Aqui está o Curto do Expresso
Bilderberg. Hoje é Vítor Matos que o “deita” cá para fora. José Mário Branco é
a “vedeta fúnebre”. Uf! Exclamarão de si para si e para amigos de confiança dos
seus grupos. “Que alívio”. Este já feneceu e passou para o “outro lado”, já
aqui não está para desinquietar a sociedade alienada que o neoliberalismo tem
formado e atualmente continua a formar com muito mais força.
Por outro lado, publicamente,
dizem e escrevem a lamentar a morte do maldito comunista, do maldito revolucionário. A hipocrisia está-lhes
no sangue. São os chicos-espertos que por aí abundam. São imensos dessa estirpe
que vão para os governos, para deputados, que abundam na política da esquerda à
direita. Tudo para se “safarem” na vida. “Maduros” que se vendem por troca de
uma vida melhor, muito melhor e de poderes esconsos que quase sempre lhes dá o
benefício de praticarem trafulhices e crimes que quase sempre são contemplados
pela impunidade.
Os “lamentos” e os “elogios” desses acerca de José Mário
Branco, cheiram a tanta falsidade que o ar desde ontem está empestado, mal
cheiroso. Sim, porque a hipocrisia e o “fazer de conta” também emana odores…
desagradáveis. Evidentemente.
Faleceu um grande homem? Não.
Pessoas como José Mário Branco nunca morrem. Hão-de viver sempre na memória e
nas sociedades dos que os conhecem e dos que os conhecerão pela história, pelo
que eles significam nas vidas terrenas e significam nas suas vidas eternas. Em
cultura, em justiças, no combate pela liberdade e democracia defacto e não
aquela com que nos pretendem iludir hoje, agora e sempre, até os povos consentirem.
Ele veio de longe e vai para
longe mas deixa-nos um enorme legado, assente na luta quotidiana de justiça e
liberdade. Por isso ele viveu e vive nos que sentem a mesma inquietação que não
é só dele mas de todos nós.
Expresso Curto a seguir. Sem
recomendações, nem reparos. Leia tudo. Só isto, simplesmente.
Bom dia, se conseguirem.
MM | PG
Bom dia este é o seu Expresso
Curto
“Desnasceu” o cantor, fica a
“inquietação”
Vítor Matos | Expresso
Bom dia!
“Quem é que não se calava, pá,
meia dúzia de líricos que acabavam todos a fugir para o estrangeiro”, pois,
eram alguns dos que com ele escreviam lá fora líricas revoltadas e não ficavam
calados, “ao menos agora pode-se falar…”, depois do 25 de Abril, claro, mas
para dizer o quê, senhores, “éfémi!..”, gritar que um país inteiro enfiou “a
cabeça na areia” - “´éfémi’, não há
lenha que detenha o ‘éfémi” -, via-se que isto não andava “porque a
malta não quer que esta merda ande”, citava com ironia numa arenga de raiva
interminável, porque “as palavras são bolinhas de sabão”, mas na verdade não
são, que as dele não rebentaram e eram balas, “descontrai baby, descontrai”,
que este que ali canta mais de vinte minutos seguidos naquele disco velho,
ícone dos revolucionários, dos derrotados do 25 de Novembro, a gritar contra o
FMI, que quando voltou já o apanhou mais velho mas não sem
"inquietação", era português, do Porto, “pequeno burguês de origem,
filho de professores primários, artista de variedades, compositor popular,
aprendiz de feiticeiro” com falta de dentes, e chamava-se José Mário
Branco. “Desnasceu” ontem, como gritou no fim dessa performance desencantada: “Mãe
eu quero desnascer…”
Aos 77 anos, morreu o “barítono-grave” emblema musical da esquerda miitante, que foi comunista e passou à extrema-esquerda, e que numa longa entrevista de vida à Blitz em junho de 2018 disse que “esta coisa podre em que a gente vive, este mundo tão feio” fazia com que já não se sentisse “bem a cantar as coisas do costume” em palco. Mandou os admiradores ouvirem os discos, coisa que nunca deixaram de fazer. Símbolo da música de intervenção, herdeiro de Zeca Afonso como Fausto ou Sérgio Godinho, fez da cantiga “uma arma”, foi preso pela PIDE, fugiu à Guerra Colonial, exilou-se em França entre 1963 e regressou depois do 25 de Abril, produziu outros músicos como Camané, e trabalhou para cineastas e encenadores.
Pode ver aqui em vídeo seis minutos da entrevista à Blitz no verão do ano passado: “É na morte ou é na vida que está a chave escondida do portão?”, ou aqui rever as melhores canções, e as fotografias.
