segunda-feira, 20 de maio de 2019

Com uma mão dão pouco e com a outra tiram muito


Tal como o Banco Mundial, também o Fundo Monetário Internacional (FMI) foi fundado, em 1944 (ainda no decurso da II Guerra Mundial), na Conferência de Bretton Woods (New Hampshire), pelos EUA e pelo Reino Unido. O FMI foi operacionalizado, a partir de 1947, tendo, até finais dos anos 60, o ouro-dólar como padrão comum.

O sistema adoptado recomendava o desenvolvimento económico, através do comércio livre, pressupunha a existência de uma taxa de câmbio fixa (mas ajustável), de modo a impedir a especulação e contribuir para o desenvolvimento de uma economia mundial enfraquecida pela guerra. Quando os EUA se viram impossibilitados de trocar ouro por moeda, ao preço de 35 dólares/onça (uma onça é igual a 28,35 gramas), o sistema foi abandonado.

Na opinião pública geral confunde-se o Banco Mundial com o FMI. As duas são instituições financeiras internacionais. No entanto, apresentam contrastes marcantes, já que diferem nas suas culturas, estilos e missões que levam a cabo. O Banco Mundial está vocacionado para a erradicação da pobreza, enquanto o FMI se preocupa essencialmente com a estabilidade mundial. O propósito deste último é o de promover a cooperação monetária internacional e o crescimento do comércio internacional, bem como estabilizar a variação cambial. 


Com sede em Washington, o FMI concede empréstimos a países membros que se encontrem em dificuldades económicas, exigindo da parte destes o cumprimento de certas regras e a aplicação rigorosa de medidas tendentes ao melhoramento das respectivas economias. A necessidade de recursos dos países em desenvolvimento leva-os a solicitar ajuda externa e financiamentos subsidiados para atender a parte das suas necessidades de investimento. Porém, o Relatório do UNICEF sobre a “Situação Mundial da Criança” de 1992, refere que a crise da dívida atingiu agora um nível tão absurdo que os países em desenvolvimento são obrigados a transferir recursos financeiros para os países industrializados, quando deveria ocorrer o inverso. 


O sociólogo Carlos Lopes, no seu livro “Compasso de Espera; o fundamental e o acessório na crise africana”, afirma que, em 1992, a acumulação dos atrasos no pagamento da dívida africana já representava 32% das exportações de toda a África sub-sahariana. Só “entre 1986 e 1993 as políticas do FMI levantaram 4 mil milhões de dólares da economia africana”, especifica Louis Emmerinj, ex-presidente do Centro de Desenvolvimento da OCDE – Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económico – na sua obra “Norte-Sul: A granada descavilhada”. Também R. T. Naylor, autor do livro “Hot Money” (Dinheiro Quente) refere: “quando o FMI empresta dinheiro a um país pobre para ajudá-lo a superar os momentos de crise, assume o controlo da sua economia. Obriga-o, sobretudo, a obter lucro no comércio internacional (exportando mais do que importando), a fim de pagar, teoricamente, os juros e a dívida dos credores estrangeiros”. 

O método que o FMI impõe ao país para atingir esses objectivos, é enfraquecer o poder de compra das populações, para que sobrem mercadorias para exportar. Isso é conseguido através dos seguintes meios: dificultar o crédito para que as empresas nacionais e o povo tenham menos dinheiro; aumentar os impostos; reduzir as despesas governamentais em serviços sociais (para que, por exemplo, os reformados ganhem menos); desvalorizar a moeda nacional para que os produtos importados custem mais caro e os exportados fiquem baratos para os outros países. Facilmente se constata que, ao desvalorizar a moeda nacional, o país “ajudado” pelo FMI abre as portas para que os interesses económicos de outros países adquiram as suas riquezas a custos bem mais baratos. Com uma mão dão pouco e com a outra tiram muito. 

R. T. Naylor comenta que os programas do FMI foram “desastrosos”, pois “minimizaram as perspectivas para o desenvolvimento a longo prazo e fizeram descer os níveis de vida para todos, excepto para os que têm mais posses financeiras e viabilidade para depositar dinheiro em bancos estrangeiros, valorizados pelas receitas do FMI. A convicção de José Manuel Zenha Rela, economista recém-falecido que viveu durante muitos anos em Angola, era a seguinte: “Ajuda-se um país, dá-se-lhe algum crédito, promovem-se mesmo alguns investimentos privados, porque está na moda fazê-lo. Passa a moda, encontra-se outro objecto e a ajuda desaparece, os créditos cessam, o investimento cai. Gastam-se, deste modo, recursos em “missões de bons ofícios” para ajuda aos países em desenvolvimento e para o pagamento de consultores que cobram novos honorários e sistematicamente chegam às mesmas soluções. 

* Ph. D em Ciências da Educação e Mestre em Relações Interculturais

- em Jornal de Angola | opinião | sem indicação de autor

Sem comentários:

Mais lidas da semana