domingo, 8 de dezembro de 2019

Angola | OS SAPOS DA UNITA


O presidente da UNITA, Adalberto da Costa Júnior, avisa que o seu partido não vai engolir sapos e que estará na linha da frente do combate por uma Angola para os cidadãos nem que, para isso, no limite, tenha de sair às ruas. Esperemos para ver e, como é hábito, vamos ficar sentados mas atentos. Se for para valer, estaremos também (é aí que estamos desde 1995) na linha da frente.

Na edição da passada sexta-feira, 6, do programa Angola Fala Só da VoA com a participação de muitos ouvintes e internautas, Adalberto da Costa Júnior acusou o MPLA de manter um regime partidarizado, que nunca condenou a fraude eleitoral, que mantém controlada a comunicação social pública e que divide a riqueza do país entre seus dirigentes.

“Não vamos engolir sapos, não senhor”, reiterou o líder da oposição ante uma pergunta directa de um internauta, nomeadamente sobre a fraude eleitoral que, para Adalberto da Costa Júnior, “tem sido prática do regime”, como sempre “foi denunciado pela UNITA”.

As eleições autárquicas e o programa da UNITA caso ganhe as legislativas em 2022 foram temas recorrentes do programa, com Adalberto da Costa Júnior a garantir que, apesar de como disse um internauta “o MPLA não querer realizar as autarquias”, “nós tudo faremos para que elas sejam realizadas”.


Para o líder da UNITA, o partido no poder “acostumou-se a governar na vertical, em que decide no topo e todos obedecem” e, por isso, não quer as eleições autárquicas”.

“As autarquias colocam o poder na horizontal e o MPLA tem medo da horizontalidade do poder” porque “os cidadãos são ouvidos e participam na gestão” da sua região, do seu município.

Por isso, “as eleições terão de realizar-se em todo o país” e não de forma gradual como quer o MPLA e “a UNITA não abre mão disso”, reiterou o líder do principal partido da oposição que o MPLA ainda permite que exista.

Nas respostas as questões concretas colocadas por ouvintes e internautas, Adalberto da Costa Júnior considerou que “quem incutiu o extremismo em Cabinda foi o Governo”, com a sua política de desrespeito pela população e “privilegiando a repressão ao diálogo”.

“Há pouco tempo vi uma manifestação extremada de mulheres em Cabinda”, precisamente por causa das políticas do MPLA, referiu.

O presidente da UNITA disse defender uma “ampla autonomia para Cabinda, como ponto de partida” para um diálogo com todos e prometeu visitar Cabinda no início de 2020.

Justificou, a pedido de um ouvinte, o facto de não ter estado naquela província durante a campanha por “dificuldades no acesso a um lugar nos aviões na data prevista”.

Quanto às Lundas, onde dois ouvintes descreveram a “situação de desrespeito pelos direitos humanos e pobreza generalizada, com os estrangeiros a enriquecerem com as nossas riquezas”, Adalberto da Costa Júnior foi duro contra o Governo que, segundo ele, “tem violado todos os direitos humanos, abandonando a população e distribuído as riquezas dos diamantes entre os dirigentes”.

A recente publicação do livro “Heroínas da Dignidade”, da jornalista Bela Malaquias, em que denuncia fortes violações de direitos humanos, entre outros crimes, do fundador da UNITA, Jonas Savimbi, levou internautas a pedir a Adalberto da Costa Júnior um comentário às “ameaças de morte contra a autora”.

“Essas ameaças não vieram da UNITA, que respeita a liberdade de expressão e de opinião de todos”, respondeu Adalberto da Costa Júnior, dizendo no entanto “não haver coincidência no facto do livro ter sido lançado depois de um congresso bem sucedido e a reabilitação da imagem do dr. Jonas Savimbi com o seu sepultamento”.

Adalberto da Costa Júnior reiterou que não foge a nenhum tema e que, por exemplo, vai integrar antigos generais da UNITA nas estruturas do partido, enquanto vai avançar com uma campanha de pressão para a integração dos antigos militares nas estruturas do Estado.

“O processo está pronto há muito tempo, na mesa do senhor Presidente da República, basta ele querer”, revelou o presidente da UNITA, que prometeu, caso não haja uma solução nos próximos tempos “recorrer aos tribunais angolanos, primeiro, e se não houver resposta, aos tribunais internacionais”.

