sexta-feira, 21 de junho de 2019

João Lourenço cumpriu a promessa de "colocar sal na gasosa"?


Durante a campanha eleitoral de 2017, o então candidato do MPLA João Lourenço prometeu combater a corrupção. Analistas mostram-se reticentes quanto ao cumprimento desta promessa e falam em "justiça seletiva" em Angola.

Foi precisamente em junho de 2017, durante a campanha eleitoral, na província angolana do Zaire, norte de Angola, que o atual Presidente João Lourenço prometeu "colocar sal na gasosa", ou seja, combater a corrupção - algo que está presente em quase todos os setores da vida do país.

Para além do termo "gasosa", os cidadãos angolanos também utilizam a palavra "micha" para se referirem à corrupção que, se regista, sobretudo, na relação entre o agente da polícia e o cidadão.

Será que João Lourenço já fez o que prometeu? "Não há sinais de que o combate a corrupção tenha produzido efeitos. Aliás, há um combate tímido", responde o o jornalista angolano Ilídio Manuel.

"Não se tem, por exemplo, conhecimento de uma figura de proa, os tais chamados marimbondos, que tenham sido condenados em tribunal. O que temos são processos que estão a decorrer e, em alguns dos casos, os réus estão em prisão domiciliária", exemplifica.

Um destes cidadãos em prisão domiciliária é o antigo responsável do Fundo Soberano de Angola, José Filomeno dos Santos, filho do ex-Presidente José Eduardo dos Santos. Se for condenado, a defesa deverá interpor recurso e normalmente estes casos levam algum tempo, lembra Ilídio Manuel, o que, por si só, não acelera o combate ao fenómeno, acrescenta.


"Justiça seletiva" 

Por outro lado, o jornalista angolano suspeita que exista uma "justiça seletiva" na responsabilização de alguns titulares de cargos públicos implicados em atos de corrupção ou branqueamento de capitais. "O que temos vindo a assistir também - e que levanta muitas suspeitas - é uma espécie de justiça seletiva. As figuras conetadas com o ex-Presidente da República têm sido visadas e aquelas que passaram para o lado de João Lourenço, que são marcadamente corruptas, não estão a ser perturbadas do ponto de vista criminal e cível", diz.

O analista Osvaldo Mboco, professor da Universidade Técnica de Angola (UTANGA), também suspeita que haja casos de "justiça selectiva" no país. "É fundamental que este combate contra a corrupção não seja um combate seletivo, não seja um combate de uns e outros não", defende.

Osvaldo Mboco considera que a "cruzada contra a corrupção e a impunidade" levada a cabo pela justiça e o Presidente João Lourenço tem tido um efeito intimidatório nos governantes da nova era, mas lembra que deverá levar ainda algum tempo para se reduzir o índice.

"Hoje, o servidor público tem muito mais cuidado na gestão do erário público, está ali para servir e não o contrário. Mas também não podemos dizer que os esquemas de corrupção já não existem. Existem, em pequena ou em média escala, diferente em relação ao passado, mas existem. A corrupção não vai acabar. O que se quer é mitigar e reduzir os níveis de corrupção", afirma.
Corrupção endémica: Luta é de todos

Por isso,o analista  defende a necessidade do envolvimento de todos para lutar contra a chamada corrupção sistémica e endémica na sociedade angolana: "Temos de entender que o combate a corrupção em Angola não é única exclusivamente uma tarefa do Presidente João Lourenço. É um trabalho que pertence a toda sociedade".

No princípio deste mês, a Direção Nacional de Prevenção e Combate a Corrupção da Procuradoria-Geral da República (PGR), enviou uma série de mensagens para os telemóveis dos cidadãos a apelar: "Juntos por uma Angola sem corrupção. Diga não à corrupção. Denuncie!"

Mas, para Osvaldo Mbonco, a PGR angolana precisa de fazer mais. "Há necessidade de levar palestras para as escolas, mercados e orfanatos. Debater-se, discutir-se e informar a geração mais nova que é fundamental cuidar do que é património de todos com espírito de patriotismo acima de tudo, com espírito de dedicação e entender que as pessoas são serviçais da própria nação. A estratégia de combate a corrupção da PGR tem que sair do papel para ação", salienta.

Manuel Luamba (Luanda) | Deutsche Welle

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