Francisco Louçã, que o teve pelo PSR e pelo Bloco de Esquerda, escreveu no Expresso Diário de ontem: “Faltará sempre o que não se consegue dizer. Que detestou a podridão e que amou a vida. Que não tolerava cinismo e má fé. Que apontava a dedo o charlatão (...) Que foi genial.” O colunista Daniel Oliveira que se cruzou com ele há “três ou quatro dias”, recorda também no Expresso Diário que era o “cronista dos sonhos derrotados”.
Nos antípodas políticos de José Mário Branco, Marcelo Rebelo de Sousa fez-lhe mais do que a homenagem de circunstância e disponibilizou-se para o homenagear postumamente, se a família assim o entendesse: “Eu tentei [condecorá-lo] em vida, mas ele foi sempre muito reticente”, disse. “Foi sempre muito avesso a condecorações, a reconhecimentos públicos. Ele manifestou sempre, de forma muito bem-educada e discreta, que o que lhe importava era deixar um testemunho e fazer passar a palavra. O reconhecimento formal era menos importante.”
Na parte final do fim do “FMI”, cantou: “Neste cais eu encontrei a margem do outro lado, Grândola Vila Morena. Diz lá, valeu a pena a travessia? Valeu pois”. O velório começa hoje às 17h30 na Voz do Operário e o funeral será amanhã à mesma hora. “Silêncio porra!”
Aos 77 anos, morreu o “barítono-grave” emblema musical da esquerda miitante, que foi comunista e passou à extrema-esquerda, e que numa longa entrevista de vida à Blitz em junho de 2018 disse que “esta coisa podre em que a gente vive, este mundo tão feio” fazia com que já não se sentisse “bem a cantar as coisas do costume” em palco. Mandou os admiradores ouvirem os discos, coisa que nunca deixaram de fazer. Símbolo da música de intervenção, herdeiro de Zeca Afonso como Fausto ou Sérgio Godinho, fez da cantiga “uma arma”, foi preso pela PIDE, fugiu à Guerra Colonial, exilou-se em França entre 1963 e regressou depois do 25 de Abril, produziu outros músicos como Camané, e trabalhou para cineastas e encenadores.
Pode ver aqui em vídeo seis minutos da entrevista à Blitz no verão do ano passado: “É na morte ou é na vida que está a chave escondida do portão?”, ou aqui rever as melhores canções, e as fotografias.
Francisco Louçã, que o teve pelo PSR e pelo Bloco de Esquerda, escreveu no Expresso Diário de ontem: “Faltará sempre o que não se consegue dizer. Que detestou a podridão e que amou a vida. Que não tolerava cinismo e má fé. Que apontava a dedo o charlatão (...) Que foi genial.” O colunista Daniel Oliveira que se cruzou com ele há “três ou quatro dias”, recorda também no Expresso Diário que era o “cronista dos sonhos derrotados”.
Nos antípodas políticos de José Mário Branco, Marcelo Rebelo de Sousa fez-lhe mais do que a homenagem de circunstância e disponibilizou-se para o homenagear postumamente, se a família assim o entendesse: “Eu tentei [condecorá-lo] em vida, mas ele foi sempre muito reticente”, disse. “Foi sempre muito avesso a condecorações, a reconhecimentos públicos. Ele manifestou sempre, de forma muito bem-educada e discreta, que o que lhe importava era deixar um testemunho e fazer passar a palavra. O reconhecimento formal era menos importante.”
Na parte final do fim do “FMI”, cantou: “Neste cais eu encontrei a margem do outro lado, Grândola Vila Morena. Diz lá, valeu a pena a travessia? Valeu pois”. O velório começa hoje às 17h30 na Voz do Operário e o funeral será amanhã à mesma hora. “Silêncio porra!”
Outras Notícias
Transparência opaca - Os nossos políticos não aprendem. Há uma nova comissão no Parlamento, que nasceu de um grupo de trabalho criado na passada legislatura e que se chama "da Transparência". Ora o socialista Jorge Lacão, presidente desse louvável novo agrupamento de deputados que deve fiscalizar os própios parlamentares em nosso nome, defende que as reuniões para a "discussão de qualquer assunto" possam ser à porta fechada, noticia o Público. É não perceber o mundo em que se vive, e fertilizar o terreno onde os "Venturas" possam crescer. À transparência diz nada...
'Special one' de volta - José Mourinho foi anunciado como novo treinador do Tottenham, depois de quase um ano no desemprego. O português, controverso, regressa a Inglaterra aos 56 anos para suceder ao argentino Maurício Pochettino no comando do clube londrino, anunciou hoje o 14.º classificado da Liga inglesa de futebol. Não tem uma tarefa como as que teve no passado, ser campeão nacional ou europeu, mas tirar a equipa do fundo da tabela.
