sexta-feira, 15 de novembro de 2019

Amianto, um problema atual


Íria Roriz Madeira | Jornal de Notícias | opinião

Está ainda em todo o lado e não é só no fibrocimento. Existe em tintas texturadas, pavimento vinílico em mosaico, mosaico hidráulico, tetos falsos, divisórias, nos fios de eletricidade e condutas, apenas para enumerar alguns dos materiais. Pelo facto de ter sido proibido a partir de 2005 existe a sensação de que o amianto é um problema do passado. Efetivamente não é assim. Na euforia da reabilitação, nas últimas décadas, muitos resíduos de construção e demolição contendo amianto foram seguramente encaminhados e tratados como resíduos não perigosos contaminando meio ambiente e expondo transeuntes e trabalhadores a uma matéria cancerígena.

Das profissões consideradas de risco no manuseamento deste material o arquiteto, apesar de estar na linha da frente no processo da edificação, não é, ainda, tido em conta. Este é o agente de mediação entre a obra, dono de obra e empreiteiro. A forma como em Portugal a obra é tratada deixa espaço para alguns erros: desde o dono de obra que acredita poder levar a cabo a reabilitação do seu espaço sem contratar profissionais (ou chamando apenas o empreiteiro), ao empreiteiro que deixa os resíduos de construção e demolição (RCD) em locais ilegais e sem triagem, não propiciando a sua valorização onde possível. Há ainda uma grande falta de formação em particular e iliteracia no geral, no que diz respeito aos intervenientes deste setor de atividade (construção civil). Estes desconhecem os perigos a que estão expostos e a que expõem transeuntes e habitantes. De forma transversal parece ainda haver uma desvalorização do papel e trabalho do arquiteto, que fica confinado ao de desenhador quando o alcance do seu saber permite a integração das várias áreas e o planeamento da obra. No que diz respeito ao conhecimento dos materiais, por exemplo, este tem ainda, historicamente, o saber da prática aplicada à utilização dos materiais em diversos contextos e locais privilegiando a identidade do espaço onde se justifica ou delatando a presença de materiais tóxicos ou contextos inadequados.

O desconhecimento sobre a existência e consequências do contacto com esta substância pode originar erros fatais no entanto parece estarmos a descansar sobre o hiato de tempo em que esta demora a ser detetada. O período de latência das doenças provocadas pelo amianto vai de 10 a 60 anos. Num intervalo de tempo tão alargado a associação da causa da doença à exposição a este tipo de material pode ser tarefa árdua. Sendo os mesoteliomas e as asbestoses hoje seguramente ligados à exposição ao amianto, vários tumores podem ser diagnosticados sem, no entanto, se conseguir diretamente associação à sua presença desde o cancro do pulmão, ao gastrointestinal, esófago ou ovários.

Segundo a Organização Mundial de Saúde não há um número mínimo de partículas de amianto abaixo do qual possamos considerar a nossa exposição segura. A possibilidade de qualquer um de nós ter sido exposto ao amianto é enorme. Bastaria vivermos, termos vivido ou trabalhado em edifícios construídos entre 1940 e 2005 onde podem existir materiais que contêm esta matéria perigosa, termos frequentado uma escola ou passarmos com frequência junto a um desses equipamentos com as placas de fibrocimento degradadas, sermos frequentadores de um edifício público com amianto em condutas, vivermos numa casa reabilitada onde se conservou o mosaico hidráulico ou termos contacto com o vinílico do pavimento do centro de saúde que frequentamos com os nossos filhos e pais para estarmos sujeitos ao risco de contaminação. O Amianto está, potencialmente, em todo o lado.

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