quinta-feira, 16 de janeiro de 2020

Câmara dos EUA decide enviar destituição de Trump ao Senado


Após semanas parado, processo entra na segunda fase. Julgamento deve começar na próxima semana. Expectativa é o presidente ser absolvido pela maioria republicana do Senado.

A Câmara dos Representantes dos Estados Unidos aprovou nesta quarta-feira (15/01) uma resolução para enviar ao Senado os dois artigos de destituição contra o presidente Donald Trump, mais de um mês depois de as acusações terem sido votadas pelos deputados.

A resolução envolveu a escolha dos nomes de um comité que apresentará as acusações no Senado, funcionando como um grupo de promotores. Ele será formado por quatro deputados e três deputadas democratas. A liderança caberá ao deputado Adam Schiff, chefe do Comité de Inteligência da Câmara, que participou das investigações contra Trump.

A expectativa agora é que a segunda fase do processo de destituição – o julgamento dos dois artigos – comece já na próxima semana, concluindo-se no início de fevereiro. Caberá aos senadores decidir se o presidente é culpado ou não, e se deve ser ou não afastado. Esse será o terceiro julgamento de destituição contra um presidente na história dos EUA.


Trump segue no cargo enquanto durar o processo. Nos EUA, o presidente só é afastado após o aval do Senado, responsável pelo julgamento do caso – ao contrário do Brasil, onde o chefe do Executivo é afastado temporariamente já após a votação na Câmara.

Após o anúncio pela Câmara, um membro da Casa Branca disse à rede CNN que "já estava na hora" de o processo voltar a andar, sinalizando que o governo Trump deseja liquidar o assunto rapidamente. A expectativa é que ele seja barrado no Senado, com uma maioria republicana alinhada com o presidente. No Senado, são necessários dois terços dos votos para afastar o presidente. Os republicanos detêm 53 das 100 cadeiras da Casa.

O chefe da campanha à reeleição de Trump, Brad Parscale, também reclamou da demora do envio do processo ao Senado. Segundo ele, a decisão da presidente da Câmara, Nancy Pelosi, de aguardar mais de um mês "provou que nunca houve nenhuma urgência".

A demora tem origem numa disputa entre a Câmara e o Senado sobre como o processo deve andar na segunda câmara legislativa. O líder da maioria do Senado, o republicano Mitch McConnell, pretende conduzir os procedimentos rapidamente, sem a necessidade de ouvir testemunhas, mas a maioria democrata da Câmara deseja novos depoimentos durante o julgamento.

Trump é acusado de abuso de poder e obstrução dos poderes investigativos do Congresso. Em 18 de dezembro, as duas acusações votadas separadamente foram aprovadas com folga na Câmara, de maioria democrata.

O caso envolve a suspeita de que Trump teria pressionado o governo da Ucrânia a investigar um adversário eleitoral, o ex-vice-presidente Joe Biden, pré-candidato à presidência pelo Partido Democrata. O republicano também é suspeito de tentar barrar esforços dos congressistas americanos para investigar as ações da Casa Branca.

Ao longo de 230 anos de história americana, a Câmara dos Representantes só aprovou o destituição de dois presidentes. Em 1868, Andrew Johnson foi acusado de remover um ministro sem autorização do Senado. Em 1998, foi a vez de Bill Clinton ser acusado de perjúrio e obstrução da Justiça. Os dois, porém, foram absolvidos no Senado. Um terceiro presidente, Richard Nixon, renunciou em 1974 pouco antes de a Câmara votar acusações de obstrução da Justiça e abuso de poder.

A análise do caso na Câmara dos Representantes se estendeu por quase três meses. Seis comités da Câmara de Representantes realizaram uma investigação para determinar se era possível abrir um processo de destituição contra o presidente. Testemunhas foram ouvidas em reuniões fechadas e também publicamente. Ao fim, o Comité de Justiça da Câmara publicou os detalhes do caso num documento de 658 páginas, em que o colegiado conclui que Trump traiu o país em busca de benefícios pessoais.

Trump ainda não se manifestou oficialmente sobre o mais recente do processo. Em dezembro, dias antes da votação na Câmara, ele acusou os democratas de conduzirem uma "tentativa partidária e ilegal de golpe", e de declararem guerra à democracia americana, ao buscar removê-lo do cargo.

"Isso nada mais é que uma tentativa partidária, ilegal de golpe e que irá, baseada nos sentimentos recentes, fracassar nas urnas de votação", afirmou Trump na carta, fazendo referência às eleições presidenciais de 2020, nas quais ele pretende tentar a reeleição.

O processo de destituição começou em setembro, quando uma denúncia anónima revelou aos serviços de inteligência do país o conteúdo de uma ligação entre Trump e o presidente da Ucrânia, Volodimir Zelenski.

No fim de julho, Trump pediu que o ucraniano tomasse providências para investigar o ex-vice-presidente Joe Biden e seu filho, Hunter, que é membro do conselho de uma empresa ucraniana. Uma transcrição da conversa foi finalmente divulgada pela Casa Branca em setembro, confirmando que Trump abordou o caso de Biden com Zelenski.

O americano também pediu que Zelenski entrasse em contato com o procurador-geral dos EUA, William P. Barr, e com seu advogado pessoal, Rudy Giuliani, para discutir medidas para uma potencial investigação contra Biden.

De acordo com uma transcrição parcial da conversa liberada pela Casa Branca, Trump não fez nenhuma promessa específica para o ucraniano em troca da cooperação contra seu rival, mas disse em diversos momentos que os EUA "fazem muito pela Ucrânia".

Embora Trump não tenha mencionado nenhuma ajuda em troca, a imprensa americana e a oposição democrata apontaram que o republicano montou um cenário de pressão económica para conseguir a colaboração de Zelenski.

Uma semana antes do telefonema, Trump havia suspendido uma ajuda militar de cerca de 250 milhões de dólares para a Ucrânia, que trava uma guerra em seu território contra forças apoiadas pela Rússia. Em 11 de setembro, mais de um mês após a conversa, a verba foi descongelada.

A Casa Branca também foi acusada de manipular o desejo de Zelenski por um encontro com Trump na Casa Branca, atrelando o convite a uma eventual colaboração do ucraniano na investigação contra Biden. Zelenski tomou posse em maio, e seu país tenta desesperadamente conseguir aliados no exterior para conter a influência russa em seu território.

Durante a fase de depoimentos da destituição na Câmara, o embaixador dos Estados Unidos na União Europeia, Gordon Sondland, admitiu ter dito a um conselheiro do governo ucraniano que a Casa Branca não concederia um pacote de ajuda militar até que a Ucrânia anunciasse uma investigação oficial contra políticos do Partido Democrata, incluindo Biden. O embaixador disse que comunicou essa mensagem a Andrei Yermak, um conselheiro do presidente Zelenski, durante uma reunião em Varsóvia em 1º de setembro.

Já em relação à acusação de obstrução, a justificativa é que Trump proibiu diversos funcionários ligados à sua administração de prestarem depoimento perante a Comissão da Câmara, inclusive os que haviam sido intimados. Em vez de recorrer à Justiça para forçar essas testemunhas a depor, os democratas preferiram usar as recusas como provas para a acusação de obstrução.

Um dos mais casos de mais destaque aconteceu quando o embaixador dos EUA na União Europeia, Gordon Sondland, chegou a se dirigir ao Congresso para depor após receber um convite, em outubro, mas teve sua participação cancelada minutos antes por determinação da Casa Branca. Na ocasião, o próprio Trump confirmou que não queria que Sondland falasse.

Deutsche Welle | JPS/ots

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