Listas de espera na Saúde - É uma história interminável que se sucede ano após ano, seja qual for o Governo em funções. "Dezenas de hospitais continuam sem conseguir cumprir os tempos máximos de espera em cirurgias e primeiras consultas de diversas especialidades meédicas", escreve hoje o Jornal de Notícias (sem link). Há 15 hospitais que, em determinada especialidade não cumprem os tempos e 22 que ultrapassam os tempos para operações oncológicas prioritárias. Marta Temido será a ministra sob maior pressão desta legislatura, porque a Saúde é o tema que mais preocupa os portugueses e onde tudo parece estar a desfazer-se.
"Ajuste Secreto com 68 acusados" - O Ministério Público de Santa Maria Feira deduziu acusação contra 68 arguidos, incluindo dez autarcas e ex-autarcas, quatro clubes desportivos (que não são identificados) e os seus respetivos presidentes, no âmbito da operação "Ajuste Secreto". Em 2017, a investigação levou o social-democrata Hermínio Loureiro, ex-presidente da câmara de Oliveira de Azeméis, a ser detido para interrogatório judicial. Agora está entre os acusados.
O perigo que vem da polícia - ter polícias radicalizados é um perigo. Amanhã realiza-se uma manifestação de elementos da PSP e da GNR em frente à Assembleia da República, onde participará o Movimento Zero, um grupo anónimo de polícias "zangados e revoltados", como explicam o Hugo Franco e o Rui Gustavo neste artigo publicado no Expresso Diário.
Greta Thunberg em Lisboa - a nova estrela global para o combate às alterações climáticas aceitou participar numa sessão na Assembleia da República entre o final deste mês e os primeiros dias de dezembro. José Maria Cardoso, deputado do BE que preside à comissão do Ambiente, explicou que "a sessão não tem data em concreto" devido a "condicionalismos" relacionados com o meio de transporte da ativista, que se desloca de veleiro.
E a herdade da Comporta vai com desconto... - de cerca de €9 milhões de euros, para as mãos de Paula Amorim e Claude Berda. Houve dois lotes de terreno que não foram adquiridos pelo consórcio comprador, daí o desconto. Hoje há uma reunião dos donos do fundo imobiliário para informar sobre o processo de venda, uma operação que deve rondar os 147 milhões de euros.
O que é a OPA sobre o Benfica? A Olivedesportos, de Joaquim Oliveira, e José Guilherme, o construtor civil conhecido por ter oferecido 14 milhões de euros a Ricardo Salgado, são dois dos acionistas que podem vender as ações da SAD ao Benfica. Mas correm o risco de, se quiserem, não conseguirem vender todas. Esta é uma operação em que o clube paga 5 euros por título, quando, na segunda-feira, estes valiam 2,8 euros. Estas são algumas das conclusões que se podem retirar da OPA do Benfica à sua SAD, explica aqui o Diogo Cavaleiro na Tribuna.
E o CDS, sobrevive? Manuel Monteiro, ex-líder do CDS e fundador da extinta Nova Democracia, dá hoje uma entrevista ao "Público" a falar do seu regresso ao partido - que está a ser difícil de acontecer por veto de gaveta à sua refiliação. Monteiro diz que "o portismo não sobrevive sem Portas", resta saber se o CDS sobrevive a si próprio. Para já, não há muitos interessados em tomar os comandos...
A utopia vegetariana - Em 1909, foi fundado o jornal “O Vegetariano”, publicado mensalmente durante 26 anos. Nasceu no Porto, durante o último suspiro da monarquia, atravessou a agitação da Primeira República e começou a definhar com a censura da Ditadura Militar e do Estado Novo. A pré-história do vegetarianismo em Portugal, pelo André Manuel Correia.
Lá fora...
A saga Donald continua... - não há melhor saga política para seguir neste momento, nem a Netflix se lembrou de um argumento tão viciante quanto (infelizmente) a realidade nos está a dar. O processo de destituição em curso de Donald Trump revela-nos que os Estados Unidos têm um traidor dos interesses do país aos comandos. Ontem, mais uma revelação: o assessor da Casa Branca Alexander Vindman disse que considerou "incorreto e inapropriado" o telefonema do Presidente dos EUA com o seu homólogo ucraniano, Volodymyr Zelensky, durante o inquérito para o 'impeachement' de Trump.
