quinta-feira, 2 de maio de 2019

1.º de Maio?


Cristina Azevedo | Jornal de Notícias | opinião

A exposição comemorativa do 25 de Abril que a Câmara Municipal do Porto organizou com extraordinárias fotografias de Sérgio Valente, e que ainda pode ser visitada por estes dias, mostra que aqui como em Lisboa e um pouco por todo o país, a verdadeira comoção que brotou do encontro fraternal de todos com todos na rua aconteceu, não a 25 de Abril, mas no 1º de Maio de 1974.

São comoventes as imagens da multidão que encheu os Aliados e ainda hoje, ao olhá-las, sinto a certeza com que todos e cada um queriam mudar o Mundo.

Quarenta e cinco anos volvidos, o dia que ontem se celebrou, é cada vez menos mobilizador e, pior, está cada vez mais despido de significado.

A baixa sensível (em todos os países da Europa) das taxas de sindicalização fazem dos atuais desfiles verdadeiras relíquias sociais.



As palavras de ordem agarradas a noções de trabalho e de trabalhador cristalizadas são como uma espécie de língua morta, o latim do PCP.

E o cartaz com buracos e dois paus a par com o altifalante roufenho, uma estética a roçar o neorrealismo cinematográfico.

Horários de trabalho, condições de trabalho, trabalho igual, salário igual, sinistralidade laboral, são noções em rápido desaparecimento e já sem eco nas gerações mais novas.

As novas profissões prescindem do local de trabalho, da progressão salarial e funcional, da comparação em função do género, da segurança do emprego.

As novas profissões são vistas como gestão de projetos, muitas vezes remotamente realizados, valorizadas essencialmente pelos resultados e com parâmetros de comparação entre elementos de grupos ultraespecializados muito para além das questões de género.

Os direitos que se reclamam extravasam a relação empresa/trabalhador. Exigem-se organizações socialmente responsáveis, ambientalmente sustentáveis e economicamente justas.

E os deveres que se assumem estão igualmente em linha com estes novos patamares de leitura de um Mundo que se sabe interligado.

Por isso não vemos jovens nestes nossos dias 1 de Maio.

Simplesmente olhamos com ternura para os que passam na Praça. Os mesmos que em 1974 acreditaram que podiam mudar o Mundo.

*Analista financeira

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