uma realidade intrínseca ao sistema capitalista – o antagonismo de interesses de classe entre capital e trabalho.

Qual antagonismo!? exclamará a UGT, negando o reconhecimento dessa realidade.

De qualquer modo, seria de admitir o mais fácil entendimento entre estruturas por definição dedicadas a defender os interesses comuns dos trabalhadores.

Mas o que vemos é Carlos Silva a socorrer-se de «argumentos» do período da guerra fria para se distanciar da CGTP-IN. O que sabemos é que tal atitude está associada, documentadamente, ao modo como nasceu a UGT e se posicionou desde o princípio. O que se pode confirmar é a preferência da UGT pela colaboração com as confederações patronais, com um discurso anti-CGTP-IN por vezes mais agressivo do que o das próprias organizações patronais.

Colaboração de classses: quem perde e quem ganha

Quem tenha alguns resquícios de consciência social poderá identificar na história vários artifícios patronais para acentuar a dependência e subordinação dos seus assalariados e quebrar a capacidade de luta dos trabalhadores vítimas de injustiças.

Entre esses métodos poderemos identificar a construção de habitações para operários, incentivada pelo salazarismo; a colaboração interclassista, obrigatória por lei do fascismo; a distribuição anual de uma pequena parte dos lucros de sociedades de tal ou tal empresa; a simpatia empresarial de disponibilizar algumas acções das sociedades anónimas para aquisição por trabalhadores; os diversos prémios pecuniários a trabalhadores «bem comportados», assim como a insistência na formatação das mentalidades visando a aceitação da ideia do alegado «bem comum».

Essa formatação ideológica, por compreensíveis razões, foi mais rápida e mais longe através da instituição legal da co-gestão na Alemanha Federal capitalista (1951 e sucessivas alterações a partir de 1956), face à pressão do enorme prestígio granjeado pelos soviéticos com as derrotas militares por eles infligidas aos nazis, a Leste e em Berlim. E não deixa de ser significativo o facto de a envolvência na co-gestão ter começado por ser orientada para os trabalhadores das empresas mineiras e da indústria do ferro e do aço, de reconhecidas tradições de luta.

Na Alemanha actual, a lei que regula a co-gestão não torna obrigatório o seu exercício generalizado. Aplica-se apenas onde haja estruturas eleitas dos trabalhadores (Conselho de Empresa). Onde é praticada, a participação dos trabalhadores exerce-se através de representantes com assento em órgãos institucionalizados e em diferentes níveis: no estabelecimento (unidade de produção), na empresa, na sociedade por acções, e nas empresas holding.

Fora do âmbito da co-gestão fica o que se refira à intervenção específica dos sindicatos e ao clausulado da contratação colectiva de trabalho.

É interessante constatar na lei alemã que é variável a proporção da representação dos trabalhadores no mais relevante órgão (que designadamente elege a Administração) das sociedades, o Conselho de Supervisão, cuja presidência, obviamente, é sempre patronal. Nos sectores mineiro, do carvão e do aço, por exemplo, essa representação chega a metade. Noutros sectores, em empresas com 500 a 2000 trabalhadores, a representação fica-se por 1/3.

Na base da estrutura empresarial, os trabalhadores podem invocar o direito de serem consultados, o direito de exigirem, ou de se oporem, ao despedimento ou transferência de certos trabalhadores, o direito de celebrarem acordos internos, por exemplo.

A nível intermédio das sociedades por acções, nos órgãos onde se decidem as orientações estratégicas, a participação dos trabalhadores centra-se na promoção da ideia da colaboração baseada na confiança entre trabalhadores e Administração.

Generalizando a consideração dos esquemas criados para enredar os trabalhadores na ideia do «bem comum», que classe social ganha com a ideologia da colaboração interclassista?

Lembremos a frase de Marcus Raskin: «As classes empresariais nunca descuram a sua consciência da luta de classes, e menos ainda a importância de vencê-la»4. Não esqueçamos, sobretudo, a condição do assalariado – subordinado e dependente economicamente dos patrões – «o que significa na prática uma diminuição do homem, um impedimento, uma prisão inibitória da plenitude da realização pessoal do trabalhador, ou melhor: dos trabalhadores5».

Arredando da consideração os eventuais benefícios pessoais usufruídos por alguns militantes da concertação social, empresários ou assalariados, aqui fica, ainda, para reflexão, uma conclusão tirada pelo Comité Económico e Social Europeu, que transcrevo da atrás referida dissertação de mestrado de Ricardo Gosau Mota Veiga Pereira: «outra vantagem dos mecanismos de participação financeira dos trabalhadores é que os accionistas têm do seu lado, não só outros accionistas, mas também os trabalhadores da empresa, que perseguem os mesmos objectivos».

