terça-feira, 26 de novembro de 2019

Portugal | O 25 de Novembro deve ser lembrado?


Pedro Tadeu | TSF | opinião

O 25 de Novembro não deve ser esquecido.

Não deve ser, em primeiro lugar, esquecido à esquerda, sobretudo aquela esquerda a que agora chamamos de esquerda radical, aquela que na época o país chamava de extrema-esquerda, a que se dizia estar ainda mais à esquerda do que o PCP, a esquerda da UDP e de outros grupos políticos que hoje se reúnem no Bloco ou em partidos menores.

Essa esquerda não deve esquecer os erros que cometeu e que a levaram à derrota na luta política de então.

A esquerda radical não devia esquecer o 25 de Novembro para se lembrar que responder a provocações armadilhadas pela direita é fazer o serviço à direita.

A esquerda radical não devia esquecer o 25 de Novembro para se lembrar que tentar conquistar o poder e impor uma nova sociedade, sem primeiro conquistar uma base mínima de apoio popular sólida, sem pensar antes de agir, é politicamente tão infantil, mas tão infantil, que até irrita!

A esquerda radical não devia esquecer o 25 de Novembro para se lembrar que o divisionismo, o sectarismo, as discussões internas parvas, a identificação de falsos inimigos e a intolerância não a levam a lado algum.

A esquerda radical não devia esquecer o 25 de Novembro para não cometer, 44 anos depois, os erros que a condenaram, durante décadas, à irrelevância política em Portugal.

Sou militante do PCP e acho que o meu partido também não devia esquecer o 25 de Novembro.

O PCP não devia esquecer o 25 de Novembro, porque a permanente reescrita e falsificação da história que os seus adversários insistem em produzir está a tentar empurrar os comunistas portugueses para o lugar de malfeitores políticos.

O PCP não devia esquecer o 25 de Novembro para que o país, por seu lado, não se esqueça que sem os comunistas, antes e depois do 25 de Abril, não veríamos inculcado no país o eixo central do ideal da nossa democracia e que junta liberdade, paz e justiça social como desígnio nacional.

Este ideal de democracia está, em muitos aspetos, longe de se alcançar, mas todas as forças políticas portuguesas, mesmos as mais novas, adotam esse objetivo comum que foi forjado, ao fim e ao cabo, durante o período revolucionário de 1975.

O PCP não devia, ainda, esquecer o 25 de Novembro para se lembrar que à sua direita política as alianças são só circunstanciais, e que haverá sempre quem queira trabalhar para a sua extinção, apesar do partido contar quase 100 anos de luta pelas classes trabalhadoras portuguesas.

O PS também não devia esquecer o 25 de Novembro.

O Partido Socialista liderou em 1975 um combate político onde todas as armas, todas as batotas, todas as mentiras foram utilizadas. Não foi bonito e o Partido Socialista atual, que tem belos pergaminhos democráticos, ainda não se confrontou com o lado negro da sua história, coisa que está sempre a exigir ao PCP. Por isso devia, também, lembrar-se do 25 de Novembro.

O PS não devia esquecer o 25 de Novembro para se lembrar, por exemplo, que o compromisso à esquerda, que durante o Verão Quente repetidamente recusou e que 40 anos depois, com António Costa, Catarina Martins e Jerónimo de Sousa aceitou, não é, afinal, um bicho de sete cabeças e que muitas vezes, nas circunstâncias políticas certas, pode ser a melhor solução para o país.

O PS não devia esquecer o 25 de Novembro para se lembrar de que há uma grande diferença entre o socialismo que traz no nome e as cedências que constantemente faz aos grandes interesses do capital (como se dizia em 1975) e que corrompem e destroem o equilíbrio da nossa sociedade.

Quanto à direita, essa adora recordar-se do 25 de Novembro, é um tema que incrivelmente une o PSD ao Chega, e não precisa que lhe lembrem da data.

Mas há uma coisa que a direita, o PSD, o CDS, a Iniciativa Liberal e o Chega, não deviam ignorar: não se pode equiparar o 25 de Novembro ao 25 de Abril, não se pode comparar o dia em que os portugueses se dividiram até à beira da guerra civil com o dia em que todos se uniram para obter a liberdade e cantarem, nas ruas, o lema "o povo unido jamais será vencido".

Para glosar Ramalho Eanes, o antigo Presidente da República e líder militar do lado vitorioso do golpe de há 44 anos, diria que devemos lembrar-nos do 25 de Novembro, mas não o devemos celebrar.

Para celebrar podemos hoje, talvez, dar todos, à esquerda e à direita, um viva ao 25 de Abril.
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Na imagem: Ramalho Eanes e Jaime Neves, com a CIA e a NATO colados à pele. A direita portuguesa e o PS agradeceram. Frank Carlucci, da CIA e embaixador dos EUA em Portugal, também se desfez em agradecimentos, até hoje. (PG)

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