Pedro Ivo Carvalho* | Jornal de
Notícias | opinião
Podemos optar pela resposta
cautelosa: muito dificilmente.
Ou podemos meter uma mão no fogo
por um desfecho mais condizente com a letargia lusitana quando chega a hora de
todos pagarmos os banquetes de uns quantos: não, não vai acontecer nada aos
gestores, supervisores e decisores políticos que, ao longo de pelo menos 15
anos, permitiram que a Caixa Geral de Depósitos (CGD) se transformasse na Caixa
Geral de Empréstimos para Amigos. Vícios privados, públicas virtudes. Os
números pornográficos desta orgia do regime bipartidário certamente justificam
o esforço patriótico do banco público de escondê-los do Parlamento e dos
portugueses. Era para nos poupar à vergonha. Obrigado, mas dispensávamos tanto
zelo com o segredo, meus senhores. Em quase meia centena de créditos de risco,
conclui uma auditoria agora tornada pública por uma comentadora televisiva, o
banco de Estado emprestou 2,96 mil milhões de euros e perdeu o rasto a 1,2 mil
milhões. Quase metade, portanto. Assinalável é que, de entre esses créditos
ruinosos que mancham sobretudo os mandatos de Santos Ferreira e Faria de
Oliveira, houve sete grandes clientes que não devolveram um cêntimo do montante
que lhes foi dispensado. Perdas totais de largos milhões. Que garantias terão
dado aos gestores da Caixa? Um envelope cheio de ar?
Olhar para esta bem urdida teia
de poder é tão mais aviltante quanto se percebe que, aos 15 anos de festim na
Caixa, o Banco de Portugal respondeu como no naufrágio do BES: fez-se de morto.
Provavelmente, porque devia estar a supervisionar a velocidade a que caem as
folhas das árvores no outono. Ou porque confia em demasia nos banqueiros.
Caberá agora ao Ministério
Público ir ao fundo desta gaveta sinistra em busca de indícios criminais. Mas o
Governo tem a obrigação política e moral de, em sede própria, exigir
responsabilidades a quem tão negligentemente brincou com o dinheiro dos
contribuintes. O que não foi devolvido e o que tivemos de desembolsar depois
para acorrer a novas distrações do supervisor. Desde logo no Novo Banco, onde
as imparidades (dinheiro que se esfumou), ascendem a 5,7 mil milhões de euros.
Um caixão ao pé da Caixa.
*Diretor-adjunto do JN
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