Notas:
1.«Participação dos trabalhadores na empresa: legislação alemã de co-decisão», Análise Social, V. 8, 30-31 (2.º - 3.º trimestre 1970), pág. 466.
2.O sistema de cogestão na lei das sociedades anónimas alemãs – desafios e virtualidades da sua transposição para o Direito português, dissertação apresentada no Instituto Universitário de Lisboa, Escola de Ciências Sociais e Humanas, Departamento de Economia Política, datada de Setembro de 2015.
3.Citação de um trecho da obra antes identificada, da autoria de Mário Pinto e Amândio de Azevedo.
4.Prefácio a Os Senhores do Mundo, de Noam Chomsky, Bertrand Editora, 2016, pg.21.
5.Mário Pinto e Amândio de Azevedo, ob. citada, pág. 466.

Caça às bruxas no PSD?! Isto não vai acabar bem


Martim Silva | Expresso | opinião

A competição para se avaliar qual o maior tiro no pé dado pela direção de Rui Rio e pelo presidente do PSD deixou de fazer qualquer sentido depois do comunicado do partido no último sábado. Estimado leitor, esqueça lá a polémica da taxa robles ou da taxa rio ou outro qualquer assunto semelhante. Agora chegámos a todo um novo, e perigoso patamar. O patamar da caça interna às bruxas. Dê por onde der, a coisa não pode acabar bem.

A coisa explica-se em breves linhas. Na última quarta-feira, o Conselho Nacional do partido reuniu nas Caldas da Rainha. Assistiu-se aí ao primeiro confronto direto, visível e tenso, entre os apoiantes de Rio e os chamados críticos, com destaque particular para o antigo líder parlamentar Hugo Soares (pode ler AQUI o relato do encontro).

Um dos motivos próximos do confronto prendeu-se precisamente pela forma como o presidente do partido começou por reagir à chamada "Taxa Robles", contra a especulação imobiliária, apresentada pelo Bloco de Esquerda, e que levou a divergências dentro da própria geringonça. Entre os sociais-democratas, muitos não gostaram de ver o líder do partido colar-se a uma medida bloquista.

O descontentamento interno não se ficou por aqui. Na quinta-feira à noite o Expresso noticiou (ler AQUI) que também na reunião da Comissão Política o descontentamento em relação a Rio se fez ouvir.

Repare-se bem: já não se trata de surgirem críticas num órgão, como o Conselho Nacional, em que têm assento apoiantes e críticos da liderança. Trata-se de surgirem críticas ao trabalho de Rio dentro da sua própria direção. E isto muda tudo. Como na altura escrevemos: "Nuno Morais Sarmento falou de 'tiro no pé'. Castro Almeida, de 'descaraterização ideológica'. Mas o desconforto foi geral. Tirando Elina Fraga e Salvador Malheiro, todos os vice-presidentes de Rui Rio se demarcaram em tom mais ou menos crítico da forma como o líder do PSD se deixou colar à polémica "taxa Robles", lançada pelo Bloco de Esquerda."

Perante isto, no sábado, a reação e a resposta foram do pior que já se viu na política portuguesa. Um comunicado (pode ser lido AQUI), assinado pelo secretário-geral do partido, José Silvano, cheio de recados e divisionismo.

Na nota lêem-se com espanto coisas como que "A Direção Nacional do Partido Social Democrata está globalmente coesa" - o que confirma as divisões, se preciso fosse. Ou que a Comissão Política Nacional está indignada"'pelo desgosto de verificar que a notícia que originou toda esta desinformação, tenha tido, necessariamente, a colaboração direta de alguém que, tendo estado presente, não se coibiu de usar um jornalista para a prossecução de pequeninos objetivos de guerrilha partidária".

É claro que Rio faz bem quando de peito feito diz "estou cheiinho de medo" (ler AQUI), como que exortando os críticos a virem a jogo e a dar a cara.

Mas onde perde claramente o pé é na construção de um clima interno de perseguição, mesquinhez, desconfiança e verdadeira caça às bruxas. Querer saber quem é, na sua visão, o 'bufo' que anda a passar notícias aos jornais é um exercício estéril e que só se vira contra o próprio. Só mostra fraqueza e insegurança.

Aliás, não é difícil perceber que as críticas internas só surgem precisamente pela forma como está a fazer oposição. Se o fizer melhor, mais apoios internos terá. Sem precisar de ter um polícia dentro da sede da São Caetano à Lapa que lhe diga quem é que anda a falar com o jornal x, com a televisão y ou com o site z. Se quer ir por aí, está politicamente a cavar de forma acelerada o buraco em que está metido.

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