E a saga 'Brexit' com nova temporada - Aproximam-se legislativas no Reino Unido, onde Boris Johnson procura a sua primeira vitória depois de derrotado em toda a linha, sucessivamente, no Parlamento. Ontem foi dia de debate entre o líder conservador e Jeremy Corbyn, o líder trabalhista. E acabou empatado, conta a Ana França. "Corbyn teve uma boa prestação mas ainda não foi desta que destronou Boris Johnson". O conservador conseguiu tornar mais claras as inconsistências ideológicas de Corbyn sobre o Brexit mas o público riu-se quando afirmou ser um homem que valoriza a verdade.
A China vacilará? "O que vai acontecer em Hong Kong?", pergunta neste artigo a jornalista do Expresso Mafalda Ganhão. Ninguém sabe. "Cinco meses após o início dos protestos, a contestação pacífica deu lugar a uma escalada de violência ainda sem fim à vista, com consequências que vão além dos feridos, das detenções e das montras partidas, tornando-se palpáveis na própria economia do território - o PIB da região administrativa chinesa registou uma quebra de 3,2% no terceiro trimestre, face aos três meses anteriores, o que equivale a falar em recessão técnica. Voltará tudo a ficar como antes?" Dificilmente.
Pelo menos 106 mortos nos protestos no Irão - O balanço é da Amnistia Internacional que cita “relatos credíveis” e acrescenta que “alguns relatos sugerem que cerca de 200 pessoas terão sido mortas”. As manifestações contra o aumento do preço dos combustíveis começaram na sexta-feira e rapidamente se espalharam a pelo menos 100 cidades. Teerão fala em “alegações infundadas e números fabricados.”
A contestação globalizou-se? “As manifestações em Paris, Hong Kong, Beirute ou no Chile são movimentos espontâneos sem uma estrutura organizativa permanente”, defende um investigador do IPRI, e conta-nos esta manhã o Hélder Gomes que procurou ver se há um padrão nos protestos que grassam pelo mundo. “Não creio que estejamos diante de novas manifestações de lideranças ou de acefalias dos movimentos”, contrapõe a subdiretora do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE.
A novela Epstein - Dois guardas prisionais encarregados de vigiar o magnata Jeffrey Epstein (condenado por crimes de tráfico sexual) na noite em que se suicidou foram acusados de terem falsificado registos. A notícia foi avançada pela BBC, depois de a imprensa ter antecipado a possível acusação.
As frases
"[O José Mário Branco] tem
um papel charneira na história da música portuguesa. Era extremamente inquieto,
no sentido mais nobre do termo. A nossa amizade vem de final de 1967 e ficará
para sempre como parte da minha vida".
Sérgio Godinho, "Público"
"Uma coisa é irem alguns das classes mais altas para o [ensino] privado e outra é só ficar no público quem não tem possibilidade de escolha."
Luís Aguiar-Conraria,"Público"
"Temo que o radicalismo recorrente do discurso de Joacine Katar Moreira (...) possa ser lido como estimulador de um antiportuguesismo no seio das comunidades emigradas de outras etnias."
Francisco Seixas da Costa, "Jornal de Notícias"
Sérgio Godinho, "Público"
"Uma coisa é irem alguns das classes mais altas para o [ensino] privado e outra é só ficar no público quem não tem possibilidade de escolha."
Luís Aguiar-Conraria,"Público"
"Temo que o radicalismo recorrente do discurso de Joacine Katar Moreira (...) possa ser lido como estimulador de um antiportuguesismo no seio das comunidades emigradas de outras etnias."
Francisco Seixas da Costa, "Jornal de Notícias"
O que ando a ler
Este é aquele Curto em que só falo de Banda Desenhada e novelas gráficas, depois de me ter reabastecido no Festival da Amadora e, por coincidência, depois de ter ido a Bruxelas em trabalho e aproveitado para mergulhar em Le Depôt - a mais extraordinária livraria e alfarrabista de BD que conheço. Na terra de Hergé, encontrei um tesouro, “Les Damnés de la Commune” (Editions Delcourt) e mais uma adaptação de um clássico da literatura, do Crime e Castigo de Dostoievsky, que vai direto para a sub-colecção cujas últimas aquisições foram “Mataram a Cotovia” e “O DIário de Anne Frank”. Aqui fica um resumo e uma seleção do que ando a ler aos quadradinhos, esse mundo fantástico de narrativa, grafismo e desenho, que junta várias artes num ofício só.
