Passado dos assassinos em massa
nos EUA revela algo em comum: a masculinidade tóxica. Maior parte já tinha
praticado violência contra mulheres — ou nutria ódio por elas. Acesso a armas
de fogo completou coquetel mortal
Gabriela Leite | Outras Palavras |
Imagem: Rick Sealock
Assassinatos em massa por
atiradores são episódios quase típicos da cultura norte-americana. Alguns
consideram que a tendência começou com o massacre que ocorreu em 1966, quando
um homem subiu na torre da Universidade do Texas e abriu fogo indiscriminado
contra quem estava nas redondezas — matando 13 e ferindo 31 pessoas. Horas
antes, havia esfaqueado sua mãe e esposa. Algumas centenas de massacres com
características semelhantes vêm acontecendo ao longo das décadas, no país em
que é possível comprar armas em supermercados. Há algo que os aproxima: são
maioritariamente praticados por homens brancos.
Mas um outro componente foi recentemente identificado por pesquisadores, segundo o New
York Times: a grande maioria dos atiradores em massa têm, como pano de fundo,
um histórico de ódio e violência contra mulheres.
Sim, uma parte deles são os incels.
Em 23 de abril do ano passado, um homem jogou uma van contra pedestres nas ruas
de Toronto, no Canadá, e chamou o ato de “rebelião incel”. Ao fazê-lo, chamou a
atenção para as comunidades virtuais de jovens que se autointitulam
“celibatários involuntários” (por isso o encurtamento in-cel, em inglês). Acumulam frustração por não conseguir se relacionar sexual ou amorosamente, e
voltam sua fúria contra as mulheres — como se fossem elas as culpadas por serem
indesejados. Usam a rede para se estimular reciprocamente a extravasar este
sentimento cometendo assassinatos em massa.
Mas esse fenómeno recente mostra
apenas um aspecto da misoginia presente nos assassinos atiradores em massa. A
masculinidade tóxica está por trás de grande parte deles, aponta a
revista estadunidense Mother Jones: têm histórico de violência familiar,
de perseguição a mulheres com quem se relacionaram, ou de declarações machistas
de ódio contra as mulheres. O NY Times lista alguns dos casos: no
último ataque de grande repercussão, que aconteceu no início de agosto no
estado de Ohio, o atirador fazia brincadeiras e ameaças violentas com suas
colegas mulheres. O responsável pelo massacre marcado pela homofobia na discoteca em Orlando, em 2016, batia em sua mulher enquanto ela estava grávida. Em 1991,
um homem que entrou em um café, no Texas e matou 22 pessoas — mirando
principalmente mulheres — havia escrito uma carta chamando suas vizinhas de
víboras. A lista é longa, e pesquisadores afirmam que alguns padrões
psicológicos de atiradores em massa misóginos são muito parecidos com os de
supremacistas brancos e outros terroristas.
Esses estudos demonstram como é
preciso que se leve em conta essa relação entre misoginia e assassinatos em
massa na hora de pensar políticas públicas, como leis que restrinjam a posse de
armas a homens com históricos de agressão a mulheres. No Brasil, os casos de
massacres de atiradores ainda são isolados, mas, se depender do presidente que
foi eleito fazendo gesto de arma com as mãos, não devem tardar a ficarem mais
comuns. Machismo, frustração e repulsa ao próximo não faltam, aos fiéis do
bolsonarismo.
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