Todo mundo no Facebook é meu
"amigo". Mesmo? A humanidade ainda não aprendeu a lidar com a
enxurrada de informações nas redes e, mais do que nunca, o antídoto é ligar o
espírito crítico, opina Christina Bergmann.
O presidente dos Estados Unidos
espalha teorias de conspiração desbancadas, o primeiro-ministro britânico
engana a Rainha, e um exército internacional de trolls tem agora uma razão de
existir: praticar desinformação nas redes sociais. O fim do ano 2019 não é um
bom momento para a verdade.
Joseph Goebbels, o ministro da
Propaganda de Adolf Hitler, estaria esfregando as mãos de satisfação. Enquanto
ele ainda precisou expressamente alinhar os meios de comunicação e mandar
prender jornalistas, os populistas de hoje têm jogo fácil: eles simplesmente
tuítam e postam inverdades e meias-verdades, sem cessar.
Seus seguidores compartilham os
absurdos às dezenas de milhares, e se apenas uma fração permanece nas cabeças
dos leitores, os demagogos já terão dividido a nação um pouquinho mais,
apertado um tanto mais os laços com seus adeptos. E a próxima vitória eleitoral
ficou um pouco mais próxima.
Quem olhe um pouco além da
própria bolha informativa nas redes sociais, por exemplo no Facebook, não vai
acreditar nos próprios olhos: "[A democrata americana] Nancy Pelosi
desviou 2,4 bilhões de dólares da Previdência Social para financiar o
processo de impeachment [contra Donald Trump]", berra uma manchete.
Basta um clique, e eu digo para o
mundo inteiro como isso me deixa furiosa. Mais um clique, e compartilhei a
escandalosa manchete. Como é que essa mulher pode roubar assim os pobres e dos
aposentados!
E no entanto, também basta um
clique para se chegar ao artigo por trás da postagem. E para quem seja só um
pouco cético e observe atentamente, logo fica claro: não só não pode ser
verdade, como não é verdade. O artigo consta da rubrica "Sátira
para tirar você do sério". E uma olhada no expediente do site revela:
"Tudo neste website é inventado [...] Se você acredita no que está aqui, é
hora de mandar examinar a cabeça."
Mas não adianta. A postagem é
compartilhada liberalmente, e colericamente comentada – o que, graças ao
algoritmo do Facebook, só faz que ela apareça no feed de notícias de mais
usuários ainda. É desesperador: como é que alguém pode acreditar numa maluquice
dessas?
É porque ainda não aprendemos a
lidar com a enchente de informação que as redes sociais fazem jorrar sobre nós.
Porque ninguém nos diz o que é importante ou não, o que é certo e o que é
errado. Tudo dá na mesma, tudo está no meu feed, o bom e o mau, o útil e o
nocivo. E, afinal de contas, todo mundo no Facebook é meu "amigo", e
eu acredito nos meus amigos.
Está na hora de denunciar essa
confiança cega e combatê-la, com uma coalizão ampla pela verdade e contra a
desinformação, as fake news, e por mais competência midiática. Já se veem
primeiros movimentos: o Twitter já tomou a iniciativa de proibir propaganda
política. Facebook e Google ainda se fazem de difíceis, porém não têm como
escapar de fazer jus à própria responsabilidade, se não quiserem ver o colapso
total da nossa sociedade.
Também a Deutsche Welle participa
de um projeto internacional que visa a checagem de fatos na internet e nas
mídias sociais, aliada à difusão de competência midiática. E aqui é a hora e a
vez de não só as empresas de mídia, mas também as instituições de ensino
agirem. O saber sobre os algoritmos do Facebook, imagens manipuladas e o uso
correto com as redes sociais tem seu lugar nas escolas e universidades, mas
também nos cursos de aperfeiçoamento dos locais de trabalho.
E, no fim das contas, cada um de
nós pode fazer algo. Não compartilhemos nada sem haver conferido, pelo menos
brevemente, se é verdade – para que nossos amigos possam confiar em nós. E
vamos aguentar as histórias de arrepiar os cabelos nos nossos feeds, manter o
contato com gente que pertence ao extremo do outro lado político. Podemos até
enviar-lhes coraçõezinhos por suas piadas inofensivas.
Mas também vamos lhes chamar a
atenção, pelo menos de vez em quando, quando eles estejam se inflamando com
mais um conto da carochinha moderno. E, acima de tudo: não desesperemos.
Christina Bergmann | Deutsche
Welle | opinião
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