Nas grandes políticas, Adalberto da Costa Júnior apontou como prioridades a educação, saúde, agricultura, economia, “sempre em auscultação dos angolanos que têm noção da situação” do país e, “no limite sairemos às ruas”.

E por falar em engolir… sapos

Em 2016, o então líder da UNITA, Isaías Samakuva, afirmou que estava a “engolir muitos sapos” para preservar a paz no país, face às constantes provocações que disse visarem o partido. E o Folha 8 perguntou na altura: Finalmente? Ou apenas fogo-de-vista?

O então líder da UNITA foi um dos convidados da conferência nacional sobre Paz, Democracia e Direitos Humanos em Angola, organizada pela Associação Mãos Livres, o Fórum das Mulheres Jornalistas e a Associação Justiça, Paz e Democracia (AJPD).

No painel sobre a visão dos partidos políticos na manutenção da paz e consolidação da democracia e dos direitos humanos em Angola, Isaías Samakuva defendeu que a promoção da paz tem muito a ver com os discursos.

“E nós notamos com insistência que há um discurso que dá a impressão que as pessoas têm saudades do conflito, da guerra, querem voltar à guerra”, disse Isaías Samakuva, sem citar nomes.

Segundo o político, sem querer fugir às responsabilidades ou culpas, considerou que diante de “um balanço justo verão que a UNITA até tem estado a engolir muitos sapos”.

“Temos sofrido provocações, humilhações e é a responsabilidade da manutenção da paz que nos faz calar e nos faz engolir esses sapos”, afirmou, salientando que os discursos da principal força política da oposição eram de apelo ao diálogo, à justiça e à manutenção da paz. O político disse ainda que era várias vezes criticado por não agir em muitos casos, mas preferia ficar calado e engolir os ditos sapos.

“Eu estou a ter receio quanto a isso, é que a situação tende a evoluir para um ponto em que nós que estamos a tentar fazer uma contenção enorme, podemos ser ultrapassados por aqueles que acham que nós somos moles e que não estamos a fazer nada e um dia aparece um aventureiro aí e depois tem seguidores e a situação fica muito complicada”, alertou.

O então presidente da UNITA considerou que a sociedade civil angolana devia conquistar e ocupar o seu próprio espaço, para ser digna de se afirmar como parceiro institucional do Estado, na garantia dos direitos humanos e em especial dos direitos económicos e sociais dos angolanos.

Samakuva defendeu também que a sociedade civil deve mesmo inventar novos estudos, projectos e campos de intervenção social para a afirmação da cidadania económica, social e cultural angolana.

Onde anda o apito da UNITA?

Recordemos – porque é preciso não ter medo da memória – quais eram (e, embora maquilhadas, continuam a ser) as teses do regime, no caso pela pata de Artur Queiroz, um dos mercenários de eleição do Jornal de Angola, numa espécie de artigo publicado em 2015 sob o título: “O apito de guerra de Isaías Samakuva”.

Segundo o mercenário-sipaio para todos os serviços do MPLA, “Samakuva proporcionou aos “quadros” da UNITA uma formação para se actualizarem no “Guia Prático” e nunca esquecerem que “é preciso bater onde dói mais ao Povo Angolano”.

“Aos “quadros” da UNITA foi prometido que iam marchar triunfalmente entre Muangai e Luanda. Depois a rota mudou para a Jamba. Mais tarde, era do Triângulo do Tumpo até à capital, levados ao colo pelos racistas de Pretória”, reproduziu o rapazola com, é claro, todo o rigor na transcrição das “ordens superiores” do MPLA.

“Na guerra que se seguiu às primeiras eleições multipartidárias, Savimbi prometeu que a rota vitoriosa ia do Bailundo a Luanda. Uns meses depois corrigiu a bússola e a via triunfal ia do Andulo à capital “dominada pelos crioulos””, conta o energúmeno, assumindo a paternidade de um texto encomendado e ditado.

Continua: “Sempre que os bandos armados da UNITA tomavam uma capital provincial, a UNITA dizia que a rota triunfal ia dessas cidades a Luanda. Estava Samakuva a tratar dos negócios alimentados pelo roubo dos diamantes e todas as traficâncias da Jamba, quando a rota triunfal, traçada pelo chefe entre o Lucusse e Luanda, ficou deserta. O chefe ficou com o semieixo partido, Sakala estava moribundo, os outros todos também não se sentiam nada bem e ali acabou a aventura do criminoso de guerra Jonas Savimbi”.

