Líder russo propõe pacote de
mudanças com as quais, segundo críticos, poderia permanecer no poder após fim
do mandato. PM Medvedev renuncia com todo o gabinete para "abrir
espaço" às reformas.
O presidente da Rússia, Vladimir
Putin, propôs na quarta-feira (15/01) um referendo sobre um pacote de
reformas à Constituição que fortaleceriam o papel do Parlamento. Com as
mudanças, os parlamentares teriam o poder de nomear o primeiro-ministro do país
e ministros de Estado.
A medida levantou suspeitas de
que poderia tratar-se de uma manobra para a sua permanência no poder, assumindo
uma nova função após o término de seu mandato. A desconfiança aumentou com a
renúncia do primeiro-ministro Dmitri Medvedev e de todo o seu gabinete, logo
após o discurso do presidente.
Putin, de 67 anos, já conseguiu
permanecer no poder por mais de 20 anos no poder – mais que
qualquer outro líder russo, incluindo os da era soviética, desde Josef
Stalin –, lançando mão de algumas manobras políticas para ocupar os
cargos de primeiro-ministro e presidente.
A Constituição do país
permite que um presidente governe por no máximo dois mandatos consecutivos. Até ao momento, Putin ainda não deu indicações concretas sobre seus planos para
depois do final de seu quarto mandato no Kremlin, que se encerra em 2024.
No seu discurso anual sobre o
estado da nação perante autoridades e parlamentares, Putin sugeriu nesta quarta
a criação de uma emenda constitucional para permitir as reformas propostas,
que, segundo afirmou, "aumentarão o papel do Parlamento e o dos
partidos, assim como os poderes e a independência do primeiro-ministro e de
todos os membros do gabinete".
Ao mesmo tempo, Putin afirmou que
o presidente deve manter o direito de exonerar o primeiro-ministro e os membros
do gabinete, além do poder de indicar autoridades de alto escalão das áreas da
defesa e segurança. Os parlamentares seriam consultados sobre essas
nomeações. O pacote prevê ainda o fortalecimento dos governos regionais.
"Considero necessário
conduzir uma votação pelos cidadãos do país sobre a íntegra do pacote de
emendas propostas à Constituição", disse o presidente, sem especificar uma
data para o referendo.
"Apenas conseguiremos
construir uma Rússia forte e próspera com base no respeito à opinião
pública", afirmou. Atualmente, o presidente é o responsável pela nomeação
do primeiro-ministro. Com a reforma, o presidente manteria quase todos os amplos
poderes que possui. "A Rússia deve continuar sendo uma forte república
presidencialista", ressaltou Putin.
As propostas de Putin são vistas
por muitos como um sinal de sua intenção de permanecer como líder do governo
após 2024. Críticos já o acusavam de planear permanecer no poder. O
analista político Kirill Rogov comparou o pacote proposto pelo
presidente ao modelo da China, com Putin mantendo-se indefinidamente no cargo
mais alto do país, seja este qual for.
Um dos maiores críticos de Putin
na Rússia, o blogueiro Alexei Navalni ironizou o anúncio de Putin: “O
principal resultado da fala de Putin: que idiotas (ou trapaceiros) são aqueles
que disseram que Putin sairia em 2024”, esreveu ele no Twitter.
O mentor e seu pupilo
Após o discurso de Putin, Medvedev
anunciou sua renúncia e a saída do seu gabinete de ministros, afirmando que o
objetivo seria dar espaço para que o presidente possa encaminhar as reformas.
Ele anunciou sua decisão pela televisão estatal, ao lado de Putin, que o
agradeceu pelo trabalho que desempenhou no governo.
Para substituí-lo, Putin indicou
o chefe da agência federal de impostos do país, Mikhail Mishustin, de 53 anos.
Visto como uma figura relativamente obscura do governo, ele estava à frente da
agência desde 2010. Sua indicação ainda precisa ser aprovada pelo Parlamento, o
que deverá ocorrer dentro de uma semana.
O líder russo disse que Medvedev
assumirá uma nova função, a de vice-presidente do Conselho de Segurança da
Rússia, também presidido por Putin. A decisão reforçou as suspeitas de que o
homem forte do Kremlin planeia manter-se no governo através de uma transição de
poderes semelhante à de 2008.
Putin cumpriu dois mandados como
presidente, entre 2000 e 2008, antes de se transferir para o cargo de
primeiro-ministro, onde permaneceu durante o limite de quatro anos
estipulado pela lei. Muitos analistas políticos acreditam que durante esse
período, ele continuava a atuar como líder de facto do governo.
Medvedev, que o substituiu na
presidência e o nomeou como primeiro-ministro, deixou o cargo após quatro anos,
não buscando a reeleição para abrir o caminho para a volta de seu mentor à
chefia do Executivo, em 2012. Durante esse tempo, o pupilo de Putin aumentou a
duração do mandato presidencial de quatro para seis anos.
Depois de reassumir a presidência
da Rússia em 2012, Putin retribuiu a dedicação de Medvedev e nomeou-o primeiro-ministro do novo governo.
Após todos esses anos no centro
da política russa, a popularidade de Putin continua em alta, com boa parte da
população considerando-o uma fonte de estabilidade para o país, mesmo que
muitos critiquem o tempo prolongado em que ele se mantém à frente do
governo.
Deutsche Welle | RC/afp/rtr/ap
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