O secretário-geral do PS fez
sistemáticos apelos à estabilidade política após as eleições, colocando o seu
partido como o ponto de equilíbrio do sistema, numa campanha em que os
socialistas apanharam com "estilhaços" de casos judiciais.
Ao longo da campanha, António
Costa manteve a sua ideia de recusar colocar a fasquia eleitoral do PS na
maioria absoluta, mas, em contrapartida, fez sucessivas advertências sobre os
riscos de os socialistas saírem das eleições de domingo próximo em posição de
dificuldade para negociarem a formação do novo Governo.
Em nenhum momento da campanha, o
líder do PS falou especificamente sobre a complexidade de um Bloco de Esquerda eleitoralmente reforçado,
sobretudo em contraste com o PCP - e quanto isso pode complicar a
formação do novo executivo.
Porém, como fez em Coimbra, nesta
segunda-feira, António Costa referiu-se ao contraste entre a
"moderação" do PS e o estilo radical das "bravatas" com o
Presidente da República em torno da Lei de Bases da Saúde, ou com a União
Europeia em matéria de renegociação unilateral da dívida.
No fundo, António Costa recuperou
a teoria dos anos 90 de António Guterres, segundo a qual só com diálogo e com
consensos sociais as coisas podem verdadeiramente avançar no país.
"Alguém acredita
verdadeiramente que sem o PS o país teria simultaneamente virado a página da
austeridade e recuperado a credibilidade internacional, que teria
simultaneamente recuperado os rendimentos e manter a confiança no investimento,
teria reduzido as desigualdades e alcançado contas certas. Não, sem o PS isto
não teria sido possível, porque este partido é desde a sua fundação o garante
da estabilidade, do equilíbrio, da concórdia e da capacidade de diálogo e de
compromisso", sustentou.
O PS, segundo Costa, é o partido
mais vocacionado para a concertação social e para com espírito de
compromisso "compatibilizar" a maioria [de centro e centro-direita]
que elegeu o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, com a maioria à
esquerda no parlamento.
Com António Costa a evitar
envolver-se em confronto direto com os seus parceiros parlamentares,
o Bloco de Esquerda ou o PCP, coube antes ao socialista Augusto Santos
Silva apontar quais os "riscos" inerentes a uma alteração substancial
da atual correlação de forças entre o PS e os seus bloquistas.
"Aqueles que têm dúvidas
sobre o respeito pelas condições do pagamento da dívida, aqueles que querem que
Portugal gaste 30 mil milhões de euros em nacionalizações, aqueles que
desvalorizam as contas certas, esses não podem ter um poder desmedido. Esses
não podem ter uma influência desmesurada na próxima legislatura", declarou
o ministro dos Negócios Estrangeiros.
O dirigente histórico socialista
Manuel, da ala esquerda do partido e que até foi apoiado pelo Bloco de Esquerda
na sua segunda candidatura presidencial (2011) , deixou avisos no mesmo
sentido: "Não há estabilidade sem um PS forte; não há diálogo nem
convergência sem um PS forte; não há solução governativa sem o PS e muito menos
contra o PS. Não nos arrependemos da Geringonça, mas também não precisamos de
professores de esquerda", afirmou o escritor socialista.
Sobretudo na última semana de
campanha, o secretário-geral do PS foi mais direto nos ataques ao PSD,
deixando sempre a ideia de que um Governo da direita poderá reverter parte das
medidas sociais tomadas ao longo dos últimos quatro anos.
O ataque mais direito "à
direita" portuguesa, no entanto, partiu do cabeça de lista socialista em
Aveiro, Pedro Nuno Santos, que recorreu a uma dialética de inspiração
marxista para traçar diferenças entre socialistas e capitalista, entre o PS e o PSD e CDS-PP.
"Na verdade, não fizemos as
reformas que a direita teria feito se governasse. Mas a direita não teria
aumentado o salário mínimo, não teria reduzido o IRS para a classe
média, não teria aumentado as pensões, não teria tornado os manuais escolares
gratuitos, não teria baixado o preço dos passes sociais para os transportes,
não teria combatido a precariedade laboral, não teria aumentado o
abono de família e não teria descongelado as carreiras da administração
pública, nem criado uma nova geração de políticas de habitação. Estas são as
nossas reformas, não são as deles", declarou.
Numa campanha pouco intensa,
geralmente com duas ou três iniciativas por dia e cheia de mudanças de programa
de última hora - ou por causa de dores musculares de António Costa, como
aconteceu em Viana do Castelo, ou por causa da agenda de primeiro-ministro,
caso da passagem do furacão "Lorenzo" pelos Açores -, o PS foi
confrontado com dois casos judiciais.
Primeiro, foi a demissão do secretário
de Estado da Proteção Civil, Artur Neves, na sequência das
investigações judiciais a adjudicações para a aquisição de equipamentos para
combate a incêndios. Depois, já em plena campanha, o ex-ministro da Defesa Azeredo Lopes
foi formalmente acusado no caso do encobrimento da operação de recuperação das
armas roubadas na base militar de Tancos em junho de 2017.
Nos bastidores da comitiva
socialista, falou-se de uma ilegítima interferência do Ministério Pública na
campanha eleitoral para prejudicar o PS. António Costa, porém, nas declarações
aos jornalistas, não foi mais longe do que fazer referências ao facto de ser
necessário aguardar pelo "tempo da defesa" [de Azeredo Lopes]
e pelas futuras decisões dos juízes desse processo.
Neste caso de Tancos, António
Costa manteve a tese de que pessoalmente desconhecia a forma como as armas
foram recuperadas, criticou quem tentou envolver o Presidente da República no
processo, repetiu a ideia da separação entre os poderes judicial e político, e
aproveitou antes para condenar a atuação do presidente do PSD,
considerando-a lamentável e contraditória com a posição de princípio de Rui Rio
contra julgamentos na praça pública.
Mas o ataque mais duro a Rui Rio
António Costa deixou-o para o presidente do PS, Carlos César, que acusou o
líder social-democrata de "sentenciar quem não foi julgado e caluniar quem
não é suspeito".
Em termos de mobilização, a direção do
PS tem salientado que os socialistas, ao contrário do PSD, têm comícios em
todas as noites dos dias de campanha.
No entanto, a mobilização do PS
nas ações de rua, ou mesmo nos comícios, não terá ultrapassado os
níveis das eleições legislativas de 2015 e estão muito longe dos de 2005 ou
2009 - isto para não fazer comparações com as campanhas de António Guterres de
1995 ou de 1999.
Notícias ao Minuto | Lusa | Foto: © Reuters
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