Les Damnés de la Commune - é um trabalho avassalador: três volumes de luxo reunidos numa caixa, da autoria de Raphael Meyssan, e que contam a história da comuna de Paris através de gravuras da época. Ou seja, o autor reuniu centenas ou milhares de gravuras - publicadas a partir de 1871 - e transformadas em pranchas e vinhetas que através de uma narrativa com sentido cronológico nos contam a história que acaba na “semana sangrenta”. Se o texto pode ser uma recriação, as imagens mostram-nos como a própria época se via a si mesma. Trata-se de uma triologia notável, publicada entre 2017 e 2019 que merecia tradução em português.
Bug - Imagine que o mundo acordava sem internet amanhã. A nova distopia de Enki Bilal, passada em 2041, leva-nos para mais um daqueles mundos pós-apocalípticos - em que humanos viciados em implantes quase se fundem com máquinas -, a que a imaginação sem limites do autor já nos habituou. Os dois volumes, editados em Portugal pela Arte de Autor, confrontam-nos com digitalização de todos os aspetos da nossa vida, inclusivamente da saúde, e como caminhamos para uma sociedade tão insegura quanto mais dependentes estamos da tecnologia e das comunicações. Um dia tudo para. E nesse dia tudo muda. Como se uma bomba nuclear tivesse deflagrado. Problema: ficamos ansiosos pelo terceiro volume.
O Espírito do Escorpião - Um romance gráfico que é um eco da guerra da Bósnia. Os espanhóis Fernando Llor e Pablo Caballo, em traços muito negros e originais, contam a história de uma mulher infértil que estava a ser ajudada por um obscuro terapeuta e guia espiritual conhecido por Dragan Dabic. Afinal era Radovan Karadzic, o criminoso de guerra, líder sérvio-bósnio conhecido como o carniceiro dos Balcãs, condenado no Tribunal Penal Internacional a prisão perpétua por genocídio. Aliás, o subtítulo desta novela gráfica é “A Máscara do Genocídio de Srebrenica”. Este álbum editado pela Escorpião Azul é um grito perturbador contra o esquecimento.
Caravaggio, segunda parte - É a obra de um mestre sobre outro mestre: Milo Manara, mestre do erotismo, sobre a vida conturbada de um dos mais notáveis pintores renascentistas. A narrativa está documentada pela extensa bibliografia publicada no fim do álbum, como forma de dar credibilidade a uma aventura de vida tão inverosímil. Caravaggio era um pintor brilhante, mas também um boémio briguento com mortes no cadastro, tendo passado parte da sua curta vida em fuga ou à procura de proteção. Se o primeiro volume “Pincel e Espada” (Arte de Autor) já impressionava, este confirma a primeira leitura: Manara, que tem explorado ao longo dos anos os desejos mais secretos dos leitores, mostra-nos agora um segredo que podemos deduzir. Podia ter sido pintor noutra encarnação, e isso percebe-se pelas cenas sociais de época que pinta (desenha) em numerosas vinhetas, como se seguisse as escolas italiana ou flamenga. Não só nos conta a vida do pintor, como recria a forma como nasceram alguns dos mais célebres quadros do mestre da luz e da sombra.
Michel Vaillant, 13 dias - Nem sempre a acontece, mas os heróis envelhecem. Durante décadas, Michel Vaillant foi um jovem piloto de Fórmula 1 - na verdade, de todo o tipo de fórmulas - mas na nova série produzida por autores que não o criador Jean Graton, o personagem já tem uns 50 anos. Na procura pela verosimilhança, não se é eternamente jovem, o volume 8 (Asa) da nova saga acaba por perder alguma relação com a realidade, porque numa competição como a Fórmula 1 não há pilotos tão velhos muito menos a regressar com resultados. Mas Vaillant é um sobredotado, e nós gostamos de o ver aos comandos do… não, neste caso não é um Vaillante. Michel conduz um Renault na F1 atual, a substituir Hulkenberg que se lesionou. Não é o mesmo, mas é bom na mesma.
Filhos do Rato - Em cada edição do Festival da BD da Amadora, há mais autores portugueses a surpreender. Fábio Veras, que o ano passado já me tinha impressionado com o “Jardim dos Espectros”, surgiu este ano com “Filhos do Rato” (Kingpin Books), em parceria com Luís Zhang (argumento). É uma novela gráfica implicitamente política - há muitíssima BD a pegar em temas políticos - sobre um guineense que lutou na guerra colonial ao lado dos portugueses, uma perspetiva que não seria a mais politicamente correta. A história é contada em vários tempos narrativos para nos chocar com o nosso próprio passado e os traumas da guerra: dos portugueses, dos guineenses e dos guineenses chacinados depois de a guerra acabar.
Hoje fico por aqui, que já é muita conversa para quem está a começar a manhã: tenha um bom resto de semana e siga toda a atualidade nos sites do Expresso, Tribuna, Blitz e Vida Extra.
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