Estes são os sapos que a UNITA tem engolido e que, tanto quanto parece, ainda não lhe causaram a indigestão necessária para os vomitar e então assumir o que dizia, por exemplo, o primeiro presidente do MPLA e de Angola, Agostinho Neto: O importante é resolver o problema do Povo. E são 20 milhões de pobres.

Continuemos com as teses do regime, na circunstância reproduzidas pelo mercenário Queiroz: “Entre eles, é justo destacar, pela coerência na ameaça e no ódio à democracia, Samakuva. Ainda há poucos meses, foi ao Huambo, andou pelas montanhas entre a Caála e o Longonjo, e quando falou aos seguidores, anunciou que a rota vitoriosa estava para breve, começava no Huambo e acabava em Luanda. Na altura ninguém deu importância à sua bravata. Mas hoje temos dados que permitem concluir que o líder da UNITA estava a ameaçar seriamente a paz, a estabilidade e, por isso mesmo, o regime democrático”.

Ou seja, a UNITA é “presa” por ter cão e também por não ter cão. Tem a fama mas não tem o proveito. Não estará, de facto, na altura (e já foi muito o tempo perdido) de ter algum proveito, de honrar o sofrimento de um Povo que o único “crime” que cometeu foi ser angolano, embora de terceira categoria?

Continuemos com a tese do MPLA: “O que se passou a seguir, apenas vem confirmar que Samakuva é inimigo jurado da paz e da democracia. Ao discursar para os “quadros” da UNITA em formação nas técnicas de “bater onde dói mais”, o chefe do Galo Negro não poupou nas palavras: “Eu penso há uns dois meses ou há um mês que da forma como o país está a andar, da forma como os angolanos estão a ser tratados, da forma como os nossos governantes violam as leis, da forma como nos governam, um dia nós vamos tocar o apito da alvorada”.

É claro que, diz o Povo, o apito deve ter sido engolido juntamente com os sapos, razão pela qual nunca ninguém mais ouviu falar dele. E é pena. Talvez Adalberto da Costa Júnio o tenha encontrado…

“Os formandos exultaram, berraram pelo nome de Savimbi e exigiram que a marcha triunfal começasse imediatamente. Samakuva, com sorriso cínico, acalmou a turba: “Não nos empurrem, o apito da alvorada só vai tocar quando nós acharmos que é oportunidade para tocá-lo”. Os “quadros” ficaram inquietos, berraram ainda mais alto pelo nome de Savimbi e exigiram que o sangue corresse nas ruas, de imediato. Samakuva, compreensivo, afirmou: “Nós compreendemos a ânsia das pessoas ouvirem o apito tocar, mas quem toca o apito tem de ler a situação, tem que fazer uma leitura correcta da situação e saber qual é a oportunidade de tocar o apito. Alguns não sabem se tocar o apito leva ar, é preciso arranjar um bom apito, é ou não é verdade? Primeiro você tem que ter o tal apito, é ou não é verdade? Depois tem que ter a tal energia para soprar o tal apito, para se ouvir em toda a parte”, recordou o invertebrado mercenário.

E então?

Conta o pasquineiro que “Samakuva concluiu o discurso ante os “quadros” que estão a actualizar as formas de “bater onde dói mais”, com esta tirada: “O que é que vamos esperar de um Governo que nem sequer consegue tirar o lixo da nossa porta, o que é que podemos esperar de um Governo que não consegue nos trazer água, o que é que podemos esperar dele, a maioria está nestas condições. Alguns pensam que isso acontece por outras razões. Não. Acontece porque eles são incompetentes. Eles não sabem governar, para eles governar é encher os seus bolsos.”

Mais uma vez o regime mandou o simiesco escriba recordar que “a maioria democrática que Governa Angola foi muito competente quando salvou a vida a milhares de quadros políticos e militares do Galo Negro nas matas do Lucusse e em todo o país. Famintos, piolhosos, moribundos, todos foram salvos da morte certa. Samakuva devia ser grato aos que lhe dão o estatuto de líder político em vez de o levarem ao Tribunal Penal Internacional por conivência com o regime de apartheid da África do Sul e autor material e moral de gravíssimos crimes de guerra.”

Bem vistas as coisas, o Povo interroga-se se o facto de Isaías Samakuva ter uma tão grande capacidade para engolir sapos não é resultado da capitulação, que parece eterna, perante o regime do MPLA ou, o que vai dar ao mesmo, da substituição da mandioca pela lagosta.

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